Lideranças negras de todo o país, ministros do governo e representantes de movimentos sociais participaram, nesta terça-feira (27), da inauguração do Hub Peregum, a Casa de Movimentos Negros, no Lago Sul, em Brasília. A iniciativa atuará em defesa da agenda antirracista junto aos Três Poderes.
“Essa casa é uma demanda do movimento negro há meio século. Todos os grupos de interesse desse país têm escritório e lobby em Brasília. Todos os grupos influenciam o Congresso Nacional para as suas demandas, e o povo negro, que é a maioria do povo brasileiro, não tinha esse espaço. A partir de hoje, ele tem”, celebrou Douglas Belchior, coordenador da Uneafro.
Uma das salas do espaço foi batizada em homenagem a Benedita da Silva e Paulo Paim, lideranças políticas que atuaram em nome do movimento negro durante a Constituinte.
“São aqueles que nós temos como espelho, que a gente quer reproduzir no Congresso Nacional. São pessoas que inspiram a nossa luta. Nós somos de uma tradição em que a gente saúda os mais velhos o tempo todo. Os mais velhos são aqueles que dão o caminho, são aqueles que orientam”, afirmou Douglas durante a inauguração da sala.
Benedita da Silva, deputada federal pelo Partido dos Trabalhadores do Rio de Janeiro (PT-RJ), recebeu a homenagem com muita emoção. Ela foi a primeira mulher negra a ocupar os cargos de vereadora no município do Rio de Janeiro, deputada federal na Assembleia Constituinte de 1988, senadora da República e governadora do Estado do Rio de Janeiro “Eu participei desse sonho, e hoje ele foi realizado”, disse a parlamentar sobre a iniciativa de criação de um espaço par articulação da agenda antirracista em Brasília.
“Nós tivemos um grande retrocesso [no governo anterior], mas agora está nas mãos de vocês, porque os instrumentos estão aqui nessa Casa para podermos realizar o sonho não apenas da negritude, é uma questão da democracia. Não há democracia onde há exclusão da maioria do povo brasileiro, que somos nós negras e negros desse país”, defendeu.
Paulo Paim, senador e autor da lei que criou o Estatuto da Igualdade Racial em 2010, afirmou que, embora a criação de um espaço como esse tenha demorado, acredita que a casa será foco de debate de grandes temas da área pública e privada.
“Essa casa vai ser um debate permanente das políticas públicas de combate a todo o tipo de preconceito. Com certeza, vai ser um espaço da cultura, do conhecimento, do saber, das grandes articulações, como dialogar mais de forma permanente os movimentos aqui em Brasília com o executivo, com o judiciário e com o próprio legislativo. Quem ganha nesse momento é o Brasil. Porque nós, de forma organizada e com a potência desse local ativo naturalmente vamos avançar muito mais”, projetou.
Também participaram da inauguração ministros do governo, senadores, deputados federais e distritais.
Questionada pelo Brasil de Fato DF em relação ao impacto das mudanças climáticas para a população negra, Marina Silva disse que as pessoas negras são “as que mais sofrem as consequências” dos eventos climáticos extremos. “Por isso que trabalhamos com o conceito de transição justa, de justiça climática, exatamente para olhar para aqueles que foram vulnerabilizados e que agora estão pagando o maior preço”, defendeu.
Hub Peregum
A Casa de Movimentos Negros em Brasília é uma iniciativa do Instituto de Referência Negra Peregum, realizada em parceria com a UNEafro Brasil, a Coordenação Nacional de Articulação Quilombola (Conaq), a Agência Alma Preta e o Instituto Nós em Movimento.
“O Instituto Peregum tem pessoas com quem eu militava há anos, pessoas que eu admiro, que a gente tem construído junto. Então, que seja um lugar de exemplo para muitos outros e toda a administração pública. Que toda Brasília possa sentir a força desse espaço para nós, pessoas negras”, afirmou a ministra da Igualdade Racial, Aniele Franco.
O principal foco do Hub Peregum será em ações de advocacy, buscando articulação junto a entidades, organismos nacionais e internacionais, instâncias e agentes de representação no poder legislativo e judiciário, e veículos e canais relevantes para a opinião pública. O objetivo é criar um estado de opinião pública antirracista e mudar políticas públicas em favor da população negra.
“A história do movimento negro é uma trajetória coletiva, compartilhada. A nossa existência nos espaços sempre foi diminuída, invisibilizada, então estar juntos é uma estratégia histórica, que se expressa nessa Casa”, defendeu Beatriz Lourenço, diretora de incidência política do Instituto Peregum.
“A ideia dessa Casa é garantir que a nossa capacidade de formular política pública, de compreender como ela precisa ser, de propor um projeto de país, seja organizada a partir da atuação desses movimentos no diálogo com o Congresso, com o Executivo, mas também no diálogo com a sociedade civil brasileira, porque é nisso que a gente acredita”, completou.
O Instituto de Referência Negra Peregum é uma organização sem fins lucrativos, com natureza de direito privado, criado em 2019 por militantes da educação popular. A organização atua em quatro eixos principais: educação popular, proteção e cuidado, incidência política e litigância estratégica, e clima e cidade.
“Nós estamos bem felizes. Esperamos que o movimento negro aceite, acolha, receba e participe também, para que esse espaço seja cada vez mais preto, cada vez mais participativo, cada vez mais democrático. Vamos aquilombar aqui o Lago Sul”, disse Selma Dealdina, da Conaq, uma das organizações parceiras da Casa.