Reorganizar a esquerda passa por enfrentar o racismo e o patriarcado

Foto: Gabriel Brito/Correio da Cidadania

Dia desses tive a honra de dividir uma mesa de debate com o historiador e professor da Unicamp, Leandro Karnal. Dentre as diversas reflexões que trocamos junto a uma grande e qualificada platéia daquela universidade, uma delas me marcou. Ao responder uma questão acerca da conjuntura, Karnal disparou:

“Ao afirmar que vivemos uma ‘onda conservadora’, partimos de um pressuposto otimista, afinal, ao considerar que hoje estamos diante de uma onda conservadora, supõe-se que antes ela não existia. Mas ela não existia?”

Por Douglas Belchior no Negro Belchior

Seria exagero dizer que o conservadorismo é uma característica da própria formação da sociedade brasileira? Somos uma sociedade mais conservadora hoje do que éramos anos atrás? Há mesmo essa tal polarização entre “esquerda” e “direita” do Brasil? O racismo, o machismo ou a homofobia são mais presentes e incidentes hoje que outrora?

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Há tempos movimentos sociais e especialmente aqueles que se organizam em torno do enfrentamento ao racismo e ao patriarcado reafirmam a necessidade em se tratar destes temas não apenas como especificidades, mas como elementos estruturantes da desigualdade e da opressão, tão determinantes – no caso brasileiro – quanto o elemento econômico.

Penso que, se há algo de positivo no que vivemos hoje, é o fato de que o debate sobre o racismo e o patriarcado enquanto elementos estruturantes das desigualdades e da opressão, ocupou definitivamente a agenda da política.

Afinal quando, em outro momento da história, as categorias jovens, mulheres e negros ocuparam tanto o espaço da retórica e da elaboração de quase todos os seguimentos ideológicos e políticos? Quando em outro momento o genocídio negro e o feminicídio fora tão pautado e até reconhecidos como crimes do Estado Brasileiro?

Mas daí a ocupar o protagonismo e a condução das ações políticas nos diversos espaços, é uma outra história. Esta é a tarefa que se coloca.

As forças políticas da esquerda brasileira, acuadas como nunca e repleta de contradições, equívocos e antagonismos, terão sensibilidade para mudanças? Haverá coragem para a autocrítica às práticas equivocadas das experiências de poder? A esquerda continuará a ser caracterizada por corpos, culturas e práticas branca-hétero-masculinas? Há chances de mudanças?

Para buscar ou reafirmar respostas e práticas, estudar é preciso. Daí a importância em se voltar a investir na formação política de novos quadros, a partir desta perspectiva, bem como tem feito a Confederação Nacional dos Metalúrgicos, onde tive a oportunidade de contribuir junto ao encontro dos Coletivos de Mulheres, Juventude e Igualdade Racial.

Encontro inédito reúne Coletivos de Mulheres, Juventude e Igualdade Racial na CNM

Do Site da CNM

Aconteceu, entre os dias 2 e 4 de agosto, o encontro dos Coletivos Nacionais de Mulheres, Igualdade Racial e Juventude da Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM/CUT). Pela primeira vez, os três coletivos realizam esta atividade em conjunto. O objetivo é articular e integrar a política dos coletivos da Confederação e elaborar planos de ação.

 

A atividade, que reúne um grupo de 50 pessoas composto por representantes das federações e sindicatos de bases estaduais, teve como palco a Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF), em Guararema (SP), espaço de educação idealizado e mantido pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

Participaram da mesa de abertura o presidente da CNM/CUT, Paulo Cayres, e os secretários de Juventude, Silvio Ferreira, de Mulheres, Marli Melo, e de Igualdade Racial, Christiane dos Santos. Além deles, também estão no encontro as secretárias de Formação, Michele Marques, e de Comunicação, Cláudia Marques da Silva.

A secretária de Mulheres destacou a integração inédita dos três coletivos para o fortalecimento e articulação das políticas da CNM/CUT. “São temas transversais. Este encontro empodera jovens, mulheres e negros para fortalecer e potencializar as políticas e ações sindicais nos espaços de participação dentro das federações e sindicatos”, avaliou Marli.  “Os secretários acompanham e orientam, mas cabe aos integrantes levar as propostas encaminhadas durante o encontro”, completou.

Para Silvio, a juventude é um dos principais agentes de transformação e construção da sociedade democrática no mundo. “Vivemos um momento histórico na categoria, pois 63% dos metalúrgicos cutistas são jovens. O propositivo do coletivo é justamente fomentar a participação ativa da juventude metalúrgica no ambiente de trabalho e, assim, construir novos quadros de dirigentes”, explicou.

Já Christiane lembrou do processo de construção do Coletivo que coordena, por meio do curso “Combate ao Racismo para a Construção da Igualdade Racial”, que sensibilizou as entidades de metalúrgicos cutistas para o tema, a partir da troca de experiências e da formação teórica.

“A criação do Coletivo foi diferente porque teve tem o intuito de debater e elaborar propostas para superação do racismo no mundo do trabalho e na sociedade. Somos mais um instrumento para combater o racismo e é um compromisso do movimento sindical lutar pela igualdade, principalmente, na questão racial”, afirmou a secretária.

A programação contemplou um momento para reflexão e debate sobre o tema da redução da maioridade penal e sua relação com o contexto político mais geral, que contou com a colaboração de Douglas Belchior, professor de história e sociologia e militante da Uneafro-Brasil. Depois disso os coletivos se aprofundaram em discutir formas de intervenção e fortalecimento político dos grupos em seus espaços de atuação.

Fotos: Reprodução/Negro Belchior

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