Má reputação

No novo tempo, a boa imagem desmorona em minutos. Convém manter distância de ambientes pantanosos

Por Flávia Oliveira, do O Globo

Foto: Marta Azevedo

Não basta ter sucesso e patrimônio, é preciso ser ético. E, de preferência, influenciar o entorno. Na semana que passou, o recado ficou claro num par de comunicados de agências de classificação de risco sobre o BTG Pactual. Moody’s, Standard & Poor’s e Fitch, as três referências do setor, reduziram as notas de crédito do banco, dias após a prisão de André Esteves, então principal acionista e diretor executivo. Duas delas incluíram nas justificativas para o rebaixamento os efeitos do episódio na imagem do banco. Ambas mencionaram danos “reputacionais”, ativo imaterial em galopante valorização no mundo corporativo. Não é fácil construir boa reputação. No novo tempo, ela desmorona em minutos. Convém manter distância de ambientes pantanosos.

Bancos são, historicamente, assentados numa base (nada concreta) chamada credibilidade. Quem testemunhou a transição da economia brasileira da hiperinflação para a estabilidade, na virada do Plano Real, lembra que instituições financeiras deixavam de existir da noite para o dia, após boatos sobre dificuldades de liquidez. A clientela fugia em manada; bancos, corretoras e distribuidoras desapareciam. Num ambiente de aguda instabilidade, era a crônica da morte anunciada.

Os anos 1990 foram férteis em venda de empresas — estatais, inclusive — a fundos e sociedades instaladas em paraísos fiscais, de composição acionária tão desconhecida quanto a origem dos recursos envolvidos. Na virada do século, o modelo caixa preta perdeu terreno para a chamada governança corporativa, ancorada em transparência e boas práticas. É nesse contexto que a reputação, o conceito coletivo sobre indivíduos ou instituições, ganha importância.

Quarta-feira passada, quando rebaixou a nota do BTG Pactual de “BB” para “BB-”, a S&P escreveu que continuará avaliando o impacto que “as questões reputacionais terão sobre a posição de negócios do banco, seu capital e rentabilidade, captação de recursos e risco”. Desde a prisão de Esteves, as ações da instituição perderam um terço do valor, os saques aos fundos encostaram em R$ 10 bilhões, participações em outros negócios foram postas à venda, a composição acionária mudou e houve acordo com o Fundo de Garantidor de Crédito para uma linha de assistência de R$ 6 bilhões. O conjunto de atos defensivos foi resultado da prisão do responsável pela ascensão do banco. André Esteves queimou a própria reputação e pôs em risco a do BTG Pactual, quando caiu no fosso das tenebrosas transações entre os mundos político e financeiro.

Os tempos de hoje exigem transparência e diálogo. Clientes, investidores, fornecedores tomam decisões com base não apenas no desempenho financeiro, mas no patrimônio intangível das corporações, como marca, imagem, ações de responsabilidade socioambiental. Ao dono de um dos dez maiores bancos brasileiros não é permitido sucumbir a práticas sombrias. Tampouco a gigante Volkswagen pode flertar com o precipício ao fraudar sistemas de medição de emissões de seus carros, num mundo preocupado com o meio ambiente e crítico ao modelo de transporte individual. A Petrobras não poderia estar enredada no maior escândalo de corrupção do país. Na tragédia humanitária e ambiental causada pela barragem rompida da Samarco em Mariana (MG), a lama também sujou as controladoras Vale e BHP.

A mudança de postura exigida pela sociedade civil e também pelo mundo empresarial deveria, igualmente, influenciar homens públicos e caciques da política. Não são aceitáveis agressões a mulheres, violência policial, fechamento de escolas, mentira, gestão temerária. O novo tempo chegou.

 

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