O média-metragem é dirigido por Wertinon Kermes, com roteiro de Míriam Cris Carlos e edição de Marcelo Domingues
Por Felipe Shikama, no Jornal Cruzeiro do Sul
O documentário “Clementina de Jesus — Rainha Quelé” foi disponibilizado por seus realizadores na íntegra, na internet, na última terça-feira, dia 20, data em que foi comemorado o Dia da Consciência Negra. Vencedor de 23 prêmios em importantes festivais de cinema do País, o média-metragem dirigido pelo sorocabano Wertinon Kermes conta a história de Clementina de Jesus, senhora negra, pobre, dona de casa e empregada doméstica que, após toda uma existência longe dos palcos e das mídias, aos 60 anos passou a cantar com grandes nomes da música como João Bosco, Pixinguinha e Paulinho da Viola, com sua voz rascante e gutural.
Roteirizado por Míriam Cris Carlos e com edição de Marcelo Domingues, o filme de 56 minutos de duração narra a trajetória de Clementina de Jesus, carinhosamente chamada de Quelé pelos amigos. Cantores como Martinho da Vila, Leci Brandão, Cristina Buarque de Holanda, Carlinhos Vergueiro, João Bosco e Paulinho da Viola, Leci Brandão, Paula Lima e Grupo Fundo de Quintal, entre outros, participam da obra, falando um pouco das suas lembranças relacionadas à Clementina. O filme está disponível gratuitamente no link: https://vimeo.com/301702668
A artista, que começou a cantar profissionalmente só aos 62 anos, trabalhou como empregada doméstica durante 20 anos, até ser descoberta pelo pesquisador de MPB Hermínio Bello de Carvalho, em 1963, quando se apresentava em bares cariocas. No repertório da artista, estão canções gravadas por grandes nomes da MPB, como “Marinheiro Só”, interpretada por Caetano Veloso. Neta de escravos, Clementina de Jesus (1901-1987) nasceu em Valença, no Sul Fluminense, e aos 10 anos foi morar no bairro de Oswaldo Cruz, na Zona Norte do Rio de Janeiro, onde acompanhou o surgimento da Escola de Samba Portela, importante influência musical de sua carreira.
“Clementina de Jesus Rainha Quelé” foi lançado em 2012, ano que que completou 25 anos da morte de Clementina de Jesus. Atual secretario de Cultura e Turismo de Sorocaba e diretor de dezenas de documentários, incluindo “João do Vale: muita gente desconhece” (vencedor do Kikito de melhor documentário no Festival Cine Vídeo de Gramado, em 2004), Kermes publicou mensagem nas redes sociais na qual afirma que a decisão de disponibilizar o documentário visa alcançar maior número de pessoas, já que se trata de um trabalho de “semeação da cultura e da memória” e de conscientização de que o Brasil tem uma dívida com a cultura negra. “Acredito ser um direito de cada cidadão brasileiro conhecer a figura e a voz única de Clementina de Jesus”, defende.
Ao longo da carreira, Clementina de Jesus gravou 11 discos e também fez diversas participações especiais, como no álbum “Milagre dos peixes”, de Milton Nascimento, em que interpretou a faixa “Escravos de Jó”. Foi uma das representantes do país no Festival de Arte Negra de Dacar, no Senegal, e no Festival de Cinema de Cannes, na França, em 1966. A cantora ainda foi homenageada, em 1983, por um espetáculo no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, com a participação de Paulinho da Viola, João Nogueira, Elizabeth Cardoso, entre outros grandes nomes do samba.