Nº 1 do revezamento no Brasil, Fabiana fala de racismo, machismo e política

Capitã da seleção feminina de vôlei e bicampeã olímpica, central diz que é preciso quebrar o lado machista, dar mais oportunidade aos negros e vibrar com Olimpíadas

Por Thierry Gozzer, do Globo Esporte 

 

Cabelos presos e sorriso no rosto. Fabiana Claudino desceu a rampa do Palácio do Planalto, em Brasília, pronta para abraçar o mundo. Mas, sem abrir mão de suas convicções. No último domingo, logo pela manhã, acordou com a notícia de que não conduziria a tocha olímpica em Vitória, capital do Espírito Santo, no próximo dia 17. Por uma escolha pessoal da presidente Dilma Rousseff, coube a capitã da seleção bicampeã olímpica de vôlei ser a primeira atleta a escoltar um dos símbolos olímpicos, nesta terça-feira, na capital federal. Mulher, negra, Fabiana recebeu de outra mulher a tocha que esteve em suas mãos por pouco mais de um minuto. Ao fim de sua jornada, além de exaltar a felicidade pelo “presente”, ela fez questão de deixar sua mensagem para uma sociedade que ainda considera machista e racista.

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Fabiana beija a tocha olímpica (Foto: Divulgação)

 

– Passamos uma mensagem nesta terça-feira. Queremos cada vez mais quebrar esse lado machista. E estamos conseguindo isso. Ser a primeira, ser uma mulher, negra, e representar esse momento histórico… Me sinto feliz e honrada. Ali, represento todos da minha raça. Acho que as vezes o que falta é oportunidade. Então, toda a oportunidade que temos, devemos aproveitar e falar em nome de todas as raças. A mensagem que tenho que deixar é que sou honrada de representar meu povo e meu país. Me desculpa, estou tão assim que não consigo me expressar da melhor forma. Mas sirvo de exemplo, de espelho para todas as mulheres, para todos os negros, mostrando que temos nosso espaço e o nosso momento – garantiu a jogadora.

A central de palavras firmes também falou sobre a crise política que o Brasil atravessa, o que para ela, atinge o esporte. Comentou da felicidade por ter dado início ao revezamento da tocha, que irá percorrer o Brasil até o dia 5 de agosto, quando a pira olímpica será acesa no Maracanã, no Rio de Janeiro. Fabiana lembrou do sonho do tricampeonato olímpico no Rio 2016, da confusão em torno dela com populares e pessoas protestando contra e a favor do governo, e de onde irá guardar a tocha olímpica que ela tratará como um filho.

CRISE POLÍTICA NO BRASIL

“Sei que agora vivemos um momento de crise no país inteiro. Querendo ou não, sabemos que atinge um pouco o esporte também. E isso é triste, fico triste. Mas, agora, temos que esquecer um pouco isso, viver essa emoção. Você tem uma Olimpíadas no Brasil. O mundo inteiro foca nisso aqui. Temos atletas se dedicando para isso a anos. Agora, tento mais focar nisso, pensar nessa alegria, na felicidade, em representar o meu país da melhor forma possível. Pode ser uma grande mudança, uma grande esperança para o país inteiro, principalmente para as crianças, que acredito que são o nosso futuro. Vejo essa Olimpíadas com uma grande representação de um mundo melhor e dessas conquistas”.

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Fabiana Claudino desce a rampa do Palácio do Planalto com a tocha olímpica (Foto: André Dusek/Agência Estado)

EMOÇÃO POR ABRIR O REVEZAMENTO

“Sinceramente, a ficha ainda não caiu. Porque, toda vez que paro para pensar, lembro da infância, de como tudo começou, toda a minha história, carinho. E hoje estou aqui. Fui a primeira escolhida para conduzir a tocha, pegar a tocha, sair ali do Palácio do Planalto. É uma felicidade e emoção muito grande. Tenho que agradecer a Deus a todas as conquistas, tudo que está acontecendo, por representar todos os atletas e o país. Fico muito feliz por isso”.

OS 200M COM A TOCHA OLÍMPICA

“Parece rápido, mas ao mesmo tempo parece longo. Quando fui descendo aquela rampa ali, a primeira coisa que veio na mente foi agradecer a Deus. Veio toda a história de tudo que vivi desde a infância. Vim de uma família humilde. Ali, representei todo mundo. Sinceramente, nem consegui perceber a confusão. Não vi. Se pudesse pegar a tocha ali, juntar todo mundo e colocar para carregar junto, faria naquele momento”.

MOTIVAÇÃO EXTRA EM BUSCA DO TRI

“Fico mais motivada para não deixar esse ouro escapar de jeito nenhum. Temos um grupo muito bom, motivado, legal, unido e focado. Estamos treinando para esse momento. Toda essa emoção e carinho eu quero levar para as meninas, para focar ainda mais, treinar ainda mais e fazer bonito no Rio de Janeiro”.

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Fabiana Claudino agradece aos céus pelo dia que viveu (Foto: Charles Sholl/Futura Press/Estadão Conteúdo)

O REAL SIGNIFICADO DO REVEZAMENTO

“Sou uma atleta bicampeã olímpica, reconhecida. Mas o revezamento da tocha é onde todos se unem. E é isso que o brasileiro precisa entender. Independentemente da sua cor, de quem você seja, da sua classe social, somos um país só. Temos que unir isso e que sirva de exemplo. Independentemente de quem eu seja, que possamos nos unir por um país melhor”.

ESCOLHIDA PELA PRESIDENTE

“Fiquei sabendo da notícia no domingo de manhã. Me ligaram para passar a notícia. Fiquei super emocionada. Queria dividir com os meus pais. Está sendo difícil expressar esse momento. Falar sobre o que vivi. Tanta alegria, emoção. Eu não sei, ainda estou pegando nela, estou anestesiada. Mas, acho que vai para um lugar bem especial lá em casa. Vai ficar para o resto da minha vida, vou querer mostrar para os meus filhos, vai ter um lugar muito especial na minha casa”.

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