Em vídeo, liderança e influencers narram drama de quilombolas do MA

Enviado por / FonteDa Carta Capital

Mais de 10 mil vidas pretas, ameaçadas pelas obras de duplicação de uma rodovia federal no Maranhão, podem ser “expulsas” de seus territórios.

Numa tentativa de barrar a violação dos direitos do povo quilombola, militantes do movimento negro juntaram-se a lideranças para denunciar violações e pedir o engajamento da sociedade na luta. A ação consta de um vídeo divulgado pela plataforma Change.org na última terça-feira, dia 22.

O vídeo, que está publicado nas redes sociais da organização, faz parte de uma campanha que visa ampliar a visibilidade de mobilizações que tratam da temática antirracista.

Participam da peça importantes ativistas e influenciadores do movimento negro do país na atualidade, como a rapper e historiadora Preta Rara, a militante do movimento por moradia Preta Ferreira e a transfeminista e educadora decolonial Maria Clara Araújo.

“Se a duplicação da BR-135 acontecer, a gente tá falando da expulsão de mais de 10 mil pessoas, mais de 10 mil vidas pretas que serão expulsas, desrespeitadas, extremamente violentadas pelo Governo Federal e pelo Governo do Estado”, chama atenção no vídeo a jovem liderança do quilombo de Santa Rosa dos Pretos, a pedagoga e ilustradora Zica Pires.

Os quilombolas de Itapecuru-Mirim e Miranda do Norte estão mobilizados para impedir que as obras sejam retomadas sem que haja uma consulta prévia à população afetada, incluindo estudos de impacto ambiental e do componente quilombola. A mobilização é reforçada por uma petição, hospedada na Change.org, que já reúne quase 60 mil assinaturas.

“Isso vem acontecendo no Maranhão, nas regiões quilombolas dos nossos povos quilombolas”, denuncia a ativista Preta Ferreira no vídeo. “Que o direito constitucional à moradia seja prevalecido. Não é favor, é obrigação”, completa em protesto. A cena faz referência ao artigo 6º, do Capítulo II (Direitos Sociais) da Constituição Federal, que, além da moradia, também estabelece educação, saúde, alimentação, trabalho e outros como direitos.

As obras

No começo de julho, a CartaCapital já havia noticiado o drama dos povos pretos do Maranhão, ocasião em que mostrou um desabafo dos quilombolas sobre como, de maneira equivocada, a “narrativa progresso” coloca os povos tradicionais como inimigos.

“Nós, povo preto, e nossos irmãos indígenas sabemos que a narrativa do progresso – e do genocídio ‘necessário’ para deixar o progresso passar – é uma narrativa velha, tem pelo menos 520 anos, e nasceu na boca do primeiro colonizador. Nós não somos os inimigos. Pelo contrário”, fala o desabafo. Clique aqui para conferir a matéria na íntegra.

O plano de duplicação da rodovia se arrasta há pelo menos três anos. Em abril, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) tentou retomar as obras, mas foi impedido pela Justiça. Apesar de os trabalhos terem sido interrompidos, os quilombolas temem que sejam retomados a qualquer momento, visto que a autarquia federal tem R$ 80 milhões inscrito em restos a pagar de 2017 que só pode ser executado até o final do ano.

O vídeo exibe imagens dos quilombos que estão em risco. Nele, Zica defende que o direito de permanecer vivo é de todos, do pequeno ao grande. “Somos a manutenção da vida porque nós, antes de lutarmos pela permanência da carne, lutamos pela permanência da natureza”, declara a jovem. “Nós estamos no olho do furacão. Falamos por nós e dizemos como é a violência que a gente vive, a partir da realidade que a gente conhece”, completa.

O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) tem outra versão para o que se passa no Maranhão. O órgão garante que as lideranças das comunidades envolvidas foram ouvidas e apoiaram por unanimidade a realização da obra.

Em resposta publicada na página do abaixo-assinado, o departamento nega violações aos direitos dos povos quilombolas ou a seus territórios e diz que as comunidades são ouvidas em todos os processos de estudo de impacto ambiental desenvolvidos pela autarquia.

“O DNIT se comprometeu diante da Justiça Federal e das demais instituições envolvidas no processo de licenciamento a realizar todos os estudos necessários, ouvindo as comunidades e garantindo o cumprimento das condicionantes estabelecidas”, informa a nota.

Pandemia

Outro temor dos quilombolas é que as obras retornem em plena pandemia, já que eles enfrentam situações de extrema vulnerabilidade e, assim como os indígenas, são mais suscetíveis a morrer da doença do que a população em geral. Segundo o Observatório da Covid-19 nos Quilombos, o vírus já matou 165 quilombolas no país e infectou ao menos 4.541.

Em julho, o presidente Jair Bolsonaro sancionou com vetos uma lei que garantia proteção aos povos indígenas, quilombolas e integrantes de comunidades tradicionais. O Plano Emergencial Para Enfrentamento à Covid-19 passou a considerá-los como “grupos em situação de extrema vulnerabilidade” e de alto risco para emergências de saúde pública.

Foram vetados trechos sobre o acesso a água potável, materiais de higiene e desinfecção de aldeias e quilombos, entre outros. No mês passado, o Congresso Nacional votou pela derrubada de 16 dos 22 vetos, mas a implementação do plano ainda é aguardada.

Para pressionar que o governo federal elabore um plano emergencial de enfrentamento ao novo coronavírus nos quilombos, lideranças da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) deram entrada em uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF). Se o pedido for aprovado, os órgãos responsáveis do governo terão um prazo de 30 dias para traçar o plano de ação em colaboração com a CONAQ.

A Coalizão Negra por Direitos – que reúne 150 organizações, entidades e grupos do movimento negro no Brasil – abraçou a causa e criou um abaixo-assinado para cobrar o STF.

Ambos abaixo-assinado em defesa dos quilombolas fazem parte do movimento “Vidas Negras”, que concentra em um hotsite da plataforma Change.org mais de 90 petições e 7,8 milhões de apoiadores em torno que pautas que buscam justiça racial e condenam casos recentes de racismo. O projeto também é feito em parceria da Coalizão Negra Por Direitos.

“As inúmeras petições que podem ser criadas para viabilizar e mobilizar milhões de pessoas no Brasil e no mundo podem não só instrumentalizar, como internacionalizar o movimento negro brasileiro em suas ações no enfrentamento às injustiças e ao racismo”, destaca Vanda Meneses, membro da Coalizão e da Rede de Mulheres Negras de Alagoas.

Leia também: 

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