O Aeroporto Pinto Martins e a consciência negra no Ceará

FONTEPor Cícera Barbos e Leandro Bulhões, enviado para o Portal Geledés
Fortaleza, Ceara, Brazil - Istock

Em 1923, o piloto Euclides Pinto Martins chegava ao Rio de Janeiro vindo da primeira viagem de avião que cruzou as Américas. “Pinto Martins” é o nome do aeroporto de Fortaleza. Mas quem foi esse jovem natural de Camocim, além de uma personalidade da aviação mundial?

Saguão do Aeroporto de Fortaleza, 2019 – Fonte: Página do Facebook Secretaria de Turismo de Fortaleza

Uma coisa são fatos, nomes e datas. Outra coisa é o que foi feito disso. A história é uma área do conhecimento que se ocupa de fazer as pessoas não esquecerem de acontecimentos. Quem escreve é quem decide o que deve ser lembrado. É por isso que você conhece histórias dos europeus invasores e descendentes e não as dos indígenas e dos africanos.

Como seria a história do Brasil se o povo negro também a tivesse escrito?

Há 50 anos, o 20 de novembro se tornou Dia da Consciência Negra para celebrar o herói Zumbi do Quilombo de Palmares em contraponto ao 13 de maio. Esta foi uma conquista do movimento negro. No Ceará, do Grucon (Grupo de União e Consciência Negra do Ceará) ao Grunec (Grupo de Valorização Negra do Cariri); do Inegra (Instituto Negra do Ceara) à Mandata Nossa Cara; do MNU (Movimento Negro Unificado) às Princesinhas de Favela, gente negra em diversidade regional, geracional, de classe e de gênero tem agido em múltiplas frentes na afirmação de suas existências, avançando na luta por direitos. A História, como a vida, é um campo de disputas.

Hoje, vários veículos de comunicação no país estão sendo ocupados numa ação inédita da Rede de HistoriadorXs NegrXs. Nos últimos anos, o debate público na sociedade brasileira tem sido qualificado por esses profissionais. Perguntas incômodas são feitas ao passado e às instituições. Com isso, dão continuidade a uma luta antiga pelo direito à memória antirracista.

Em 13 de maio de 1952, uma lei federal deu o nome de Pinto Martins ao aeroporto de Fortaleza. Apesar da simbologia da data, não houve esforço de publicizar a trajetória do cearense, nem mostrar seu rosto. Pode ser surpreendente, mas Euclides foi um homem negro que morreu jovem, aos 31 anos, em circunstância trágica e suspeita, em 1924.

Walter Hilton e Pinto de Martins. Fonte: Famosos que partiram
Euclides Martins, irmãos e seus pais. Fonte: Frame do Documentário Euclides Pinto Martins

O genocídio do povo negro segue em marcha em 2021. As lutas também. Jovens negros estudam, escrevem e leem histórias do seu povo. E sonham com outros voos. Será que o menino camocinense – que desafiou e conquistou os ares – conheceu a história do Dragão do Mar?

*Este artigo compõe a Ocupação da Rede de HistoriadorXs NegrXs em veículos de comunicação de todo o Brasil neste 20 de novembro de 2021. 


Cícera Barbosa – Professora de História da Rede Estadual do Ceará/ Mestranda no PPGHIS (UFC)
Leandro Bulhões – professor adjunto Depto de História (UFC)

** ESTE ARTIGO É DE AUTORIA DE COLABORADORES OU ARTICULISTAS DO PORTAL GELEDÉS E NÃO REPRESENTA IDEIAS OU OPINIÕES DO VEÍCULO. PORTAL GELEDÉS OFERECE ESPAÇO PARA VOZES DIVERSAS DA ESFERA PÚBLICA, GARANTINDO ASSIM A PLURALIDADE DO DEBATE NA SOCIEDADE.

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