Matriarcas negras em “Tenda dos Milagres” (1977): uma análise da interseção entre gênero e raça no cinema brasileiro

Ao traçar um panorama histórico da representação dos negros nas telenovelas brasileiras de 1963 a 1997, Araújo (2000) ressalta que esse veículo pratica uma verdadeira negação da diversidade racial do país, constatada pela pequena participação de atores e atrizes negras no elenco de uma telenovela e a constância em papeis inferiores e estereotipados.

por Ceiça Ferreira no Compo

Mais de dez anos após o lançamento dessa pesquisa de Joel Zito Araújo, e considerando as transformações sociais, culturais e políticas que vem ocorrendo nas últimas décadas, com destaque para as conquistas dos Movimentos Negros, como por exemplo, a implementação de ações afirmativas e a constante reflexão pública sobre a participação e as políticas de visibilidade para atrizes e atores negros nos meios de comunicação e no cinema, seria possível apontar avanços, mudanças ou inovações na forma como a população negra, e especialmente os femininos negros1 são retratados nas narrativas audiovisuais?

Vale considerar tal panorama, visto que homens e mulheres negras constituem mais de 50% da população brasileira e diante da centralidade dos meios de comunicação enquanto como instância produtora de sentidos, valores e visões de mundo torna-se necessário observar como as práticas de representação e a construção das identidades são estreitamente relacionadas.

A representação inclui as práticas de signi – cação e os sistemas simbólicos por meio dos quais os signi cados são produzidos, posicio- nando-nos como sujeitos. É por meio dos sig- ni cados produzidos pelas representações que damos sentido à nossa experiência a àquilo que somos (WOODWARD, 2000, p. 17).

Por incidirem também nos processos de subjetivação dos indivíduos, as narrativas audiovisuais atuam como elementos representativos da ordem do mundo e são preponderantes na construção e naturalização do imaginário social, categoria importante segundo Sodré (1999) para se compreender a continuidade histórica de representações negativas da população negra, na qual se articulam e reatualizam as conotações dadas pelas elites e setores intermediários no século passado brasileiro, resquícios de um imaginário colonial/ patriarcal e também diferentes abordagens e con gurações. Para isso, busca-se desenvolver uma análise das mães de santo4 que são retratadas no longa Tenda dos milagres (Nelson Pereira dos Santos, 1977).

Problematizar as representações e identidades que o cinema constrói signi ca, portanto, pen- sar sobre a construção de um imaginário, apon- tando a(s) forma (s) como a sociedade e seus grupos são representados pela linguagem au- diovisual, repleta de ambiguidades, polissemias e contradições (MONTORO, 2006, p. 20).

A escolha desse lme, que é uma adaptação de um romance homônimo de Jorge Amado se justi ca pela relevância da obra literária desse escritor, sua in uência no cinema brasileiro e na construção da identidade nacional; e também pela atuação de Nelson Pereira dos Santos,5 considerado um dos mais importantes cineastas brasileiros, principalmente por suas inovações estéticas na forma de retratar as culturas populares.

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