A partir de primeiro de novembro, governos e sociedade civil se reuniram em Glasgow, Reino Unido, para a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), que tem como debate principal a descarbonização do planeta por meio da redução das emissões de gases de efeito estufa.
A existência da COP26 confirma que a crise climática já é uma realidade. O último relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), de 2021, foi taxativo ao afirmar que não há mais dúvidas sobre o papel da humanidade nos impactos das mudanças climáticas. Além disso, um estudo que acaba de ser publicado na revista Nature Climate Change destaca como a crise climática já afeta 85% da população mundial.
Junto à pandemia da Covid-19, os últimos anos colocaram em destaque a emergência climática e o recrudescimento do racismo no mundo e no Brasil.
A preocupação com os eventos climáticos em maiores escalas e os impactos na vida humana nunca foram tão expressivos.
A Coalizão Negra por Direitos, articulação que reúne cerca de 250 organizações, movimentos sociais de base e pesquisadoras(es) negras(os) do Brasil, tem denunciado e segue em luta constante contra o genocídio da população negra e o racismo ambiental.
O debate fundamental de racismo ambiental ainda não encontrou ampla adesão pelos movimentos ambientalistas no Brasil. Há também a falta de racializar as políticas públicas ambientais.
No Brasil, a maioria populacional é negra e representa, hoje, 56% da população, de acordo com o IBGE.
Negar o racismo ambiental é negar que o Estado brasileiro é racista, a realidade da vida nas periferias das grandes cidades, o aumento da fome, a violação dos direitos constitucionais contra comunidades, territórios quilombolas e terras indígenas e a história de urbanização do país e suas profundas desigualdades territoriais.
No caso da Amazônia, a floresta, os povos indígenas e as comunidades quilombolas têm sofrido os impactos do desmatamento e das atividades criminosas da mineração legal e ilegal.
As ações criminosas se somam às queimadas em escalas expressivas nas regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste, impactando os territórios dos povos e comunidades tradicionais. Assim como, historicamente, são as regiões onde mais ativistas de direitos humanos, indígenas, quilombolas e ambientalistas na luta em defesa das terras, das águas, das florestas e dos territórios são assassinados.
No espaço urbano, o efeito sobre a vida da população negra tem sido a desigualdade promovida pelos “planos diretores” (sem ampla participação social e formulados de forma a garantir os interesses de grandes capitalistas urbanos).
Nos últimos 20 anos do Estatuto das Cidades, eles têm tornado as cidades violentas e criminosas para a vida ambiental, social, cultural e econômica das pessoas negras.
O planejamento urbano é o racismo ambiental em perversidade visto e sentido nos espaços criminalizados (densamente populacional negro) geograficamente (aglomerados subnormais): as favelas, periferias, baixadas, morros, vales e palafitas.
A falta de água (bem essencial para todos) nas torneiras faz parte de um desastre diário nas periferias. O não abastecimento das casas nas periferias não se restringe às épocas específicas do ano, acontece todos os dias para que os espaços não-criminalizados (densamente populacional branco) tenham água disponível.
Vale reforçar que a definição do conceito de racismo ambiental se ampara no reconhecimento do Estado racial e na ação institucional deliberada que resulta em exposição desproporcional das populações negras e indígenas, as mantendo permanentemente em condições vulneráveis.
Mesmo diante de uma pressão cada vez maior dos movimentos negros de todo o mundo para que se reconheça a dimensão racial da crise climática, o Governo Federal tem dado contornos racistas ao debate urgente e de sobrevivência do planeta e das pessoas mais vulneráveis: mulheres e crianças negras e indígenas brasileiras.
As periferias resistem e vivem, mas as gestões públicas e privadas —os capitalistas racialmente orientados —continuam operando na lógica do “quarto de despejo”, como formulou Carolina Maria de Jesus.
A posição do atual governo e do presidente da República eleito em 2018 segue a mesma, simbolizada pelo discurso de meados de 2017, quando o então pré-candidato à presidência, após visitar um quilombo, no interior de São Paulo, disse em um evento do Clube Hebraica do Rio de Janeiro que “o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas”.
Por isso tudo, a Coalizão Negra por Direitos atuará em incidência com as demais organizações do movimento negro presentes na 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 26) contra o racismo ambiental, pela redução do aquecimento do planeta, desmatamento zero nas florestas Amazônia, Cerrado, Mata Atlântica e Caatinga brasileira e em defesa da titulação das terras e dos territórios quilombolas.
Será uma oportunidade de exigir soluções para a emergência climática que priorize o enfrentamento ao racismo ambiental, às desigualdades racial, de gênero e social, com a urgência que o planeta precisa!
Este documento na íntegra está sendo lançado na COP26 e pode ser consultado no site da Coalizão Negra por Direitos.
Coalizão Negra por Direitos
Reunião de entidades do movimento negro de todo o país para a incidência política no Congresso Nacional e em fóruns internacionais.
PerifaConnection
PerifaConnection, uma plataforma de disputa de narrativa das periferias, é feito por Raull Santiago, Wesley Teixeira, Salvino Oliveira, Jefferson Barbosa e Thuane Nascimento