Preocupada com o silêncio sepulcral do novo ministro da Saúde, Arthur Chioro, que assumiu dia 3 passado, sobre a saúde da mulher, e também porque não ouvi nenhum sussurro nos becos de que há alguma conversa da militância pela saúde da mulher agendada com o novo ministro, já que com seu antecessor nada foi fácil e muito menos civilizado no tocante à Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher (2003, governo Lula, ministro Humberto Costa), resolvi fazer uma busca em meus guardados. Encontrei um arquivo datado de 2003, uma “fala” que fiz no 2º Fórum Mundial de Saúde (3° Fórum Social Mundial), realizado em Porto Alegre, em 21 de janeiro de 2003, denominada “Saúde e políticas de gênero: o papel do movimento social”.
Por: Fátima Oliveira
Escrevi que “Lutar pela saúde da mulher é a arte de fazer inimigos. Parece, e é um paradoxo. Mas por que será que governantes e executores de políticas de saúde são intolerantes quando nos referimos à saúde da mulher? Ouvi de um secretário de Saúde: ‘As feministas são muito abusadas, exigentes demais e nunca nada está bom para elas’. Enfim, somos umas chatas. Vai ver que somos. Mas qual é o cerne da questão mesmo?
Para responder, faço minhas as palavras de Betânia Ávila: ‘A crítica tem sido tomada por muitos governantes como atitude inapropriada, como se, além de conviver com as injustiças, tivéssemos ainda que renunciar ao direito conquistado de expressar nossas opiniões. Conquista, aliás, muito recente em nosso país’ (‘Políticas sociais para mulheres pobres: o caso da Bolsa Alimentação’, ‘Jornal Fêmea’, outubro/2001)”.
Reli com atenção. Rememorei a luta titânica contra o fundamentalismo religioso que enfrentamos na gestão do ministro Padilha: problemas pertinentes à Rede Cegonha (por onde será que ela anda voando?) e, logo em seguida, com a famigerada Medida Provisória 557 (MP 557) e seu nascituro, de que nunca descobrimos o pai nem a mãe, que a presidente Dilma, felizmente, compreendeu que era um absurdo, além de inconstitucional, e deixou que caducasse no Congresso Nacional (31 de maio de 2012)! Vencemos no papel. Somente no papel.
O fato é que o que existia antes como saúde da mulher no âmbito das secretarias estaduais e municipais de Saúde parece que encolheu; em muitas, tomaram um chazinho de sumiço e a realidade é medonha. Era esperado, já que no Ministério da Saúde também nada avançou como área técnica. O que é de algum modo inexplicável, na medida em que parece que há dinheiro a rodo para a saúde. Então, a pergunta é por que tanto dinheiro não serve para dar visibilidade às ações em saúde da mulher enquanto tal? Há um descompasso a ser superado para que a dívida histórica do Estado brasileiro para com saúde da mulher seja minimamente reparada.
Em seu longo discurso de posse, o ministro Arthur Chioro não mencionou nenhuma vez a palavra mulher – e pensar que somos um pouco mais da metade da população brasileira! Saúde da mulher apareceu de passagem quando ele se referiu à mortalidade materna e, não sendo muito cricri, ele mencionou a palavra câncer.
Vejamos: “O que me move para enfrentar problemas como a mortalidade infantil e materna ou prevenir e combater o câncer, a dengue, a Aids ou as hepatites não é a simples glória de apresentar indicadores mais satisfatórios. O que me move a enfrentar esses desafios é o desejo de produzir mais vida (…). Me movo, como disse, pelo desejo de produzir mais vida e, defender a vida, mais saúde mais democracia e mais liberdade”. E daí?
Fonte: O Tempo