É a segurança, estúpido!

É fundamental que todos compreendam que a questão se tornou uma prioridade absoluta para a população

Oscar Vilhena Vieira, professor e cientista político (Foto: Jardiel Carvalho /Folhapress)

Os altos índices de criminalidade constituem o principal problema do país, conforme os dados da última pesquisa de opinião realizada pela Genial/Quest. Pela primeira vez, na série histórica, o tema da violência superou questões como desemprego, saúde ou a economia. O dado não surpreende. Milhões de brasileiros são expostos diariamente ao medo e à brutalidade da violência. Apesar da gravidade e persistência desse problema, os esforços para conter a criminalidade ao longo das últimas décadas foram insuficientes.

A responsabilidade pela violência endêmica que nos afeta deve ser atribuída a boa parte dos políticos, em especial aos governadores. Salvo louváveis exceções, pouco se fez para enfrentar os interesses corporativos e modernizar o sistema de segurança e justiça no Brasil. Governos de centro, de direita e de esquerda foram, no mínimo, omissos na promoção das necessárias reformas.

Câmera no uniforme de um policial militar do estado de São Paulo – Allison Sales – 10.dez.24/Folhapress

Nesta quinta-feira, o Supremo Tribunal Federal foi mais uma vez obrigado a suprir a omissão de sucessivos governos do Rio de Janeiro, que têm submetido a população ao persistente domínio do tráfico, das milícias e do arbítrio dos agentes públicos, proferindo decisão unânime sobre a condução de operações policiais nas favelas do estado.

As medidas cautelares, corajosamente proferidas pelo ministro Edson Fachin, contribuíram para a redução da violência policial, para a diminuição das mortes de policiais, assim como para o declínio nos índices de criminalidade. Ao corpo político, no entanto, cumpre a responsabilidade por corrigir os rumos do desastre.

Embora governantes do campo progressista ou liberal devam ser responsabilizados por não darem a devida atenção à questão da segurança, tem sido o “partido da bala” quem mais contribui para o desastre de nossa segurança pública. São os partidários do populismo penal que bloqueiam reformas e implementam as mais contraproducentes políticas, como temos testemunhado em São Paulo.

De acordo com o relatório da Unicef e do Fórum Brasileiro de Segurança, publicado também nesta semana, uma em cada três crianças ou adolescentes mortos em São Paulo foram assassinados pela polícia. Essa é apenas a face mais perversa de uma concepção de segurança, baseada na violência, no arbítrio e no descontrole dos agentes do Estado, que tem contribuído para o homicídio de cerca de 1 milhão de pessoas nos últimos 20 anos, no Brasil.

Essas políticas obtusas não apenas fomentaram o crime organizado e as milícias, como degradaram as instituições policiais e o sistema prisional, promovendo verdadeiras espirais de violência que afetam a vida de todos os brasileiros, em especial dos mais pobres e mais negros.

É fundamental que todos compreendam que a questão de segurança se tornou uma prioridade absoluta para a população. Que a omissão será punida pelo eleitor, intimidado pela violência. Que os únicos beneficiários serão os criminosos, além de políticos oportunistas, que ocupam o espaço deixado por liberais, progressistas e mesmo conservadores, para vender soluções mágicas que, no mais das vezes, apenas agravam a situação.

É urgente que o campo democrático conceba e implemente políticas consistentes de segurança. Que integre as esferas federal, estaduais e municipais; modernize as corporações policiais; valorize e capacite os profissionais de segurança; empregue intensivamente tecnologia e inteligência no combate ao crime organizado; reforme o sistema penitenciário; adote protocolos de conduta; além de submeter a ação dos agentes do Estado aos estritos parâmetros da lei.

Esse o desafio. A omissão custará muitas vidas. E, quem sabe, o próprio estado democrático de direito.


Oscar Vilhena Vieira – Professor da FGV Direito SP, mestre em direito pela Universidade Columbia (EUA) e doutor em ciência política pela USP. Autor de “Constituição e sua Reserva de Justiça” (Martins Fontes, 2023)

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