Aos sem-partido

A crise de representação dos partidos políticos não é um fenômeno novo. Ganhou corpo com o surgimento dos modernos meios de comunicação de massa, a sociedade de consumo e a desconstrução do sujeito moderno, cuja existência estava associada a classes sociais mais ou menos homogêneas, que deram origem aos modernos partidos de massas. Com a globalização, o enfraquecimento dos estados nacionais e o surgimento de novos atores políticos, essa crise adquiriu a configuração que temos hoje.

Por Luiz Carlos Azedo Do Mamapress

Devido à crise ética e ao impasse político que estamos vivendo, o fenômeno virou uma megajabuticaba aqui no Brasil. Tem todos os ingredientes da crise de representação que sacode, por exemplo, a política europeia, cujos melhores exemplos são a Grécia e a Espanha, do ponto de vista de novos atores, e a França, a Itália e Portugal, quanto às agremiações tradicionais. Mas ocorre em meio à recidiva do populismo latino-americano, que já colapsou na Argentina e na Venezuela. E tem como ponto alto o “nunca antes neste país” do PT, cujo transformismo desaguou no escândalo da Petrobras, que está sendo desnudado pela Operação Lava-Jato.

Cerca de 36 partidos com representação no Congresso compõem o cenário do impasse político brasileiro, porém, seus principais protagonistas são três: o PT, partido da presidente Dilma Rousseff e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva; o PMDB, do vice-presidente Michel Temer, encastelado no comando do Congresso; e, na oposição, o PSDB do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, do governador paulista Geraldo Alckmin e dos ex-governadores José Serra e Aécio Neves, os três pré-candidatos a presidente da República.

Embora se digladiem, esses grandes partidos engessam o sistema político brasileiro, de maneira que os demais só conseguem emergir como uma quarta força, com caráter de renovação, seja qual for o espectro político que represente. E bloqueio do processo político existe em razão de um arranjo institucional complexo: presidencialismo; federação esvaziada pela União; voto proporcional unipessoal para as casas legislativas, com exceção do Senado, onde o voto é majoritário; e sistema de distribuição do tempo de televisão e do fundo partidário que favorece o status quo. Aprovado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o fim do financiamento privado de pessoas jurídicas nas campanhas eleitorais aumentou a barafunda partidária.

A reação dos grandes partidos à mudança foi triplicar o fundo partidário, cuja distribuição é proporcional ao número de deputados de cada partido, e abrir uma janela de 30 dias para filiações partidárias, sem risco de perda de mandato, que começou a vigorar na sexta-feira passada. Legendas de aluguel procuram atrair deputados na Câmara dos Deputados oferecendo a divisão dos recursos adicionais do tempo de televisão na base do meio e meio, ou seja, metade para o “dono” do partido, metade para os deputados, que passam a administrar as seções regionais como se fossem franquias.

O canto da sereia atrai parlamentares que desejam se candidatar às prefeituras de suas cidades e não têm como financiar suas campanhas eleitorais, o que estressa as relações nas bancadas dos partidos que não adotam esse tipo de prática. É desnecessário dizer que esse leilão é um ingrediente a mais na panela de pressão da crise ética, que ameaça degolar dezenas de cabeças do Congresso envolvidas nas investigações da Lava-Jato.

Sangue novo
O modelo de financiamento de campanha adotado pelo STF seria mais compatível com o voto distrital, pois obstrui ainda mais a renovação da política brasileira, ao favorecer quem já está no poder, os candidatos de grandes posses e a utilização de caixa dois. Com o desgaste dos políticos, a possibilidade de levantar recursos nas campanhas eleitorais mediante as doações de pessoas físicas é muito exígua. A grande maioria dos eleitores não quer saber dos partidos, o que dirá doar dinheiro para suas campanhas.

Mas o problema é que não se pode prescindir dos partidos para construir saídas democráticas para a crise que o país atravessa. Esse é o drama atual da sociedade brasileira, cuja conta será paga pelas próximas gerações, uma vez que a atual elite política fracassou, tanto quanto a anterior. O Estado brasileiro não cabe mais no seu orçamento e o atual sistema político está bloqueado. São problemas que não se resolvem à margem da política e sem a participação dos políticos.

*Luiz Carlos Azedo: Jornalista, colunista do Correio Braziliense, formado na UFF nos anos de chumbo e amigo da Rede Radio Mamaterra/Mamapress

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