Polícia conclui que morte de Luana Barbosa foi causada por agressões

Negra, lésbica e periférica, a mulher foi morta após um espancamento cometido por policiais militares em 2016, em Ribeirão Preto (SP)

por Tatiana Merlino, da Carta Capital 

Negra, lésbica e periférica, Luana morreu após ser espancada por três policiais. (Arquivo Pessoal)

A Polícia Civil de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, finalizou o inquérito policial que investigava a morte de Luana Barbosa dos Reis, ocorrida em 13 de abril de 2016. A conclusão foi de que houve lesão corporal seguida de morte.

O inquérito foi encaminhado ao Poder Judiciário no dia 5 de abril, informou a Secretaria de Segurança Pública, por meio de nota. Agora, cabe ao Ministério Público denunciar ou não os policiais Douglas Luiz de Paula, Fábio Donizeti Pultz e André Donizeti Camilo, do 51º Batalhão da PM.

“É uma boa notícia, mas acho que ela chega com muito atraso”, afirma Daniel Rondi, advogado da família. “Minha preocupação é que com a burocracia processual, a impunidade acabe prevalecendo”, diz. “O processo, que foi arquivado na Justiça Militar, quando foi para a Justiça comum, no começo de março de 2017, demorou muito a concluir a investigação”, explica. “Em 4 de abril de 2017 o juiz determinou que se terminasse a investigação, mas o inquérito ia e voltava da delegacia, sem que fosse concluído”, afirma advogado.

A reportagem de CartaCapital procurou o promotor responsável pelo caso, Eliseu José Berardo Gonçalves, mas, por email, o Ministério Público informou que o caso corre em segredo de justiça.

Negra, lésbica e moradora da periferia, Luana era alvo frequente de abordagens policiais. Sua morte, em abril de 2016, ocorreu em decorrência de um espancamento cometido por policiais militares, no dia 8, na periferia de Ribeirão Preto (SP). Luana lutou por sua vida durante cinco dias, enquanto esteve internada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital da região.

No dia 13, ela morreu em decorrência de uma isquemia cerebral causada por traumatismo crânio-encefálico.

No dia que foi espancada pela PM, ela saiu de casa de moto para levar o filho de 14 anos à aula de informática, quando, na esquina de sua rua, foi abordada pelos policiais do 51º Batalhão da PM. Luana foi parada e não permitiu ser revistada pelos PMs, exigindo a presença de uma policial feminina.

O garoto presenciou a cena do espancamento e ouviu de um dos policiais: “sua mãe já era”. Sua cabeça foi empurrada contra a janela da viatura, para que a visse dentro, machucada, com as mãos e pés algemados.

Dois laudos do Instituto Médico Legal (IML) constatam as agressões às quais Luana foi submetida. O primeiro, quando ainda estava internada no Hospital das Clínicas, atesta politraumatismo causado por agente contundente. Já o exame necroscópico constata morte por traumatismo crânio-encefálico e isquemia cerebral provocada por “dissecção de artéria vertebral à esquerda secundária a espancamento, conforme resultado de angiografia cerebral”.

Investigações

Inicialmente, o caso estava sendo investigado pela Polícia Civil, mas em maio de 2016 o juiz Luiz Augusto Freire Teotônio, de Ribeirão Preto, negou o pedido de prisão temporária dos três policiais, feito pelo delegado Euripedes Stuque, responsável pelo inquérito. O juiz ainda remeteu os autos do processo à Justiça Militar, alegando que não se tratava de um crime contra a vida.

No final de janeiro de 2017, a Justiça Militar do Estado de São Paulo arquivou o processo contra os três policiais envolvidos no espancamento de Luana. A promotora da Justiça Militar, Robinete Le Fosse pediu o arquivamento do caso “pela total ausência de materialidade delitiva”.

O promotor Eliseu Berardo Gonçalves, responsável pelo caso na esfera criminal, recorreu da decisão e pediu que a investigação voltasse à Polícia Civil. Em 31 de janeiro de 2017, a 4ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) julgou procedente o pedido e determinou que o caso voltasse à 1ª Vara do Júri de Ribeirão. O caso foi remetido para o 3º DP de Ribeirão Preto, onde o registro da ocorrência foi feito quando Luana foi espancada.

CartaCapital solicitou entrevista com os policiais investigados e questionou se algum dos três policiais voltou a trabalhar nas ruas, mas não teve retorno até a publicação da reportagem.

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