Mauro de Salles Aguiar é diretor do Colégio Bandeirantes, de São Paulo. Na conversa abaixo, expõe fatos e argumentos sobre o “saiaço” – meninos e meninas assistindo às aulas de saia – vivido pela tradicional e conceituada escola na manhã desta segunda-feira, 10.
De 1944, às vésperas de completar 70 anos, o Colégio Bandeirantes, também conhecido como “Band”, viveu a situação incomum nesta segunda-feira. Para usar um lugar comum, o Band, situado na Vila Mariana, zona sul de São Paulo, experimentou uma saia justa quando cerca de 250 alunos – muitos deles, meninos – praticaram o “saiaço”.
A história, relatada por Terra Magazine na manhã desta segunda-feira, começou na quinta-feira, 8, e teve um segundo capítulo na sexta-feira, 9, quando JF, na quinta, e PB, na sexta, não puderam assistir à aula por estarem vestindo saia.
Como é natural em quem dirige uma instituição de ensino inicialmente o diretor afirma não haver qualquer tipo de “discriminação ou preconceito de gênero ou raça”, mas, ao final da conversa admite:
– Uma cultura não se muda da noite para o dia. Claro que existe preconceito. Eu mesmo tenho mais de 60 anos e para mim é estranho ver um aluno vestindo assim às dez da manhã. (…) Inicialmente, vi aquilo como uma afronta, mas depois fui mudando a minha opinião.
Nesta conversa, o diretor do Colégio Bandeirantes expõe também, claramente e com exemplos, o que entende como ausência “de qualquer preconceito ou discriminação de raça”.
– Vamos completar setenta anos e o Bandeirantes não discrimina por gênero, por raça, por nada. Temos professores, temos coordenadores que são negros, negras, e nunca houve discriminação. Acabamos de mandar uma ex-aluna, hoje professora, para um mestrado em Nova York. Ela é negra, e o colégio é quem está pagando a ida dela.
Abaixo, a conversa com o diretor do Band, Mauro de Salles Aguiar:
Terra Magazine: Diretor, na sua visão, na opinião do Colégio Bandeirantes, como e por que se deram os fatos, o “saiaço”?
Mauro de Salles Aguiar: Não existe nem sombra de discriminação ou preconceito no Bandeirantes. Vamos completar setenta anos e o Bandeirantes não discrimina por gênero, por raça, por nada. Temos professores, temos coordenadores que são negros, negras, e nunca houve discriminação. Acabamos de mandar uma ex-aluna, hoje professora, para um mestrado em Nova York. Ela é negra, e o colégio é quem está pagando a ida dela. Não temos qualquer tipo de discriminação.
Mas…
Não temos discriminação. O colégio, inclusive, tem escultura de Emanoel Araújo, grande artista, não temos esse tipo de preconceito.
Então, o que aconteceu?
Isso foi a leviandade dos pais de um aluno que foi vítima, entre aspas, de um ato discriminatório, entre aspas. Como um dos pais é um comunicador importante, organizaram essa campanha…
Mas nós não falamos com pai ou mãe, falamos com alunos, e esse movimento está no Facebook, com centenas de alunos e ex-alunos se mobilizando…
Sim, mas isso não foi assim, isso foi organizado. Isso começou às sete da manha da sexta-feira (9), quando um aluno foi barrado por um inspetor que considerou inadequada a roupa, a saia. Se fosse um traje de banho, seria barrado da mesma forma, e também se estivesse de gravata como se fosse para um casamento.
Entendo que isso é um exemplo, mas pergunto: por quê?
Porque não é adequado para a situação de uma escola, não é uma formatura, um casamento ou praia, seria um constrangimento para professores e alunos na sala de aula.
Mas, na véspera, na quinta-feira (8), outro aluno não pode assistir a aulas porque também estava de saia depois de fantasiar-se para uma festa junina…
Veja, ele veio de papel trocado e ai foi assistir à aula de mini-saia. É um comportamento inadequado. Um menino de mini-saia, cueca aparecendo, o professor se sente constrangido, como se sentiria se fosse uma menina de biquíni. O professor não é obrigado a assistir a isso e se sentiu incomodado, o aluno teve que se trocar e acho que isso é razoável.
E o que aconteceu na sexta-feira?
Eu cheguei ao colégio às dez e quinze da manha sem saber de nada e o aluno estava na rua, em frente à escola, vestido de saia. Interpretei aquilo como uma afronta à escola. Não me dirigi ao aluno, conheço e sei das tendências modernas de saias para homens, sei do Alexandre Hercovitch, do outro estilista mineiro.
A escola, desde março, tem um grupo trabalhando com o tema diversidade, tratamos esse tema desde o início do ano, e sexualidade é o tema desse primeiro semestre. Isso para, inclusive, assessorar a diretoria, porque não é só vestimenta. Os papeis sociais, do homem, da mulher, estão sofrendo fluidez.
Certamente…
E como trabalhar isso numa escola com dois mil e setecentos alunos, cento e cinquenta professores, cem funcionários, fora os terceirizados, uma comunidade desse tamanho?
Sim, como vocês estão fazendo, visto esse problema de agora?
Uma cultura não se muda da noite para o dia. Claro que existe preconceito. Eu mesmo tenho mais de 60 anos e para mim é estranho ver um aluno vestindo assim às dez da manhã. Mas eu sou muito preocupado com a questão da segurança, muito, e foi o que mais me preocupou ao ver o aluno daquela maneira na rua. Inicialmente, vi aquilo como uma afronta, mas depois fui mudando a minha opinião. Eu, a escola, entendemos que é algo ideológico, inclusive com apoio da família. E não era uma saia de mulher, era uma saia elegante, feita para homem.
O colégio puniu ou irá punir algum aluno depois da manifestação, do “Saiaço” desta segunda-feira?
Não houve e nem haverá punição alguma, não é nossa maneira de ver e agir.
POR BOB FERNANDES