A partir das pesquisas domiciliares do IBGE de 1987 até 2022, o GEMAA produziu a terceira edição do seu Relatório das Desigualdades Raciais no Brasil. O objetivo do relatório é tornar acessível ao grande público indicadores socioeconômicos relativos às desigualdades raciais e de renda no nosso país. Para tal, os dados são agregados em dois grupos demográficos: pretos, pardos e indígenas (PPI) e brancos e amarelos (BA). A pesquisa foca em quatro temas principais: mudanças na composição e autoclassificação racial, desenvolvimento educacional, mercado de trabalho e renda.
Com a harmonização de 73 bancos de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD e PNAD Contínua) do IBGE, o estudo mostra que, ao longo dos 35 anos analisados, ocorreu uma transformação significativa na composição racial, com aumento consistente da população não branca, autoclassificada como preta, parda, indígena e amarela.
O relatório pontua que o aumento da população PPI se dá por um processo de reclassificação racial, o que significa que pessoas de uma mesma geração deixaram de se declarar brancos ou amarelos, optando pelas identidades preta, parda ou indígena. Isso demonstra que o expressivo aumento da população preta, parda e indígena ao longo dos anos ocorreu por uma mudança na autoclassificação e não somente por índices diferenciais de natalidade e mortalidade. As regiões sul e sudeste são as que mais concentram brancos e amarelos, enquanto o norte e nordeste possuem maior concentração de pretos, pardos e indígenas.
No mesmo período houve também uma atenuação das desigualdades raciais relativas à educação formal, ainda que todos os grupos raciais tenham elevado seus níveis de escolaridade. Do ano de 1987 até 2021, a proporção de pretos, pardos e indígenas entre 18 e 65 anos com ensino superior completo saiu de menos de 20% para 30%.
Apesar disso, ao observarmos os grupos raciais separadamente, brancos e amarelos ainda possuem vantagens relativas ao tempo de estudo e, por consequência, maiores níveis educacionais. Brancos e amarelos ainda são a maioria da população com ensino superior completo e incompleto, enquanto pretos, pardos e indígenas levam vantagem nos níveis fundamental e médio. Os dados mostram que em 2021 a média de anos de estudos de brancos e amarelos era de 10,6 anos e de 9 anos para pretos, pardos e indígenas.
Nos quesitos trabalho e renda, nota-se uma grande diferença nas taxas de desocupação de pretos, pardos e indígenas comparadas às de brancos e amarelos, que também levam acentuada vantagem no quesito concentração de renda. A taxa de desocupação de brancos/amarelos e pretos/pardos/indígenas variou em torno de dois pontos percentuais entre 2000 e 2015, porém a partir de 2016 ela sobe para cerca de quatro pontos.
Os jovens pretos/pardos/indígenas entre 14 e 17 anos compõem a faixa etária mais atingida pelo desemprego, comparados a brancos/amarelos com a mesma idade. Os dados sobre renda mostram que, entre 1987 e 2002, brancos e amarelos chegam a receber o dobro da renda de pretos, pardos e indígenas. Os grupos raciais que compõem as faixas mais baixas de renda também são os chamados PPI.
Os dados e análises produzidos pelo relatório indicam que as desigualdades que afetam a sociedade brasileira são resilientes e complexas. A transformação desse cenário se concretizará com a produção de políticas redistributivas interseccionais e desenhadas para atender às especificidades da composição racial brasileira, nas áreas da educação, acesso ao trabalho e redistribuição de renda.
Sobre o GEMAA:
O Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA) é um núcleo de pesquisa com inscrição no CNPq e sede no IESP-UERJ. Criado em 2008 com o intuito de produzir estudos sobre ação afirmativa a partir de uma variedade de abordagens metodológicas, o GEMAA ampliou sua atuação e hoje desenvolve investigações sobre desigualdades materiais e simbólicas de raça e gênero na educação, mídias, política institucional e em outras esferas da vida social.