Rimas sobre racismo, misoginia e miséria brotam em filme sobre slam de poesia

Co-dirigido por Roberta Estrela D’Alva, longa mostra a prática dos EUA às periferias do Brasil

por Andrea Ormond no Folha de São Paulo

Cena de “Slam- Voz de Levante”, de Roberta Estrela D’Alva e Tatiana Lohmann Cena de “Slam- Voz de Levante”, de Roberta Estrela D’Alva e Tatiana Lohmann – Divulgação

“Poetry slam” é a competição entre poetas que recitam os próprios versos em, no máximo, três minutos. Sem acompanhamento musical, no ritmo de stand-up. A plateia faz parte do evento: todo silêncio e todo grito cortam o ar –para felicidade ou desespero dos participantes.

A cada rodada, jurados levantam placas com notas, até que alguém sai vencedor. O esquema foi criado em Chicago, na década de 1980. Depois disso, abraçou o mundo.

Do jazzismo “beatnik” ao estilo hip hop. Do existencialismo à política. Das batalhas de menor duração (dez segundos) ao “slam do corpo” (voltado para deficientes auditivos). Cabe de tudo no caldeirão.

“Slam: Voz de Levante” apresenta o fenômeno para o público brasileiro. Em geral, analisa a “poetry slam” e a liberdade de expressão. Aborda a gênese norte-americana e os estilos adotados nas periferias do Brasil.

Não aprofunda o tema com outros insights. Por exemplo: a existência do ancestral Speaker’s Corner, em Londres; a oralidade dos cordéis nordestinos. Nada disso. A matriz é a dos Estados Unidos. Ponto.

Ao mesmo tempo, a câmera revela o êxtase de competidores que parecem encantados por temas duros, como racismo, misoginia, miséria.

Há instantes de brilho nas apresentações. Muitas delas sem preparo formal, outras com um óbvio rigor técnico. Este é o caso de Roberta Estrela D’Alva, co-diretora e co-roteirista do filme, ao lado de Tatiana Lohmann.

Roberta abocanhou o terceiro lugar no campeonato mundial de 2011. Mas a credencial torna-se pequena, diante da eletricidade que entrega ao documentário.

Falando sobre si mesma, sobre o entorno, conduzindo entrevistas, deixando-se conduzir por elas. Roberta ajuda a livrar “Slam: Voz de Levante” da mesmice ou da autopiedade.

Em tempos de verdades absolutas, como soa bom ouvi-la sobre assuntos espinhosos. Um poeta não pode simplesmente falar de amor? É necessário seguir o tempo todo uma agenda política? Um candidato precisa vencer? E, afinal de contas, não é saboroso vencer?

Existem dúvidas em “Slam: Voz de Levante” e essa tensão dá a medida de nossa humana existência. O apartheid econômico do Brasil –tão mencionado nos versos– fica melhor explicado se entendermos que os jogos de poder também são internos.

Nem sempre o inferno são os outros. Embrulhar esse caos em poemas pode ser parte de uma boa reflexão.

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