Diversas entidades, coletivos e pessoas autônomas aderem a carta que manifesta repúdio a ação do poder público no centro
Com o título “Pelo cuidado em liberdade e contra políticas higienistas”, documento assinado por cerca de 60 entidades e pessoas físicas, denuncia ação na cidade de São Paulo, no território chamado Cracolândia.
Para facilitar as adesões, o grupo propulsor da carta, a Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares e o Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (Cebes) formataram uma petição online que pode ser assinada por todas as pessoas e entidades. Clique aqui para acessar e assinar.
Leia o documento na íntegra a seguir:
Pelo cuidado em liberdade e contra políticas higienistas
O município de São Paulo é permanentemente marcado pela violência institucional dos detentores de poder político e econômico contra o povo. Enquanto mantemos a expectativa de que autoridades governamentais acolham e assistam a todas e a todos, respeitando a diversidade, a complexidade e o conjunto de necessidades que apresentem, bem como as múltiplas formas de manifestá-las em nossa sociedade, seria omissivo e irresponsável não reconhecer o papel perverso que os poderes Estadual e Municipal protagonizam agredindo vidas humanas e territórios, acumulando persistente repertório de violências contra o direito e a dignidade humanos e o cuidado em saúde.
Na qualidade de organizações e movimentos historicamente articulados em defesa da saúde como direito garantido a todos, oferecida por meio de um Sistema universal, integral, equitativo, público e gratuito, repudiamos a ação desferida contra as usuárias e os usuários do território paulistano conhecido por “Cracolândia” nas primeiras horas da manhã do domingo, 21 de maio de 2017, assim como repudiamos o projeto político, técnico e assistencial anunciado em conjunto por aqueles poderes, representando um enorme retrocesso no cuidado pela saúde mental de nossa população e no acolhimento daquelas e daqueles que convivem com o uso de substâncias psicoativas.
O emprego de verdadeiro poder brutal, por meio de ação repressiva deformada, está orientado no estigma e na caricatura vulgar do que é a usuária e o usuário, conforme revelam declarações à imprensa concedidas pelo Prefeito Municipal João Dória. Suas ações não atendem às necessidades, aos dramas sociais e sanitários em que tantas vidas humanas encontram-se imersas, dialogando apenas com interesses de quem deseja controlar corpos e mentes, contendo-os, quer seja biologicamente, através de internações involuntárias e compulsórias, quer seja politicamente, impedindo que se disponham livre e autonomamente pelo território, criando e produzindo suas intervenções.
Trata-se de indisfarçável projeto higienista, destinado a uma população predominantemente pobre e preta. A mesma população que é morta nas favelas e nas comunidades periféricas e que não encontra um lugar para existir dignamente, sendo vulnerabilzada, repetidamente violada e reprimida. Uma política efetiva de uso de drogas e redução de danos será sempre uma política que enfrenta o racismo estrutural e possibilita oportunidades de reinserção social. Neste sentido, tanto o Prefeito Municipal João Dória, quanto o Governador Estadual Geraldo Alckmin escancaram o projeto com que estão compromissados, buscando lucrar com o higienismo e favorecer empresários e especuladores em detrimento da vida humana.
Enquanto as melhores evidências para o cuidado destas usuárias e destes usuários são opostas à violência manicomial e intervencionista das políticas de saúde pretendidas por estes governantes, as evidências e o acúmulo político dos principais Sistemas Universais, igualmente, cada vez mais rechaçam programas que não dialoguem com a experiência humana e empreguem apenas a racionalidade biomédica para propor assistência ao sofrimento e às condições humanas.
Permaneceremos ao lado da dignidade da vida humana, sobretudo daquela fragilizada e oprimida, formulando um projeto despenalizador e emancipador de cuidado, por meio do qual experiências corporais não sejam objeto de ações repressivas e disciplinadoras, antes sejam forma de problematizar a própria política e sua aplicação sobre os territórios.
