Por Miriam, por Gaia, por nós e pelo nosso povo: Mulheres Negras contra o Feminicídio e o Racismo Institucional
Nós, mulheres negras do Ceará e do Brasil, militantes de diferentes movimentos sociais, manifestamos nossa profunda indignação com a violência praticada contra as mulheres. O assassinato brutal e covarde de Gaia Molinari em Jericoacoara, em 24/12, soma-se ao de mais 265 mulheres assassinadas no Ceará em 2014. Se comparado com os números de 2013, onde 214 mulheres foram assassinadas, a taxa de feminicídio cresceu cerca de 25%. Esse número coloca o Ceará no 6º lugar no ranking nacional. O crescente assassinato de mulheres denuncia nossa cultura sexista e a incapacidade do poder público estadual em adotar ações efetivas pelo fim do feminicídio e outras formas de violência contra as mulheres.
O crime contra Gaia gera comoção nacional e internacional, diferentemente das outras 265 mulheres assassinadas, pelo fato dela ser um estrangeira europeia. Isso pressiona a polícia civil e a justiça do Ceará a acelerar as investigações, identificar e punir os autores do crime. Na busca de fazer justiça pela morte de Gaia, o Estado comete uma injustiça contra a farmacêutica Mirian França de Melo, acusada e presa pela polícia do Ceará por suspeita de ter cometido tal crime. Embora existam 15 pessoas suspeitas, sem nenhuma prova ou razão legal, Mirian que é uma mulher negra, encontra-se desde o dia 26 de dezembro presa na Delegacia de Capturas/CE.
Essa atitude do Estado é parte de uma história muito conhecida pela população negra em geral e mulheres negras em particular: uma história de racismo e violência institucionais que atinge diretamente nosso povo. Desumanizados pela lógica racista que nos julga por nossa cor, as mulheres e os homens negros têm sido violentados e exterminados pela violência policial e jurídica que prejulga, condena, encarcera e nega o básico direito de defesa. Amontoada em cadeias e presídios a gente preta do Brasil do século XXI revivencia os velhos navios negreiros, sujeita aos chicotes, às doenças e à morte.
Tal como Miriam, também somos cotidianamente ultrajadas pelo discurso midiático racista e sensacionalista que transforma o nosso sofrimento em espetáculo: protagonista rejeitada dos programas e páginas policiais, o trato para a nossa gente é: “atira primeiro, que depois ninguém pergunta!”.
Não, nós mulheres negras não aceitamos caladas essa situação, denunciaremos e lutaremos sempre pela nossa liberdade e de nosso povo, pelo direito à defesa e contra violações. Por isso exigimos das autoridades públicas a imediata soltura de Mirian França de Melo, e que o sistema de justiça, faça jus a si próprio, refazendo-se de sua violência e racismo! Consideramos que uma justiça e uma polícia competentes e comprometidas com a segurança pública não pode, junto com a grande mídia, mascarar o fato de que, Jijoca de Jericoacoara é um lugar inseguro para as mulheres, onde em 2012, foi considerado o 32º município do Brasil a ter o maior número de casos de violência contra as mulheres (Centro de Atendimento à Mulher – Ligue 180).
De nossa parte somos solidárias com a família e amigos de Miriam e de Gaia e com todas as vítimas desse tipo de violência naturalizada, e mais do que nunca, estaremos vigilantes e atentas!
Fortaleza 09 de Janeiro de 2015
Assinam esta Nota:
1 – Instituto Negra do Ceará – INEGRA
2 – Fórum Cearense de Mulheres -FCM
3 – Tambores de Safo
4 – Grupo de Valorização Negra do Cariri – GRUNEC
5 – Conselho Municipal dos Direitos da Mulher Cratense – CMDMC
6 – Movimento de Mulheres em Luta – MML
7 – Central Sindical Popular – CONLUTAS
8 – Conselho Comunitário de Defesa Social do Crato – CCDS – Crato
9 – Frente de Mulheres dos Movimento Sociais do Cariri
10 – União da Juventude Comunista
11 – Pastorais Sociais do Regional Nordeste I
12 – Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras – AMNB
13 – Articulação de Mulheres Brasileiras – AMB
14 – Instituto Patrícia Galvão
15 – Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares – Ceará
16 – Bamidelê – Organização de Mulheres Negras na Paraíba
17 – UIALA MUKAJI Sociedade das Mulheres negras de Pernambuco
18 – Rede das Mulheres de Terreiro de Pernambuco
19 – GT Mulheres de Axé da RENAFRO Ceará
20 – Geledés – Instituto da Mulher Negra
21 – ACMUN – Associação Cultural de Mulheres Negras-RS
22 – Pretas Candangas – Coletivo de Mulheres Negras do Distrito Federal
23 – IMENA – Instituto de Mulheres Negras do Amapá
24 – MARIA MULHER – Organização de Mulheres Negras/RS
25 – CEDENPA – Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará
26 – Grupo de Mulheres Negras MALUNGA
27 – CRIOLA – RJ
28 – Rede Fulanas – Negras da Amazônia Brasileira
29 – Grupo Cactos, Gênero e Comunicação – PE
30 – Associação Franciscana de Defesa de Direitos
31 – UNEafro-Brasil
32 – Cecília Feitosa – Presidenta do PSOL Ceará
33 – Cícera Barbosa – Professora e Historiadora – Comitê Impulsor no Ceará da Marcha das Mulheres Negras – 2015
34 – Maria Ozaneide de Paula – Secretária das Mulheres da CUT
35 – Margarida Marques – Setorial de Negras e Negros do PSOL Ceará
36 – Marisa Sanematsu – Jornalista e editora da Agência Patrícia Galvão
37 – Luciana Araújo – Jornalista do Portal Compromisso e Atitude
38 – Francisco Nonato do Nascimento Filho – Militante independente do Movimento Negro Ceará
39 – Regiane Nigro – Militante independente da Economia Solidária – SP
40 – Sindicato dos Trabalhadores da UNICAMP – STU
41 – Instituto AMMA Psique e Negritude
42 – Tiago Neto da Silva – Estudante e militante da Articulação de Esquerda (PT)
43 – Rita de Cássia Hipólito – Socióloga e Professora de História e Sociologia de São Paulo
44 – Associação Cultural de Mulheres Negras – ACMUN – RS
45 – Mulheres Negras Capixabas – ES
46 – Coletivo Negrada – ES
47 – Mirt´s Sants – Militante do Movimento Negro e de Direitos Humanos
48 – Rede Rádio Mamaterra
49 – SOS Racismo Brasil
50 – OLPN/MNU De Lutas, Autônomo e Independentes
51 – Rede Afro LGBT Mineira
52 – Quilombo do Sacopã
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Fonte: INEGRACE