Mulheres e Gringos na Copa do Mundo

O Brasil está recebendo inúmeros torcedores estrangeiros durante a Copa do Mundo. Em sua grande maioria, homens. E, em tempos de ferramentas globalizadas como Tinder e Grindr, além do velho e bom tête-à-tête nos bares e pontos de encontros da cidade, as pessoas estão se encontrando, ficando, paquerando, namorando, beijando, curtindo e se divertindo.

Texto de Iara Paiva e Bia Cardoso

Porém, a fiscalização em cima das mulheres, de seu comportamento e a reprodução de estereótipos tão bem conhecidos corre solta como bola em campo. Há quem reclame que as brasileiras agora só querem saber de gringos. Há quem reclame da objetificação que as mulheres tem feito dos jogadores. Há quem promova concurso na televisão para as brasileiras encontrarem o gringo dos sonhos. Há até brasileiro que finge ser gringo para ter mais chances no circuito da paquera. Enquanto isso, nas transmissões, a beleza das torcedoras segue sendo exaltada como um motivo a mais para assistir as partidas.

Então, a conclusão que chegamos ao ver esses fiscais da perseguida alheia é:

  • Se você tá atrás de gringo que veio pra Copa pra casar com eles: puta.
  • Se você tá atrás de gringo só pra se divertir: puta.
  • Se você tá atrás de gringo pra prestar serviço sexual, porque esse é seu ganha-pão: puta.
  • Se você pega o jogador de futebol (claro que é pelo dinheiro, imagina se pegaria um cara com essa cara se ele fosse o porteiro): puta.
  • Se você pega o porteiro, o zelador, o motoboy: puta.
  • Se você pega só patrão: puta.
  • Se você pega geral, sem distinção de raça, renda, religião: muito puta.
  • Se você gosta de sexo: puta.
  • Se você gosta muito de sexo: muito puta.
  • Se você não gosta de sexo, só da grana mesmo: puta também.

Ficamos impressionadas com quem ainda se incomoda com a opinião alheia já que, de um jeito ou de outro, todo mundo vira puta em alguma circunstância. Nas ruas, o assédio, seja de gringos ou de brasileiros, passa por beijos forçados e outros tipos de abusos.

É claro que não estamos nem aí para quem nos chama de puta, mas a questão é a maneira como isso é usado como ofensa e que a Luciana Nepomuceno explica tão bem:

Isso esclarecido, deixa eu dizer que me preocupa que você ache que chamar de puta é ofensivo. Me preocupa você achar que é xingamento. Me preocupa você achar que é pejorativo. Prostituta é uma mulher que ganha dinheiro oferecendo serviços sexuais. O que tem de pejorativo ou ofensivo nisso? As opções: a) Uma mulher fazer sexo? b) uma mulher ganhar dinheiro? c) uma mulher decidir sobre o corpo dela? d) ser mulher?

Me preocupa porque você usar puta como xingamento porque está implícito que mulher que faz sexo e/ou mulher que ganha dinheiro e/ou mulher que decide sobre sua vida e/ou simplesmente ser mulher é uma coisa ruim e que merece ser punida. Que merece o que lhe acontecer. Como, por exemplo, ser atacada. Ser alvo de violência, seja física ou psicológica. Que merece ser estuprada, violentada, espancada e tantas outras violências diárias que as mulheres costumam sofrer apenas porque existem. Apenas por serem. Referência: Puta, no Biscate Social Club.

Não deveria ser um problema que as mulheres estejam aproveitando esse período de Copa do Mundo para se divertirem de diversas formas, além de torcer por suas seleções. Mas sabemos que não é assim. Sabemos que a beleza das torcedoras, exaltada em quase todas as transmissões, por mais que existam inúmeras mulheres trabalhando na cobertura do evento, serve para nos lembrar que temos um lugar social: embelezar sem expressar opinião, sem permissão para agir ou reagir seguindo seus desejos.

 

 

Fonte: Blogueiras Feministas

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