O afro-gaúcho Oliveira Silveira, o poeta da consciência negra

O afro-gaúcho Oliveira Silveira foi poeta, escritor, professor, pesquisador da cultura, política e história afro-brasileira. Um sábio líder guerreiro, defensor das causas negras pela igualdade social. Um dos idealizadores do Vinte de Novembro como o Dia da Consciência Negra. Abençoado por santos e orixás, Oliveira Silveira nasceu na área rural de Rosário do Sul, em 1941. Iniciou seus estudos em casa, pois no sítio em que morava, residia sua professora. Mais tarde mudou-se para a região central do município, ingressando no ginasial. Depois mudou-se para Porto Alegre, onde cursou o clássico e o curso de Letras na UFRGS.

Iluminado pelo dom da palavra, a literatura surge em sua vida na infância com a poesia popular, quadrinhas e versos de polca. As narrativas, os causos contados pelos mais velhos, os sábios griôs, influenciaram sua formação literária. Do contato com os livros, nasce a inspiração para escrever. Em 1958 publicou seu primeiro poema regionalista. No início o linguajar rural identificava seu estilo. Também escreveu poemas românticos, mas notabilizou-se pela temática da consciência negra. Sua poesia é incisiva, com denúncias socioculturais, relatando a verdadeira história do negro no Brasil, e assim transmitindo uma filosofia educativa de conscientização.

A poesia de Oliveira Silveira caracteriza-se pelo grande teor de consciência e forte emoção. “Encontra suas origens” nos seios da Mãe Preta, no Batuque, tuque-tuque do tambor. É “Semba” de África no compasso encantado do coração, iluminada por uma força ancestral. A literatura afro-gaúcha do mestre tem beleza, resistência e consciência social. Faz das palavras um quilombo sociocultural. Uma pátria afro-brasileira em verso e prosa.

O professor Oliveira Silveira foi um dos idealizadores do 20 de novembro como o Dia da Consciência Negra. Essa data começou a ser destacada em 1971, provavelmente em um dos tantos encontros que um grupo de negros combatentes da discriminação racial fazia na Rua da Praia, no centro de Porto Alegre. O Grupo Palmares defendia o 20 de novembro em oposição ao 13 de maio, contra-atacavam que a Abolição fora uma farsa política, que abriu os cadeados da senzala, mas fechou as portas da sociedade para o negro. Já o 20 de novembro deveria ser reverenciado por marcar a data de morte de Zumbi dos Palmares, o grande herói negro, líder do maior e mais importante quilombo brasileiro. Zumbi viveu, lutou e morreu em busca da liberdade, de melhores condições para o povo negro.

Em 1971, Oliveira Silveira criou a Revista Tição, a primeira a abordar a temática racial, valorizar a cultura e destacar negros notáveis da época e da história. Nos anos seguintes, fortaleceu sua luta em defesa das causas negras, atuando intensamente nos grupos Razão Negra, Associação Negra de Cultura, Tição, Semba Arte Negra. Foi integrante da Comissão Gaúcha de Folclore e do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial. Em 1978 participou da fundação do Movimento Negro Unificado (MNU), em São Paulo. Produziu e publicou artigos e reportagens para jornais e revistas, contos, crônicas, ensaios em obras coletivas, alguns exercícios em texto teatral paradidático, música popularesca. Participou de antologias: Cadernos Negros, Axé, Cadernos Literários, A Razão da Chama, O Negro Escrito, Poesia Negra Brasileira.

Teve textos publicados na Alemanha, numa coletânea de autores negros brasileiros, nos Estados Unidos em revistas universitárias, e um poema musicado na Suécia. Foi agraciado com importantes distinções: menção honrosa da União Brasileira de Escritores do Rio de Janeiro, pelo livro Banzo, saudade negra, Medalha Cidade de Porto, Medalha Mérito Cruz e Souza; Troféu Zumbi, Comenda Resistência Civil Escrava Anastácia, da Rua do Perdão; Tesouro Vivo Afro-Brasileiro.

Participou em Osório da celebração de Moçambique, que representa a cerimônia de coroação da Rainha Nzinga e do Rei Congo, ritual de tradição africana. Oliveira Silveira foi um guerreiro popular e intelectual que lutou a vida toda pela inclusão dos negros em todos os espaços da sociedade. Combateu a discriminação, as desigualdades, defendendo a justiça racial. É o Poeta da Consciência Negra, o professor e militante afro-gaudério, que dedicou sua vida à família, aos amigos, à profissão e ao seu povo negro que tanto amou. Deixou um rico legado à poesia afro-gaúcha, ou melhor, à cultura afro-brasileira, Agô, Oliveira Silveira, Motumbá Axé!


MAMAU DE CASTRO – Professor, poeta e compositor

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