O que a ONU diz sobre as medidas adotadas no Brasil para o combate ao racismo

Especialistas do Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial questionaram ações do governo e cobram respostas

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Foto: Gabriel Guerra/ Jornal do Campus

O Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial, da ONU, concluiu, em novembro, a análise dos relatórios periódicos do Brasil (do 18º ao 20º), no qual o país anunciou as ações adotadas para tornar efetivas as disposições de combate ao racismo, de acordo com a Convenção Internacional sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial, de 1965. 

Foram apresentadas medidas legislativas, judiciais e administrativas implementadas pelo governo brasileiro desde 2004, abordando ainda providências adotadas em outros períodos a fim de uma maior contextualização. 

Algumas medidas, como aquelas relacionadas ao acolhimento de migrantes e refugiados, foram elogiadas pelo Especialista do Comitê e Co-Relator do País, Eduardo Ernesto Vega Luna, que parabenizou a nova lei de migração de 2017, além dos novos vistos humanitários e medidas para acomodar menores desacompanhados. 

Em relação à violência policial, no entanto, o especialista Mehrdad Payandeh destacou que as principais vítimas da violência do Estado são meninos negros e homens com idade entre 12 e 21 anos. Preocupado com o aumento das execuções extrajudiciais e do uso excessivo da força pela polícia nas favelas, principalmente contra membros da comunidade afro-brasileira e LGBTQIA+, o Comitê questionou incisivamente: “Que medidas foram tomadas para prevenir a brutalidade policial e reduzir o uso de armas letais?”.

Outro ponto de atenção dos especialistas foi em relação ao impacto da mineração ilegal e da extração de madeira em áreas preservadas, já que, desde 2016, nota-se um desmatamento crescente e uma drástica redução das terras de comunidades indígenas. “O Estado-parte incluiu indígenas nas discussões envolvendo projetos de mineração?”, questionou Vega Luna, que também solicitou informações sobre medidas para controlar a extração ilegal de madeira, mineração e desmatamento.

O Comitê ressaltou ainda a maneira desproporcional com a qual mulheres negras e indígenas são afetadas pelo racismo, principalmente durante a pandemia. Apesar disso, notou-se uma redução dos recursos para programas de combate à desigualdade racial. As principais questões levantadas sobre este tópico foram: Por que esses programas foram substituídos por programas menos eficazes? Que apoio foi fornecido além das cestas básicas? Havia planos para reintroduzir programas de transferência de renda? Que medidas foram tomadas para combater os efeitos de longo prazo da pandemia nas comunidades negras e indígenas?

De acordo com Rodnei Jericó, advogado e coordenador do SOS Racismo do Geledés – Instituto da Mulher Negra, os especialistas da ONU absorveram muitas observações da sociedade civil brasileira que participou do processo. O advogado também ressaltou que as respostas do Estado brasileiro foram vazias no que se refere à violação dos direitos das populações negras e indígenas. 

O que diz o Brasil

Entre as respostas dadas pela delegação brasileira, representada pela ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Cristiane Britto, o governo destacou a diminuição no número dos assassinatos cometidos por policiais e das mortes de agentes em serviço, em decorrência do uso de câmeras nos uniformes. Além disso, entre outros pontos, o governo afirmou ainda que a participação da sociedade civil na formulação de políticas foi estimulada através da criação da Secretaria Nacional de Políticas de Igualdade Racial e do Conselho Nacional dos Povos Indígenas.

O representante permanente do Brasil no escritório das Nações Unidas, em Genebra, Tovar Da Silva Nunes, afirmou que as autoridades, juízes e membros das forças de segurança do país foram os primeiros a se engajar seriamente na luta contra o racismo, e que trabalharão para implementar as políticas públicas necessárias para combater a discriminação. 

Apesar das alegações e da demonstração de boa vontade, os especialistas não deixaram de observar contradições no discurso do governo, destacando casos de racismo flagrante, como a atuação da Fundação Palmares, a qual, nos últimos quatro anos, tem promovido hostilidade contra a população que deveria proteger. “Este relatório foi preciso?”, questionou a especialista Gay McDougall.

As considerações finais dos especialistas serão apresentadas em dezembro, depois da conclusão da centésima oitava sessão do Comitê, em 2 de dezembro. 

Confira o depoimento de Rodnei Jericó:

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