É com satisfação que vimos o programa de vacinação de prevenção à Covid-19 começar no Brasil, mas sabemos que o caminho ainda está longo até sairmos do desastre social, econômico e humano que estamos vivendo. Depois de quase um ano de crise, já estamos com mais de 210 mil mortes relacionadas à Covid-19, a maior taxa de desemprego alcançada nas últimas décadas (cerca de 14 milhões de desempregados/as) e um sistema de saúde saturado ao ponto de faltar oxigênio no estado do Amazonas.
As trabalhadoras domésticas foram uma das categorias mais atingidas pela crise. Cerca de 1.5 milhões de empregos foram perdidos no ano de 2020, enquanto as que permaneceram no trabalho se encontraram expostas aos altos riscos de contaminação, à falta de acesso aos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) como máscaras e luvas, às quarentenas forçadas no local de trabalho, ao assédio, violência, e maus tratos, chegando às vezes à trabalho em condição análoga à escravo, além de sofrer aumento da carga de trabalho e redução de salário por parte dos empregadores.
Lembramos que a primeira morte por Covid-19 no Rio de Janeiro foi de Cleonice Gonçalves, trabalhadora doméstica, mulher negra, idosa, com comorbidades e contaminada pela sua patroa. Lembramos com dor, indignação e sede de justiça que nossa irmã Mirtes Santana foi cumprir, em pleno período crítico da pandemia, a tarefa de passear com os cachorros de sua patroa e na volta assistiu a seu filho Miguel, de cinco anos, perder a vida, porque sua empregadora Sari foi incapaz de cuidar de Miguel, deixando-o pegar sozinho um elevador e cair do 9º andar do edifício de luxo pernambucano.
Apesar dos riscos para nossa saúde e nossas vidas, vários estados consideraram o trabalho doméstico em todas as suas funções como essencial durante a pandemia, nos negando o direito à uma quarentena remunerada. Se as famílias de classe média não podem ficar sem nossos serviços durante a pandemia e precisam da nossa força de trabalho para cuidar de seus idosos, de suas crianças e de suas casas, então devemos ser prioritárias na fila da vacina!
Nesse sentido, saudamos a iniciativa da vereadora de Niterói Benny Briolly que protocolou, no dia 21 de Janeiro de 2021, o projeto de lei N° 00014-2021 sobre inclusão de trabalhadoras domésticas e cuidadoras na primeira fase do plano de vacinação contra Covid-19. Pedimos aos nossos parceiros e aliados que sigam o exemplo e nos apoiem nessa luta em nível municipal, estadual e nacional.
Somos em maioria mulheres negras. Muitas de nós continuam trabalhando depois dos 60 anos, com comorbidade como sobrepeso, pressão alta, diabetes e problemas respiratórios. Somos uma das maiores categorias de emprego para as mulheres no Brasil com mais de 6 milhões de trabalhadoras, e mesmo assim, estamos muito desamparadas frente à crise pandêmica e econômica que massacra o Brasil.
Nosso trabalho envolve contato e cuidado direto com pessoas, assim como a responsabilidade pela higiene e limpeza das casas onde trabalhamos. Nossas tarefas são essenciais ao bem-estar de milhões de famílias. Temos o direito de trabalhar de maneira segura e protegida. Temos direito de existir! Queremos vacina já!
Se os governantes decretaram lockdown e incluíram o trabalho doméstico como essencial, devem nos colocar também como essenciais e prioritárias na fila da vacinação contra a Covid-19.