A resignação papal e o equívoco de nominar um partido de rede – Por Fátima Oliveira

CONCEITO É OPOSTO AO DOS PARTIDOS; A INTENÇÃO É ENGANAR
por Fátima Oliveira,

 São muitos os assuntos que merecem uma palpitada. Difícil de escolher. Há a resignação de Bento XVI e a fundação da Rede de Sustentabilidade, partido político que se envergonha de se chamar de partido. É direito de cidadania a organização em partidos políticos. Eles, os partidos, nunca são demais, mesmo quando não concordamos com seus fundamentos.

O envergonhado partido Rede da Sustentabilidade, em que pese a sua ideóloga-mor ser evangélica, no tocante aos direitos humanos das mulheres, de gays e de lésbicas, em muito coincide com a Santa Sé.

Na prática, farinhas do mesmo saco. A surpresa é o equívoco de nominar um partido político de rede. Só o personalismo de se achar “a última Coca-Cola do deserto” explica por que políticos ousam se apropriar de um conceito que é o oposto àquele dos partidos. A intenção é enganar. Sim, engabelar!Eis trechos de um artigo de minha autoria, “Redes: o desafio da democratização de saberes e poderes – limites e possibilidades” (2001), no qual digo que a forma organizativa rede, “estabelecida na década de 1970, em contraposição às estruturas piramidais ou verticais de ação e de poder (formas organizativas hierarquizadas)”, é “uma articulação política entre ‘pares’ (iguais)”… “Uma rede tem como alicerce a horizontalidade das decisões e do exercício de poder e visa organizar pessoas ou instituições – ou pessoas e instituições – de forma igualitária, democrática e solidária, temporária ou permanentemente, em torno de um objetivo comum, tendo como fundamentos: autonomia, compartilhamento de valores e objetivos, vontade, conectividade, participação, multiliderança, informação, descentralização, múltiplos níveis de operacionalização e dinamismo”. Enfim, um partido político jamais será uma rede! Assim como a Santa Sé e o Vaticano não constituem uma rede.

A grande pergunta é: por que a resignação, como a Santa Sé está chamando a renúncia de Bento XVI, do chefe da Igreja Católica e do governo teocrático do Estado do Vaticano (Estado eclesiástico ou sacerdotal-monárquico) desperta voyeurismo? Não é apenas porque o catolicismo romano é uma das grandes religiões monoteístas, mas, sobretudo, porque ele se imiscui na vida de todos os povos ditando regras, por não se conformar em mandar apenas em seus fiéis, mas tem se omitido diante da pedofilia clerical e convive com falcatruas do seu banco oficial.
O catolicismo romano se divorciou do viver do povo, e a opção preferencial pelos pobres, de há muito, virou uma figura de retórica, como disse Toni Negri, em “As Duas Renúncias do Papa Alemão”: “Todos os que estão atentos aos assuntos da Igreja romana sabem que outra renúncia, bem mais profunda, dera-se antes… Ocorrera em parte sob João Paulo II, quando, com o apoio fervoroso de Ratzinger, a abertura aos pobres e o empenho por uma Igreja renovada pela libertação dos homens da violência capitalista e da miséria terminaram”.

Desde então, a única bandeira que a Santa Sé e o Vaticano empunham é a defesa incondicional da vida de embriões e fetos, em detrimento da vida concreta das mulheres que, em determinado momento da vida, não desejam ou não podem ter filhos. Continuo achando que é imoral obrigar uma mulher a ter um filho quando ela não quer ou não pode. Pero, a Santa Sé e o Vaticano são o que são e assim se dão bem, pois é conveniente demais ora se comportar como religião ora como Estado, segundo os interesses do momento. Eis o futuro de qualquer dos cardeais que sairá da Capela Sistina ungido papa. Sem ilusões.

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