Antes da pandemia, Maricléia Camargo Cassiano, de 38 anos, pagava todas as suas contas com a venda de roupas de seu brechó, montado diariamente na Avenida Paulista. Mas, no fim de março, depois que São Paulo precisou adotar medidas de isolamento social para evitar mais contágios por coronavírus, a estudante de Moda viu as vendas caírem 90%. Foi do coletivo Afro Máscras que recebeu a sugestão: por que não passar a confeccionar máscaras?
Além do encorajamento, a empreendedora recebeu do grupo orientações para a produção de acordo com as normas da Organização Mundial da Saúde (OMS), além de materiais como elástico e linha para dar os primeiros passos. Também pegou peças do seu acervo, desmanchou e as transformou em itens que agora protegem centenas de pessoas contra a Covid-19.
– O Afro Máscaras foi um pontapé, um estouro interno. Eu estava com medo de encarar o desafio, mas, quando fiquei em casa junto com a ansiedade e a máquina de costura, não tive outra opção: comecei a costurar. Sempre fiz o reparo da peças usadas, acredito no consumo consciente. Mas foi a minha primeira experiência vendendo algo que eu mesma fiz do zero – diz ela, que comercializa as máscaras criadas pelo Instagram do seu brechó, Bem Te Quer (@brecho_bemtequer).
Maricléia é uma das 80 afroempreendedoras do país mapeadas pelo Afro Máscras, grupo que se formou como uma resposta rápida ao problema da falta de renda, especialmente de trabalhadoras informais negras, em meio ao coronavírus. A proposta é ser um meio de campo entre quem quer doar máscaras ou materiais e quem quer comprar ou receber doações do item de segurança (saiba como participar no perfil @afromascaras no Instagram).
A ideia da iniciativa é de Caroline Moreira, de 35 anos, CEO da Negras Plurais, que decidiu compartilhar o que aprendeu ao longo da carreira com as irmãs de pele preta mais afetadas pela pandemia. Para isso, se uniu a Adriana Barbosa, da Feira Preta, e Ludmila Oliveira, da Criola Criativa, ambas donas de seus próprios negócios.
– Nós nos juntamos a partir das nossas áreas de conhecimento e fazemos a intermediação entre quem quer doar e quem precisa. Quando divulgamos o traballho de alguma afroempreendedora, mostramos a sua marca, os modelos à venda e colocamos na rede. Os compradores entram em contato com a marca que está mais perto da casa deles e combinam a entrega – diz ela.
Caroline reforça a importância de incentivar o empreendedorismo local:
– Estamos falando de criar uma renda que vai ajudar uma comunidade inteira, mostrar a nossa potencialidade, o que pessoas pretas fazemos com tão pouco. A gente traz esse projeto como motivação, como resgate da dignidade e da autoestima. Muitas dessas mulheres não querem cesta básica, querem viver do seu trabalho. Quando a gente dá uma cesta básica, a gente fomenta a economia dos grandes mercados para dar assistência para a comunidade. É importante, mas existe um jeito mais eficiente de ajudar. Quando você ajuda essa comunidade internamente, os bares crescem, o mercado do bairro cresce, e aí a comunidade cresce junto. É desenvolvimento local – diz Caroline.
Grupo já conseguiu doar mais de mil máscaras de proteção
UPAs, delegacias, presídios e outras instituições já receberam mais de mil máscaras doadas por afroempreendedoras inscritas no coletivo em menos de um mês.
– Algumas mulheres não tinham renda nenhuma, estavam com dificuldade para pagar o aluguel, e agora estão conseguindo se manter e passando adiante o que aprenderam. Também temos marcas conhecidas e não periféricas que estão fazendo doações importantes. Por isso, estamos recebendo materiais e distribuindo – diz Caroline, lembrando a experiência de Maricléia: – O caso dela deu tão certo que, agora, está coordenando o trabalho do Afro Máscras em São Paulo, recebendo doações e passando para outras mulheres que, como ela, precisam de um incentivo para começar.
Como ajudar
Para comprar máscaras, acesse o Instagram e busque o perfil @afromascaras. Lá, estão expostos os trabalhos de costureiras de todo o Brasil; escolha o mais perto da sua casa e mande uma mensagem.
Para doar dinheiro para o pagamento de diárias de costureiras (mão de obra para a produção de máscaras); materiais como tecido, elástico e linha; ou oferecer a produção de costura, mande um email para [email protected]