Ponte Preta acena na contramão do futebol brasileiro com um inédito presidente negro

Conhecedor do histórico pontepretano contra o racismo, o mandatário Tiãozinho busca usar o cargo para implementar uma política de inclusão racial dentro do clube

Por Diogo Magri, do El País

Sebastião Arcanjo é novo presidente da Ponte — Foto: Carlos Velardi/ EPTV

A Ponte Preta é um dos clubes que se destacam historicamente no combate ao racismo dentro do futebol brasileiro. Logo em 1900, 12 anos após a abolição da escravatura, o primeiro time principal da Macaca contava com Miguel do Carmo, negro e jogador de futebol, antes de qualquer outra equipe do país, motivo pelo qual os pontepretanos reivindicam o título de primeira democracia racial no esporte do Brasil. Apesar do pioneirismo, a equipe campineira demorou mais de um século para eleger um negro como representante máximo da instituição. Foi apenas em novembro de 2019, quando Sebastião Arcanjo, o Tiãozinho, herdou o cargo de presidente do clube após a renúncia de José Armando Abdalla. No momento que assumiu, Arcanjo também se tornou o único presidente negro entre os clubes das séries A e B do campeonato brasileiro. E, na contramão dos principais adversários, ele chegou anunciando três negros e uma mulher para compor a diretoria executiva da Ponte. “Obviamente a inclusão foi um critério, porque ela é necessária e atual”, conta Tiãozinho.

Sebastião foi vereador e deputado estadual pelo PT em Campinas antes de ser eleito vice de Abdalla no time de coração, onde anteriormente atuou como diretor de futebol. Hoje, o mandatário quer usar sua posição no clube para combater as desigualdades que identifica na sociedade. “Em qualquer organização, nós, negros, estamos a quilômetros das tomadas de decisão. No futebol, não somos notados além das quatro linhas. Vivemos em um país que está acostumado a mandar em nós e não a receber nossas ordens, por isso tenho um grande desafio pela frente”, diz o presidente.

Tiãozinho reclama da demora da Ponte em eleger um representante negro, mas admite que o problema reflete a “fotografia” da sociedade brasileira. “O nível de qualificação exigido fora de campo no futebol nos afasta. A estrutura acadêmica do Brasil obriga os mais pobres a escolherem entre estudar e trabalhar, e o negro normalmente precisa escolher o trabalho, o que nos afasta das atividades mais prestigiadas”. O presidente liga a falta de oportunidades ao país “historicamente racista”, mas vê na Ponte Preta, também pelo aspecto histórico do clube, o cenário ideal para combater a discriminação racial.

Continue lendo aqui

Leia também:

A barreira à ascensão dos dirigentes negros no alto escalão do futebol

A lucidez de Roger Machado, treinador do Bahia, ao expôr as raízes do racismo no futebol brasileiro.

+ sobre o tema

Contra o racismo, educação

Algumas notícias relacionadas à temática racial chamaram a nossa...

Uma ofensiva contra a intolerância, o racismo e o ódio crescentes

Aslak Sira Myhre (*) Como qualquer outro cidadão de...

‘Racismo é estrutura que aprisiona pessoas negras’, diz Bárbara Carine

Desejos por profundas e assertivas mudanças no aspecto educativo...

para lembrar

Inclusão não é favor

Inclusão não é favor. Inclusão é direito! Essa é...

Manifestação reúne mil jovens contra o governo Alckmin

Marcha pela Jornada Nacional de Lutas da Juventude...

Racismo nos espaços feministas brancos

Quando falamos de “espaços feministas brancos” o que queremos...
spot_imgspot_img

Post da PM mostra policiais com braço erguido em frente a cruz em chamas

Um perfil do 9º Baep (Batalhão de Ações Especiais de Polícia), de São José do Rio Preto, publicou no Instagram um vídeo em que...

Assassinatos de jovens negros por polícia serão denunciados em fórum da ONU

Entre 14 e 17 de abril, acontece na sede da ONU, em Nova York, a 4ª edição do Fórum Permanente de Afrodescendentes, com o...

Senegaleses protestam em SP pelo assassinato de ambulante: ‘Não foi uma fatalidade’

Centenas de pessoas caminharam pelo centro de São Paulo, na tarde desta segunda-feira (14), exigindo justiça para o senegalês Ngange Mbaye, mais uma vítima da...
-+=