Sobre racismo e suas múltiplas manifestações

O propósito desta publicação é apresentar um tipo de “tutorial” sobre o Racismo e as diversas formas em que esse fenômeno se manifesta. Para tanto, dividi a apresentação em seis partes:

Por Prof. Jomo em seu blog

  1. O que é Racismo?
  2. O que é Racismo Institucional?
  3. O que é Racismo Estrutural?
  4. O que é Branquitude?
  5. O que é Negritude?
  6. O que é o Black Power?

 

  1. O que é racismo?

É um conjunto de práticas de uma determinada raça/etnia que, estando em situação de favorecimento social, coloca outra(s) raça(s) em situação desfavorável, enquanto exaltam, direta ou indiretamente, a sua própria. Essas práticas podem ser conscientes ou não, propositais ou não.

O racismo se manifesta de diversas formas: no plano individual, das relações interpessoais; no plano institucional; no plano  estrutural  que é onde se revela de forma ainda mais complexa.

  1. O que é racismo institucional?

É quando a prática racista se manifesta institucionalmente, seja na esfera pública ou privada. Isso faz com que negros, indígenas e imigrantes “não-brancos” sejam preteridos em relação à saúde, educação e, no tocante à segurança, tornem-se alvo (está em curso um genocídio perpetrado contra a população negra e indígena) ou sejam negligenciados.

  1. O que é racismo estrutural?

Nesse ponto, é preciso que nós entendamos o racismo como um fenômeno conjuntural, ou seja, algo que perpassa todas as esferas de poder (públicas e/ou privadas); manifesta-se na política enquanto forma ou a arte de melhor governar, manifesta-se em políticas partidárias, manifesta-se em políticas econômicas, manifesta-se na produção cultural.

  • Percebe-se essa estrutura ao observar que o percentual de negros e “pardos” no Ensino Superior, apesar das políticas de Ações Afirmativas como as Cotas Raciais, ainda não passa de 11%.
  • Percebe-se essa estrutura quando se constata que jovens negros e de periferia constituem cerca de 77% dos homicídios registrados.
  • Percebe-se essa estrutura no processo de encarceramento em massa, onde a maioria dos apenados são negros e pobres – “negro e pobre” na mesma sentença, em termos históricos, soa como redundância.
  • Percebe-se essa estrutura quando mulheres negras são as maiores vítimas de violência obstétrica pois há um pensamento naturalizado de que “são mais fortes”, “não necessitam de muita anestesia”; quando são adolescentes negras e pobres, a violência é ainda maior.

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Violência Obstétrica

Um ponto interessante em relação ao racismo estrutural é a naturalização daquilo que não é “natural”, mas algo construído histórica e socialmente.  Nesses termos, branquitude é, politicamente, algo “natural” e universal.  Tudo aquilo que nega ou entra em choque com os padrões estabelecidos pela branquitude torna-se “anormal”, “exótico” ou “perigoso”, “nocivo”, devendo, portanto, ser destruído.

 

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A vigilância e a repressão, sob a égide do Estado, tem cor e classe bem definidos.

  1. O que é Branquitude?

“A branquitude é compreendida como um sistema de valores e comportamentos que toma o ser branco como “o modelo universal de humanidade”, o representante de todas as pessoas. Esses valores levam a uma espécie de “cegueira social”, fazendo com que grande parte das pessoas brancas não consiga enxergar a dor das pessoas que enfrentam discriminação étnico-racial. Tais valores contribuem também para o desenvolvimento de um certo sentimento de superioridade, muitas vezes não assumido, por parte de várias pessoas brancas com relação a outros grupos raciais. A branquitude faz com que muitos entendam como “natural” a desigualdade entre pessoas de diferentes pertencimentos raciais.”

(Indicadores de Qualidade na Educação – Relações Raciais na Escola – Pág. 75, Ação Educativa)

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Novela “Os Dez Mandamentos”, cujo elenco tem sido não apenas objeto de análises, mas críticas: white washing, “enbranquecimento” é uma delas, e algo bastante recorrente na indústria cinematográfica e televisiva.

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Elvis Presley, um exemplo de como funciona o que chamamos de Apropriação Cultural: os negros criam um estilo musical mas são os brancos que mais faturam com isso.

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Eminem: Deus do Rap?

