Jovens negros têm três vezes mais chances de serem mortos pela polícia no Rio, segundo dados do ISP

Dados inéditos obtidos através da Lei de Acesso à informação revelam perfil dos mortos em confronto no Rio em 2020. Mortes são quase que exclusivamente homens.

Ano passado, 75% dos mortos em confronto com agentes do estado (policiais, bombeiros, agentes do sistema penitenciário) eram negros e 68% têm menos de 25 anos. Esses números são relativos a recortes por cor, gênero e idade nas estatísticas gerais dos chamados mortos por intervenção policial. Os dados inéditos são do Instituto de Segurança Pública (ISP), da Polícia Civil do Rio de Janeiro, e foram obtidos pela GloboNews por meio da Lei de Acesso à Informação.

De cada 100 mortos pela polícia, enquanto mais de 75 são negros (pretos ou pardos), 12 são brancos e 12 a polícia não registrou. Em 2020, foi registrado um total de 1.245 mortes.

Os dados não contam com a idade de 54% dos mortos. Excluindo esses cuja idade é ignorada, 68% têm menos de 25 anos, sendo que 10% ainda são crianças ou adolescentes, menores de 18 anos.

Dados do ISP mostram que 75% dos mortos em confronto com a polícia no ano passado eram negros. (Foto: Reprodução/ GloboNews)

As mortes também atingem quase que exclusivamente homens – apenas quatro dos 1245 mortos foram mulheres, como a designer de interiores, Kathlen Romeu, que estava grávida de quatro meses, morta na semana passada no Complexo do Lins.

O caso de Kathlen ainda está sendo investigado pela Delegacia de Homicídios, mas foi inicialmente registrado como morte em confronto. Familiares e testemunhas afirmam que só a polícia atirou.

Homens são praticamente a totalidade dos mortos em confrontos com a polícia no Rio no ano passado (Foto: Reprodução/ GloboNews)

Em nota, a Polícia Militar nega práticas racistas, embora admita que os números do Instituto de Segurança Pública (ISP) “revelam uma distorção histórica do nosso país, que, em grande parte, explica os desafios socioeconômicos extremamente complexos que enfrentamos há séculos, entre os quais está a marginalização de jovens negros, pardos e pobres”. (Confira a nota completa no fim da reportagem)

A Polícia Civil, em nota, também nega o racismo e afirma que a reação de seus policiais durante operações “depende da conduta do criminoso, e não de sua raça”. (Confira a nota completa no fim da reportagem)

A coordenadora de Defesa Criminal da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, Lúcia Helena Oliveira, avalia que a cor ainda é um diferencial nas abordagens e que não tem como dissociar segurança de direitos humanos.

“Não é só uma questão social, uma questão de racismo estrutural que a gente vive em nossa sociedade, mas também uma necessidade de melhor preparação de nossos agentes. Tudo isso acaba trazendo, lá na ponta, a consequência. Se você tem uma polícia mais bem aparelhada, que investiga mais, que consegue fazer seu trabalho de uma forma melhor, sem dúvida estas situações de conflito serão reduzidas”, afirmou Oliveira.

O Governo do Estado do Rio de Janeiro informou que a política de segurança “tem como objetivo preservar vidas e é baseada em prevenção, inteligência, investigação e tecnologia. Os homicídios dolosos (intencionais) no estado caíram 11% no primeiro quadrimestre deste ano na comparação com o mesmo período de 2020.”

Nota completa da Polícia Militar

Como gestora de uma instituição pioneira no país na inclusão de afrodescendentes em suas fileiras, a Secretaria de Estado de Polícia Militar do Rio de Janeiro rejeita veementemente a associação da Corporação com racismo estrutural ou qualquer outra forma de discriminação.

Os números do Instituto de Segurança Pública (ISP) revelam uma distorção histórica do nosso país, que, em grande parte, explica os desafios socioeconômicos extremamente complexos que enfrentamos há séculos, entre os quais está a marginalização de jovens negros, pardos e pobres.

Nesse cenário, esses jovens são facilmente cooptados por facções criminosas armadas que disputam de forma violenta espaços em comunidades periféricas para montar a base de suas atividades ilícitas.

Nota completa da Polícia Civil

A reação da Polícia Civil durante operações depende da conduta do criminoso, e não de sua raça.

Nota completa do Governo do Estado do Rio de Janeiro

A política de segurança do Governo do Estado do Rio de Janeiro tem como objetivo preservar vidas e é baseada em prevenção, inteligência, investigação e tecnologia. Os homicídios dolosos (intencionais) no estado caíram 11% no primeiro quadrimestre deste ano na comparação com o mesmo período de 2020. No total, 1.221 registros foram feitos, chegando ao menor valor para os meses desde 1991, quando se iniciou a série histórica do Instituto de Segurança Pública (ISP). O indicador também teve redução de 4% em abril de 2021 contra abril do ano passado. Este também foi o menor valor para o mês desde 1991.

Em abril e no primeiro quadrimestre de 2021 também houve redução das mortes por intervenção de agente do Estado – 21% e 3%, respectivamente. Os índices são divulgados mensalmente pelo ISP.

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