Ministro celebra vitória de ialorixá contra criminalização da religião afro

Enviado por / FontePor Chico Alves, do UOL

Por 20 anos, a ialorixá Mãe Meninazinha de Oxum liderou a luta para resgatar objetos sagrados de religiões de matriz africana que estavam em poder da Polícia do Rio. Itens apreendidos de 1889 a 1945, quando a prática do candomblé era criminalizada, foram mantidos como prova de delito e guardados sob a denominação “Coleção Magia Negra”.

À frente da campanha “Liberte Nosso Sagrado”, Mãe Meninazinha conseguiu, em setembro de 2020, que as peças fossem retiradas do antigo prédio do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) – órgão de repressão do Estado Novo e da Ditadura Militar – e transferidas para o Museu da República.

Agora estão catalogadas como Acervo Sagrado Afro-Brasileiro.

A ialorixá, responsável pelo Ilê Omolu Oxum, localizado em São João de Meriti, município pobre da Baixada Fluminense, teve ontem mais uma confirmação de sua vitória. Aos 85 anos, ela foi a estrela do evento em que o ministro dos Direitos humanos e Cidadania, Silvio Almeida, assinou o termo de cooperação técnica entre a sua pasta, a Defensoria Pública da União e o Museu da República para permitir acesso a investigações contra terreiros de candomblé e umbanda ocorridas no Rio de Janeiro nos séculos 19 e 20.

Almeida teve a exata noção da importância do evento. “Para mim é uma grande honra participar desse ato, é um privilégio estar vivo para presenciar um momento como esse”, disse ele. “Só posso agradecer aos meus ancestrais que lutaram para que esse acontecimento fosse possível na medida em que eles também sofreram profundamente e foram vitimados por toda essa violência que agora se transforma em um símbolo de resistência”.

O acordo vai permitir a pesquisa e ampliação da coleção formada por 519 objetos e tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). “Quero agradecer a todos os orixás por essa vitória. É apenas o primeiro passo”, disse Mãe Meninazinha.

O período de mais de um século e meio que os objetos sagrados do candomblé ficaram trancafiados como se fossem prova de crime é a confirmação de que o racismo religioso vem de muito longe. Mas nos últimos quatro anos parece que boa parte dos avanços feitos para erradicar esse tipo de discriminação foram por água abaixo, sob a gestão de Jair Bolsonaro.

Os ataques aos terreiros das religiões afro se multiplicaram e não se viu por parte do governo federal nenhuma providência para defendê-los. Pelo contrário: declarações de integrantes evangélicos do governo e da primeira-dama serviram para estigmatizar ainda mais esse grupo religioso.

Diante disso, ganha ainda mais relevância o encontro de Silvio Almeida e Mãe Meninazinha.

É importante mensagem de que a ialorixá agora não lutará mais sozinha: o governo passa de inimigo a aliado.

O Brasil deve essa reparação aos adeptos da umbanda e do candomblé. Nesse sentido, há muito a ser feito e, como disse Mãe Meninazinha, esse é apenas o primeiro passo.

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