Há 30 anos, o apartheid era formalmente abolido na África do Sul

Enviado por / FontePor AFP, do DW

As últimas normas discriminatórias do regime segregacionista da África do Sul foram retiradas dos livros legais a 30 de junho de 1991. Regras concebidas a partir da década de 1940 fundamentaram domínio da minoria branca.

O apartheid [“separação”] tornou-se política governamental oficial em 1948, quando o conservador Partido Nacional tomou o poder na África do Sul. A estrutura legal formalizou um sistema de dominação que estava em vigor desde que os colonos europeus começaram a chegar à ponta sul de África, mais de 300 anos antes, a maioria proveniente dos Países Baixos e do Reino Unido.

Enraizado na doutrina de que os seres humanos eram separados por raça, o apartheid foi construído sobre leis que classificavam as pessoas como “nativas” (negras), “de cor” (mestiças), “asiáticas” ou “brancas”, de acordo com a cor da pele e outras características.

As raças serviam como critério de separação de forma universal na sociedade – incluindo na escola, no trabalho e nos hospitais, e onde podiam viver e fazer compras. Os empregos eram reservados para certos grupos e o casamento e a relação íntima com pessoas de diferentes grupos eram proibidos. Praias, autocarros, bancos de praças e casas de banho públicas eram separadas de acordo com a chamada “categoria racial”.

Economia e segurança

Os brancos constituíam menos de 20% da população mas possuíam mais de 80% das terras. Era o grupo de pessoas que controlava a economia – incluindo a agricultura, o sector mineiro, e todas as alavancas políticas.

Os negros foram relegados a empregos, educação e serviços inferiores e não eram autorizados a votar. Foram levados a viver em cidades negligenciadas na periferia das áreas urbanas ou em várias terras étnicas desfavorecidas, chamadas “Bantustans”, onde se realizaram eleições falsas.

Até 1986, os sul-africanos negros eram obrigados a transportar um documento semelhante a um passaporte, chamado “dompas”, que restringia os seus movimentos. Para manter o sistema, o Governo do apartheid impôs censura severa e confiou fortemente nas suas forças de segurança, com o recrutamento obrigatório de homens brancos entre 1967 e 1993.

O Congresso Nacional Africano (ANC) liderou a resistência ao apartheid, adotando primeiro táticas não violentas – como greves, boicotes e campanhas de desobediência civil.  Entre os primeiros grandes protestos, houve um boicote aos autocarros do Governo no município de Alexandra, em 1957.

Cyril Ramaphosa e Jacob Zuma já eram dirigentes do ANC

Massacres e viragem

Em 1960, uma marcha em Sharpeville contra os odiados livros de passes tornou-se um massacre quando a polícia abriu fogo sobre a multidão, matando 69 negros. Nesse mesmo ano, o Governo proibiu o ANC e outra oposição negra e impôs o estado de emergência. Ativo, mas na clandestinidade, o ANC virou-se para a luta armada.

Em 1964, um dos seus líderes, Nelson Mandela, e outros integrantes do partido foram condenados à prisão perpétua por sabotagem. Esteve 27 anos atrás das grades, tornando-se o prisioneiro político mais conhecido do mundo e um ícone da luta anti-apartheid.

A 16 de Junho de 1976, as forças de segurança abriram fogo contra jovens negros que protestavam no município de Soweto contra a regra de as escolas ensinam somente em Afrikaans.  Pelo menos 170 pessoas foram mortas, com algumas estimativas a colocarem o número de mortes em várias centenas durante o mês seguinte. O episódio ficou conhecido como a Revolta do Soweto.

O massacre de Sharpeville chamou a atenção mundial para a brutal repressão do regime. Isto iniciou o isolamento internacional do Governo sul-africano, sendo o país excluído dos Jogos Olímpicos, expulso das Nações Unidas, colocado sob embargo de armas e comércio.

Ativistas globais

Personalidades de renome internacional tornaram-se ativistas contra o apartheid, com um grande concerto de rock no Estádio de Wembley, em Londres, em 1988, em homenagem a Mandela. Foi um choque quando, em 1990, o Presidente F. W. de Klerk, que estava no poder há apenas cinco meses, anunciou a legalização da oposição negra.

Em poucos dias, Mandela foi libertado após quase três décadas na prisão. Menos de um ano e meio depois, o apartheid terminou oficialmente, tendo a última das suas leis discriminatórias sido retirada dos livros legais a 30 de junho de 1991. O seu desmantelamento foi celebrado com a atribuição do Prémio Nobel da Paz de 1993 a Mandela e de Klerk.

A transição para a democracia não foi isenta de obstáculos. Os extremistas brancos resistiram violentamente à mudança. A rivalidade dos militantes do ANC e do partido Zulu Inkhata irromperam em violência mortal. As primeiras eleições para todas as raças foram realizadas em 1994 e a camada da população sul-africana antes excluída do processo eleitoral fez fila durante horas para votar pela primeira vez.

O ANC ganhou com muitos votos de diferença e Mandela tornou-se o primeiro presidente negro do país. O Apartheid estava acabado, embora o seu legado – divisão psicológica, cicatrizes sociais e disparidade económica – ainda persistisse.

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