Assinam esse documento:
Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares
Centro Brasileiro de Estudos da Saúde
Associação de Alunos e Egressos do Curso de Obstetrícia da Universidade de São Paulo – AO USP
Instituto Silva Lane
Movimento Nacional de Direitos Humanos
Federação Nacional de Psicólogos
ONG Sã Consciência
Frente Estadual Antimanicomial de São Paulo
Sindicato de Psicólogos de São Paulo
Conselho Regional de Psicologia de São Paulo
Sindicato dos Psicólogos do Rio de Janeiro
Sindicato dos Psicólogos da Paraíba
Fórum da Formação para a Saúde – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Associação Brasileira de Psicologia Social – Núcleo Grande ABC
Associação Brasileira de Psicologia
Coletivo Gaúcho de Residentes em Psicologia
Movimento OCUPASUS do Rio de Janeiro
Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional – ABRAPEE
Laboratório Interinstitucional de Estudos e Pesquisas em Psicologia Escolar da Universidade de São Paulo – LIEPPE USP
Associação Brasileira de Economia da Saúde – ABrES
Associação Paulista de Saúde Pública – APSP
ONG É de Lei
Rede Unida
Fórum Popular de Mulheres do Paraná
União Latino-Americana de Entidades de Psicologia – ULAPSI
Rede Sem Fronteiras de Teatro da/o Oprimida/o
Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade – Núcleo Metropolitano
Associação Brasileira de Saúde Bucal Coletiva – ABRASBUCO
Secretaria Nacional da Mulher Trabalhadora da Central Única dos Trabalhadores – CUT.
Levante Popular da Juventude – célula de Saúde
Centro Acadêmico Emílio Ribas – Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo
Eleonora Menicucci – ex-Ministra-chefe da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres
Juliana Cardoso – vereadora de São Paulo (PT)
Conceição Lemos – jornalista
Pedro Paulo Freire Piani – Centro de Referência em Álcool e Drogas II da Universidade Federal do Pará
Rita Louzada – Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Ana Cleide Guedes Moreira – Universidade Federal do Pará / Programa de Pós-Graduação em Psicologia
Ângela Soligo – Universidade Estadual de Campinas
Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre a Mulher da Universidade Federal de Minas Gerais
Coletivo Gaúcho de Residentes em Saúde
Stellamaris Pinheiro – militante de direitos humanos e humanização
Fórum da Luta Antimanicomial de Sorocaba – FLAMAS
Loucos pelo Mundo – Movimento Social Antimanicomial de Sorocaba
Fórum Popular de Saúde Mental do ABCDMRR
Marco Akerman – docente da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo
Aparecida Linhares Pimenta – médica sanitarista do Sistema Único de Saúde
Lidia Tobias Silveira – médica sanitarista do Sistema Único de Saúde
Movimento Nacional da Luta Anitmanicomial – MNLA
Pubenza Lopez – médica especialista em Gestão de Serviços de Saúde.
Karina Calife – médica sanitarista, docente no IEP e na preceptoria de Atenção Básica na Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo, doutoranda do departamento de medicina preventiva da USP e militante do Movimento Feminista.
Toninho Vespoli – vereador municipal (PSOL)
Associação Brasileira Psicologia Política – ABPP
Fórum das Entidades Nacionais de Psicologia do Brasil – FENPB
Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia Política, Políticas Públicas e Multiculturalismo da Universidade de São Paulo – GEPSIPOLIM USP
Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia – ANPEPP
FENAPSI – Federação Nacional dos Psicólogos
Coordenação Nacional de Estudantes de Psicologia – CONEP
Partido Socialismo e Liberdade – PSOL
Balaio- Núcleo de Estudantes Petistas da Universidade de São Paulo
Rede Nacional de Feministas Anti-proibicionistas – RENFA
Rede Latino-Americana de Pessoas que Usam Drogas – LANPUD
Fórum Permanente de Saúde Mental do Alto Tietê
Grupo Interinstitucional Queixa Escolar – GIQE
Associação Brasileira de Psicologia Social – Núcleo Baixada Santista.
Iniciativa Negra por uma Nova Política Sobre Drogas
Elaine Maria Giannotti – fonoaudióloga sanitarista
Denizi de Oliveira Reis – médica sanitarista
Márcia Marinho Tubone – assistente social sanitarista
Movimento Chega de Descaso