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A Revista Marie Claire já teve em suas capas e edições mulheres de etnias diversas mas o “padrão” continua sendo europeu.

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Aimé Cesaire

 5. O que é Negritude?

Historicamente, a Negritude foi apresentada como um movimento político-literário encabeçado pelo senegalês Leopold Senghor e o francês Aimé Césaire, em conjunto com outros estudantes negros. Este movimento pretendia resgatar o valor do negro em termos culturais, artísticos e políticos, combatendo o racismo e o colonialismo. Em se tratando do processo histórico conhecido como Descolonização Africana, Negritude e Pan Africanismo foram como espada e bainha. Ao longo do século XX e ainda no século XXI, é uma corrente política e filosófica que tem ganhado força tanto nos EUA como no Brasil.

 

Sou contra a estratificação da sociedade em superior-inferior, branco-negro, que faz do branco um eterno professor e do negro um eterno aluno (e um mau aluno, além do mais).Sou contra a arrogância intelectual dos brancos que faz com que acreditem que a liderança branca é uma condição sine qua non (do latim, “sem a/o qual não pode ser”) neste país, e que os brancos têm um mandato divino pra imporem seu ritmo ao progresso.
Sou contra o fato de que uma minoria de colonizadores imponha todo um sistema de valores ao povo nativo.

Fragmento de “Escrevo o que eu quero”, cuja edição brasileira foi apresentada por Benedita da Silva. Trata-se uma compilação com escritos importantíssimos do ativista político Steve Biko, preso e torturado até morte pela polícia racista sul-africana em 1977.

South African black activist Steve Biko is seen in 1978. (AP Photo)
South African black activist Steve Biko is seen in 1978. (AP Photo)

Historicamente, tem sido assim em sociedades que vivenciaram o escravismo colonial moderno, como o caso brasileiro. Ver negros, indígenas, “não-brancos” ocupando espaços que lhes têm sido negado – apesar de, ideologicamente, estabelecidos (ref. Norbert Elias – Os Estabelecidos e Outsiders) afirmarem que “as oportunidades são iguais a todos” – causa incômodo. Incômodo, inveja, histeria, espanto ódio. Subjetivamente, as reações são das mais variadas.

  1. O que é Black Power?Ao contrário do que se se afirma no senso comum, “Black Power” não se trata de cabelo crespo e grande, natural. Black Power é um termo cunhado por Stokely Carmichael (Kwame Turé) e explicado no livro Black Power:  The Politics of Liberation, de 1968

É um chamado para os negros neste país para unirem-se, a reconhecerem a sua herança, para construir um senso de comunidade. É um chamado para os negros para definir seus próprios objetivos, para conduzirem suas próprias organizações.

Referências e Sugestões de Leitura

Campos Políticos: Esquerda, Direita e Branquitude


 Apropriação Cultural

I woke up like this: os mecanismos do racismo na música

http://www.geledes.org.br/tag/apropriacao-cultural/

O que é apropriação cultural?

http://azmina.com.br/2016/04/apropriacao-cultural-e-um-problema-do-sistema-nao-de-individuos/

http://blogueirasnegras.org/2013/11/27/tirem-maos-simbolos-luta/

http://ovelhamag.com/apropriacao-cultural/

Racismo Institucional

http://racismoinstitucional.geledes.org.br/

http://www.leiaja.com/carreiras/2014/03/12/racismo-institucional-preconceito-que-desmotiva/

Racismo Estrutural

http://www.geledes.org.br/tag/racismo-estrutural/#gs.i5604wE

http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,racismo-e-estrutural-e-institucionalizado-no-brasil-diz-a-onu,1559036

http://blogueirasnegras.org/tag/racismo-estrutural/

Pan Africanismo

http://panafricanismodeba.wixsite.com/ufabc/pan-africanistas

http://brasilescola.uol.com.br/geografia/panafricanismo.htm

http://www.educacional.com.br/reportagens/africa/parte-04.asp

Afrocentricidade

http://www.asante.net/articles/1/afrocentricity/

https://afrocentricidade.files.wordpress.com/2016/04/afrocentricidade-uma-abordagem-epistemolc3b3gica-inovadora-sankofa-4.pdf

http://www.africaeafricanidades.com.br/documentos/01112010_02.pdf

https://pt.scribd.com/doc/157587462/Introducao-a-afrocentricidade

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