O Comitê Afro-Brasileiro da United States Network for Democracy in Brazil (USNDB) manifesta a sua indignação transnacional com a crescente violação dos direitos humanos no Brasil, em especial quanto à morte recente de Agatha Felix, uma menina de oito anos baleada e morta pela polícia do Rio de Janeiro. Cinquenta e quatro porcento da população brasileira é afrodescendente. Apesar do tamanho dessa população, as suas vidas estão sob ameaça. Estamos preocupados principalmente com os seguintes assuntos: o Pacote Anticrime, a aprovação de legislação autorizando a coleta de DNA de pessoas acusadas de crimes, e o Acordo de Alcântara.
Nossa primeira preocupação é com a violência policial e com as execuções de afro-brasileiros. De janeiro a agosto de 2019, no estado do Rio de Janeiro, mais de 1200 pessoas foram mortas pela polícia e mais de 70 porcento das vítimas eram afro-brasileiros. Em contraste, 602 pessoas foram mortas pela polícia nos Estados Unidos no mesmo período. Em contraste ainda maior, 5.811 negros foram mortos pela polícia em 2015 e 2016 no Brasil, em comparação com 992 pessoas assassinadas pela polícia nos Estados Unidos em 2018. O Pacote Anticrime é promovido como algo destinado a combater quadrilhas de criminosos. Entretanto, com frequência brasileiros negros são vistos como criminosos e por isso pessoas inocentes são assassinadas. O Pacote Anticrime é perigoso porque resultará no aumento das execuções policiais de brasileiros negros. A morte de Agatha Felix é um exemplo do que resulta da militarização de bairros de baixa renda e do perigo do Pacote Anticrime. Agatha é uma das cinco crianças mortas pela polícia do Rio de Janeiro neste ano.
Nossa segunda preocupação é quanto à coleta de material genético de pessoas acusadas de crimes. O DNA de pessoas encarceradas tem sido coletado em bancos de perfis genéticos. No entanto, o governo federal tem aumentado o investimento no projeto para possibilitar que mais estados coletem material genético. A Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos tem o objetivo de “manter, compartilhar e comparar perfis genéticos para ajudar na apuração criminal e no processo de investigação” (Pedro Vilela, 19/09/2019, Agência Brasil). Nossa preocupação é que a polícia possa requisitar a coleta de DNA de qualquer pessoa acusada de um crime, mesmo que ela seja inocente.
Nossa terceira preocupação é quanto à ameaça às terras de famílias quilombolas no estado do Maranhão. O Acordo de Alcântara ou Acordo de Salvaguardas Tecnológicas permite que os Estados Unidos utilize o Centro de Lançamento de Satélites de Alcântara, Maranhão. Em 20 de agosto de 2019, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa do Conselho (Defense of Council) aprovou o acordo para ratificação no Congresso brasileiro. Não houve discussão com os membros da comunidade. Nossa preocupação é que a expansão desse programa resulte na expulsão de mais de 800 famílias quilombolas (descendentes de pessoas escravizadas que fugiram do cativeiro). Esse é um dos muitos exemplos de expulsão violenta de comunidades quilombolas no Brasil.
Este documento expressa a longa tradição de solidariedade negra que supera divisões e fronteiras nacionais. Este não é o primeiro caso de solidariedade negra transnacional. Negros em vários continentes têm manifestado solidariedade mútua por muitas décadas. A campanha anti-apartheid nos Estados Unidos foi um exemplo de negros norte-americanos a demonstrar solidariedade com negros sul-africanos. O grupo brasileiro anti-violência policial chamado “Reaja ou Será Morto” expressa a sua solidariedade com todos os afrodescendentes assassinados pela polícia internacionalmente. Desta forma, nós nos situamos num lugar histórico em que os negros se solidarizam através dos continentes. Nós queremos que seja claramente entendido que nós estamos prestando atenção e que condenamos a deterioração da democracia e dos direitos humanos no Brasil, em particular quanto às vidas e aos direitos dos negros.
Nós buscamos a restauração dos direitos humanos no Brasil, que comunidades negras de baixa renda sejam tratadas com respeito e dignidade. As comunidades negras brasileiras não podem ser demasiadamente expostas à vigilância policial e à militarização. Nós, abaixo-assinados, continuaremos a trabalhar em solidariedade para respeitar, valorizar e garantir a cidadania democrática e os direitos humanos dos cidadãos negros brasileiros.
Sharelle Barber, USNDB
Kia Caldwell, USNDB
Juliana Goés, independent researcher
Nia Hampton, USNDB
Michael Hanchard, USNDB
Zakiya Carr Johnson, USNDB
Gladys Mitchell-Walthour, USNDB
Hannah Moore, USNDB
Dalila Negreiros, USNDB
James Steele, USNDB
Erica Williams, USNDB
Jacob Eliseo, USNDB