Racismo, preconceito e ameaças de morte viram rotina em universidades públicas de São Paulo

Três ofensas graves foram registradas em um mês; especialista vê negligência das instituições

Em pouco mais de um mês, três universidades públicas registraram casos de ofensas sexuais e preconceito por meio de xingamentos escritos em paredes, portas, em diferentes locais dos campus. O caso mais recente ocorreu na UFABC (Universidade Federal do ABC), no campus São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, onde alunos sofreram ameaças de morte depois que organizaram um grupo para trabalhar dentro da faculdade temas como gênero e comunidade.

Sylvia Albuquerque, Do R7

Imagem: Montagem/R7

Segundo um aluno do curso de Ciências Sociais e Humanidades que não quer ser identificado por medo de represálias, um grupo de cerca de 20 alunos revitalizou um movimento chamado Prisma e divulgou uma ação que seria feita sobre diversidade. A ideia do grupo de promover um ambiente acadêmico democrático virou um pesadelo.

— Depois que saiu na imprensa local sobre nosso grupo, passaram a nos xingar de maneira violenta como “todos da prisma vão morrer”. Além das coisas escritas, alguns membros foram perseguidos e ameaçados pessoalmente.

Em nota, a universidade disse que “repudia qualquer manifestação de preconceito e intolerância, seja em suas instalações ou fora delas. Convivemos em um ambiente plural e democrático e, como tal, defendemos a diversidade de pensamentos e comportamentos, sempre no espírito de tolerância e respeito mútuo”.

No dia 7 de maio, pichações agressivas contra estudantes negros foram feitas dentro da USP Leste com xingamentos como “preto tem que morrer”. Em fevereiro deste ano, as agressões verbais do tipo “fora macacos lugar de negro é na senzala” foram encontradas no banheiro masculino da mesma faculdade. Após o episódio, o Coletivo de Negras e Negros foi criado.

Na Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), da USP (Universidade de São Paulo), em Piracicaba, interior de São Paulo, um cartaz que ligava o nome de alunas a “críticas” sexuais foi exposto em um espaço de convívio entre estudantes. A faculdade abriu sindicância, pois há relatados até de estupro dentro de uma república.
Falta de apoio
Para a psicopedagoga Neide Nofs, é inadmissível que comportamentos de intolerância sejam aceitos dentro das universidades. Ela defende que as instituições sejam mais “duras” no combate a esse tipo de atitude.

— As universidades precisam criar meios mais efetivos de apoio aos alunos que são vítimas dessa intolerância. É possível criar ouvidorias, centros de apoio, criar meios que prestem um verdadeiro apoio ao estudante que se sente ameaçado. A universidade deve ser um lugar de pluralidade, é nela que transformamos o futuro do nosso País e temos a possibilidade de refletir sobre uma melhor qualidade de vida. A presença de todo estudante precisa ser respeitada, seja ele negro, gay, religioso, ou o que for.

A educadora recomenda, ainda, que grupos como o Prisma e Negras e Negros procurem a direção da universidade antes de serem divulgados. Isso, na teoria, não deveria ser necessário, mas pode trazer uma maior segurança aos alunos.

— A pessoa capaz de agredir a outra se sente ofendida com as mensagens passadas por esses grupos. A proposta acaba sendo revertida em algo ruim porque ele [agressor] interpreta como uma provocação. A importância de ter o apoio da universidade mostra para essa pessoa que a instituição apoia esses movimentos e está do lado do grupo. Isso pode intimidar a ação dessas pessoas.

Neide ressaltou também a importância da realização de denúncia formal dos casos de intolerência à polícia ou ao Disque 100, da secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

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