Enviado por Lelê Teles via Guest Post para o Portal Geledés
hummmm, por essa você não esperava, hein?
aí tem coisa, você dirá.
e tem mesmo, e essa coisa chama-se discurso.
e na ordem do discurso, irmãos, a ideologia é um dos fatores mais importantes.
porque o lugar de fala daquele que fala fala muito sobre o quê aquele que fala tá falando.
se é que você me entende.
se liga nessa. essa construção narrativa sobre a escravidão já traz consigo diversas distorções, e todas elas calculadas.
vejamos esse exemplo, ninguém descende de escravos coisíssima nenhuma, descende-se de pessoas que foram escravizadas.
e que diferença isso faz, se pergunta o midiota.
ora, Pequeno Gafanhoto, quando eu digo pessoa que foi escravizada eu estou fazendo questão de mostrar que há um sujeito ativo naquela ação, onde o escravizado é o passivo.
é colocar a mão branca a segurar o chicote.
é preciso, de uma vez por todas, colocar os brancos escravizadores, e seus descendentes, dentro deste contexto.
porque se temos descendentes de pessoas que foram escravizadas, temos igualmente descendentes de pessoas que as escravizaram.
elementar.
afinal, se a escravidão jamais deverá ser esquecida, por que lembrar somente dos agentes passivos desta aberração histórica, econômica e social, esquecendo os agentes ativos, os que se beneficiaram do tráfico negreiro e até hoje se beneficiam de suas consequências históricas, econômicas e sociais?
aí é demais.
e ademais, eu gosto sempre de lembrar disso, não há um povo no mundo que mais deveria carregar consigo a marca da escravidão do que o povo hebreu.
tá na Bíblia, aqueles caras foram cativos no Egito, na Babilônia, no diabo a quatro. porém, nunca vi um único indivíduo chamar um judeu de descendente de escravos.
é que seus escravizadores desapareceram do mapa e não ficaria nenhum pouco bem carregar nas costas as marcas da escravidão de forma unilateral, como o querem fazer com os negros.
os judeus são conhecidos como filhos do holocausto, vítimas da perseguição cruel e brutal dos nazistas.
toda vez que pensamos em holocausto, a imagem do nazista é a primeira a vir em nossa mente. enxergamos nessa narrativa tanto as vítimas quanto quem as vitimou.
sobretudo quem as vitimou.
a narrativa da escravidão, à brasileira, evidencia apenas um dos lados.
que tal passarmos a usar a expressão descendentes de escravizadores só para provocarmos um estranhamento.
aí você vai dizer, mas no Brasil nem todos os brancos descendem de pessoas que escravizaram negros;
sim, mas por outro lado, nem todo negro descende de alguém que foi escravizado no Brasil.
entende a narrativa, a construção do discurso?
porque é preciso ter em mente que na ordem do discurso opressor e escravagista ainda se vê o negro como quase humano, e nunca se vê os brancos como desumanos, afinal foram os brancos que perpetraram os atos mais desumanos vista pela humanidade como o nazismo, as chacinas do comunismo, a Inquisição, as cruzadas, as colonizações cheias de estupros e genocídios…
no entanto, ainda se desumaniza o povo negro com a figura do macaco.
a desumanização, eu já o disse e insisto, é um recurso semântico utilizado em diversas culturas como xingamento, mas é sempre individual, sempre pessoal.
procura-se nos indivíduos que queremos atacar alguma semelhança física ou comportamental com um animal, por isso dizemos seu porco, sua galinha, seu burro, sua baleia, sua vaca, seu viado…
observe que o porco é sempre um indivíduo, aquele que joga lixo no cão, aquele que não se importa em viver no lixo, a chafurdar.
o burro é o midiota, o que não pensa e vive como um boneco de ventríloquo etc.
mas e o macaco?
o que leva um negro a ser identificado com um macaco, aí é que está a coisa. aí está o discurso e o lugar de fala de quem fala isso.
o negro não tem rabo, vive nas cidades e não está em um zoológico ou num circo; aliás, está na Casa Branca a presidir a nação mais poderosa do planeta.
mas aí, meu camarada, se você faz uma pesquisa no google, verá diversas imagens de Obama e Michelle como macacos, e sempre chimpanzés.
qual é a semelhança de Obama com um chimpanzé? zero.
o chimp tem pelos no corpo, típicos no homem branco e raros no homem negro. o chimpanzé tem os lábios finos, novamente típicos do homem branco e por baixo dos pelos, veja que coisa curiosa, o chimpanzé tem a pele branca.
ou seja, ele guarda mais semelhanças com um branco que com um negro.
mas o discurso te faz ver um negro ou ver o chimp.
e porque o chimp? porque ele tem quase 99% de semelhança genética com o homem, mas não é um homem, é semi racional, limitado, naturalmente selvagem e incivilizável.
entendeu agora o lance do lugar de fala de que falava Foucault?
palavra da salvação.