“Para a mulher negra, escrever é um ato político”. Essas palavras, inspiradoras e norteadoras de uma geração que busca recuperar um lugar por muito tempo negado ou silenciado, foram ditas pela grande Conceição Evaristo durante sua participação, em 2013, na mesa “Mulheres Negras Construindo sua História”, dentro da programação do 6º Festival Latinidades, do qual a escritora era a homenageada.
Eu não conheço Conceição, ao menos ainda não pessoalmente, mas me honra saber que estou trilhando um caminho por ela já percorrido. Aliás, honrar nossas histórias, das que vieram antes de nós, das que abriram e abrem os nossos caminhos, é algo que me faz transbordar de orgulho. No ano passado, eu escrevi aqui, nesta mesma coluna Negras que Movem, o artigo “Um livro independente, escrito por uma mulher negra, sobre o sucesso de mulheres negras, entre os finalistas do principal prêmio literário do país”. Ali, eu falava sobre um sonho que dava seus primeiros passos em âmbito nacional. Hoje, aqui, eu volto para dizer que o sonho cresceu, floresceu e ainda há muito a florir.
Escrever é um ato político. É também um ato de reflexões, de reivindicações. Um ato de autoconhecimento, de autocuidado. Um ato de amor.
Sempre comento que a escrita é a minha melhor forma de expressão, é quando me entendo, quando sei quem sou. E eu sou porque nós somos. E é justamente por eu ser porque nós somos que me honra contar a história de outras mulheres, outras mulheres negras, que movimentam as mais diversas estruturas.
Neste domingo (10), na Bienal Internacional do Livro de Pernambuco, lanço a segunda edição do livro “Negra Sou: a ascensão da mulher negra no mercado de trabalho”, que foi finalista do Prêmio Jabuti, menção honrosa do Prêmio Diretos Humanos de Jornalismo e cuja série de reportagens conquistou o Prêmio Antonieta de Barros – Jovens Comunicadores Negros e Negras.
Como disse na apresentação da primeira edição: este livro-reportagem é a realização de um sonho. Como repeti na apresentação da segunda edição: este livro-reportagem continua sendo a realização de um sonho.
Eu compreendo o quão inviabilizadas nossas histórias podem ser. Estar em determinados espaços é como romper barreiras até bem pouco tempo intransponíveis. No “Negra Sou”, eu conto as histórias de mulheres negras que atuam em algumas das profissões mais valorizadas do país, como as áreas de Direito e Medicina. Como já disse outras tantas vezes: nós precisamos mostrar as histórias de sucesso de mulheres negras para que percebamos, cada vez mais, que estes espaços também são nossos.
Não, eu não enriqueci com o Negra Sou. Não de forma monetária. Mas enriqueci de conhecimento, de troca de afeto, de inspirações, emoções e partilha. Tanto a partir das mulheres retratadas nas páginas da obra, como a partir das pessoas que a leem e me retornam com depoimentos capazes de fazer os olhos marejar.
Já foram tantas conquistas refletidas em alegrias. As premiações, os exemplares adquiridos por instituições internacionais, como as universidades da Califórnia e do Texas e a Biblioteca do Congresso Americano. As mensagens de mulheres que contam como o livro lhes foi inspirador.
Cada um desses momentos tem um espaço especial no meu coração. Mas, ainda ouso sonhar. Sei que as barreiras são muitas. Infelizmente, nem todas as pessoas valorizam e visibilizam a escrita de autoras negras, ainda mais aquelas que ainda não alcançaram o mercado editorial padrão, ainda mais aquelas que vêm de um estado do Nordeste.
Mas, ainda ouso sonhar. Ouso sonhar com o Negra Sou sendo adotado por escolas do meu Pernambuco e de todo o país. Ouso sonhar com as histórias do livro inspirando milhares de meninas e mulheres negras. Ouso sonhar que em um futuro próximo nossas histórias de sucesso sejam cada vez menos exceções e mais realidades concretas.
Nesse sentido, enxergo como muito importantes ações que permitam o acesso da população negra a espaços antes pouco ocupados por nós. Políticas e ações, afirmativas e de inclusão, que ajudem a diminuir as desigualdades históricas do nosso país.
Por fim, agradeço aqui, uma vez mais, às organizações que apoiaram o lançamento da segunda edição do Negra Sou. Agradeço ao Selo Mirada Janela, que esteve ao meu lado nas últimas semanas. Meu muito obrigada também à Abayomi Juristas Negras e ao escritório Martorelli Advogados, que incentivaram e contribuíram para que o projeto ganhasse asas e fosse publicado.
Espero que essa segunda edição seja o início de um novo belo caminho. Que mais pessoas se inspirem pelas histórias contadas no livro. Ficarei imensamente feliz em conhecer novas leitoras e leitores. Caso tenha interesse, você pode adquirir um exemplar autografado entrando em contato comigo diretamente pelos perfis no Instagram (@jaquefraga_ e @livronegrasou).
Leia mulheres! Leia mulheres negras! Apoie novas autoras!
Sigamos criando e ocupando espaços!!
Sobre a autora
Jaqueline Fraga é escritora, jornalista formada pela Universidade Federal de Pernambuco e administradora pela Universidade de Pernambuco. Apaixonada pela escrita e pelo poder de transformação que o jornalismo carrega consigo, é autora do livro-reportagem “Negra Sou: a ascensão da mulher negra no mercado de trabalho”, finalista do Prêmio Jabuti 2020, e do “Big Gatilho: um livro de poemas inspirado no BBB21. Pode ser encontrada nas redes sociais nos perfis @jaquefraga_ e @livronegrasou no Instagram.
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