Enquanto algumas pessoas clamam por penas mais gravosas e o Brasil alcança o terceiro lugar no ranking de prisioneiros há um segmento de presos que tem aumentado muito nos últimos tempos. Certamente é mais um fruto do proibicionismo que atinge as pessoas mais vulneráveis como são as mulheres. O Estado dominador sempre elege um tipo penal para atuar na seleção das pessoas que desejam excluir da sociedade. Na lógica de um capitalismo não há lugar para os mais vulneráveis. Por isso o Estatuto da Criança e do Adolescente não saiu do texto e a igualdade de gênero se limita ao discurso lilás de uma falsa proteção contra a violência machista. Mas não chega até as grades do sistema penitenciário.
Por Siro Darlan, do Jornal do Brasil
Embora as Nações Unidas reconheçam que uma parcela das mulheres infratoras não representa risco à sociedade e, tal como ocorre para todos os infratores, seu encarceramento dificulta sua inserção social, o perfil das mulheres encarceradas no Rio de Janeiro aponta para um total descaso com as regras de direitos humanos. Pesquisa capitaneada pela Dra Maira Fernandes da OAB-RJ definiu o perfil em 78% de jovens mulheres com até 27 anos, sendo 77% negras e pardas; 82% são solteiras e raramente, apenas 66%, recebem visitas; 50% das visitas são de mães, e só 15% de maridos ou companheiros; 76% não têm o ensin9o fundamental e 9% sequer sabem ler ou escrever; 50% estavam trabalhando quando foram presas; e a motivação para os crimes são de natureza financeira; 41% foram vítimas de violência antes da prisão.
As Regras de Tóquio, subscritas pelo Brasil determina que sejam desenvolvidas opções de medidas e alternativas à prisão preventiva e à pena de privação de liberdade voltadas para as mulheres infratoras, no entanto, 70% das mulheres presas no Rio de Janeiro são primárias, logo poderiam estar respondendo processo em liberdade, sobretudo porque 33% cumpriam penas de até 4 anos e 57% possuem filhos menores. No Rio de Janeiro 73% são presas provisórias contra 30% no resto do Brasil.
As Regras de Bangcoc prescrevem que as penas não privativas de liberdade devem ser preferidas quando as mulheres estiverem grávidas ou com filhos dependentes, velando dessa forma pelo melhor interesse dos filhos e assegurando as diligências adequadas para o seu cuidado. No Rio 70% dos filhos de presas estão sob a guarda de familiares, sendo 61% de avós com precárias condições financeiras e de saúde.
Prescreve ainda que as mulheres não devem ficar separadas de suas famílias e comunidades sem a devida atenção ao seu contexto e aos laços familiares visando sua rápida reinserção familiar e comunitária com incentivo à escolaridade à às práticas laborativas.
Assistindo a uma Conferência da Professora Maíra Fernandes na Escola da Magistratura do Rio de Janeiro, onde esses dados foram mostrados, fiquei admirado com a surpresa dos magistrados presentes, os quais demonstraram grande surpresa com os dados como se não fôssemos nós os responsáveis por esse aprisionamento indiscriminado e irracional. Afinal não há uma só pessoa presa sem um mandado judicial que corrobore essa prisão.
* desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e membro da Associação Juízes para a democracia.