Leci Brandão é uma artista e parlamentar cuja trajetória é marcada pela luta contra o racismo, um combate que atravessa sua música, sua vida pública e sua atuação política. Desde os primeiros passos no samba, a sambista enfrentou o estigma de ser rotulada como “cantora de protesto”, uma característica que, segundo ela, era vista de forma negativa por muitos. No entanto, a seriedade dos temas abordados por Leci, como as desigualdades e violências sofridas pela população negra, nunca a impediu de seguir lutando por justiça social.
Neste 12 de setembro de 2024, o Portal Vermelho foi o espaço para que várias figuras públicas fizessem suas homenagens à sambista e deputada estadual Leci Brandão (PCdoB-SP), que completou 80 anos. Com uma trajetória marcada pelo compromisso com a cultura popular, a defesa da igualdade racial, dos direitos das mulheres e da população LGBT+, Leci é referência na política e na música brasileira. A representatividade antirracista das homenagens foi expressa por deputadas, jornalistas, lutadores da igualdade racial e estudiosos.
Com a passagem do tempo, a artista conseguiu equilibrar em sua carreira canções de amor e de resistência. Ainda assim, em cada melodia, Leci sempre deixou claro seu compromisso com a luta racial e a defesa das favelas e da cultura negra. Esse engajamento continua presente em todas as esferas de sua atuação, inclusive no parlamento, onde ela leva as demandas de grupos historicamente marginalizados.
O racismo estrutural e o estigma na música
A resistência de Leci ao racismo e às mazelas sociais está presente em muitas de suas composições. O estigma de ser vista como uma artista de protesto, “que falava de temas sérios e pesados”, permeou sua carreira. Em suas músicas, ela abordou questões como o genocídio da juventude negra, a violência policial, a ausência do Estado nas favelas e o racismo cotidiano, revelando uma sensibilidade única para os dilemas enfrentados pela população negra.
Um exemplo icônico de seu trabalho é a canção “Zé do Caroço”, que denuncia a brutalidade do Estado contra as favelas. Apesar de ter sido composta durante a ditadura militar, a música só pôde ser gravada anos depois, após ganhar a força das ruas. “Deixa, Deixa”, outra canção marcante, destaca as restrições impostas aos jovens negros, com um apelo para que a sociedade permita que eles vivam plenamente, em vez de os reprimir até o ponto da violência.
Além disso, a letra “Elevador é quase um templo”, de Jorge Aragão, eternizada na voz de Leci, revela o elitismo mesquinho e o racismo presente em gestos cotidianos. Até há poucos anos, negros enfrentavam a segregação social até em situações simples, como escolher qual elevador usar.
A conexão com o Hip-Hop e a defesa das raízes afro-brasileiras
Leci Brandão também se mantém ativa na defesa das novas expressões culturais da juventude negra, como o hip-hop. Ao apoiar artistas desse gênero e reagir com veemência a críticas elitistas, como as feitas por Ed Motta, Leci reforça que o hip-hop, assim como o samba em seu tempo, é uma forma de resistência cultural. Ela vê o gênero como uma continuação da luta por igualdade racial e defende o espaço dessa expressão dentro da cultura brasileira.
Em suas canções, Leci também celebra a religiosidade afro-brasileira, reforçando as conexões entre o candomblé e a resistência cultural negra. A ritualidade dessas tradições, como as preces aos orixás, sempre aparece em suas letras, reforçando o orgulho de sua ancestralidade.
O compromisso de Leci no Parlamento
A trajetória de Leci Brandão não se limita à música. No parlamento, ela dá continuidade às causas que sempre defendeu no palco. Como deputada estadual de São Paulo, Leci atua em defesa da cultura negra, das comunidades de candomblé, das mulheres, das favelas e da população LGBT+, além de lutar contra o racismo estrutural em diversas frentes.
Entre suas bandeiras mais recentes, destacam-se a luta contra as tecnologias de reconhecimento facial com viés racial, que afetam majoritariamente pessoas negras, e a defesa de cotas raciais para pessoas negras, com deficiência, travestis e transexuais na administração pública.
Durante a pandemia, Leci esteve ativamente envolvida na defesa dos mais vulneráveis, lutando por direitos fundamentais, como o acesso a álcool em gel, serviços públicos essenciais e o combate aos despejos. Essa atuação parlamentar reflete seu compromisso constante com os marginalizados.
Depoimentos sobre a luta antirracista de Leci
A força de Leci Brandão na luta contra o racismo é reconhecida por muitas figuras importantes. A deputada Olívia Santana (PCdoB-BA) destaca que Leci “chega na política com a força dos seus orixás”, sempre fiel às pautas antirracistas e feministas.
Para Edson França, da Unegro, Leci é “um ícone na Assembleia Legislativa” e uma voz essencial na luta por igualdade racial.
Sueli Carneiro, filósofa e ativista do Geledés, celebrou a generosidade e a luta de Leci: “Você espalha empatia e respeito pelo mundo”.
Benedita da Silva (PT-RJ) resumiu o impacto de Leci Brandão em uma mensagem afetuosa: “Você tem demonstrado uma garra, uma capacidade política que engrandece. Todo mundo deveria ser Leci Brandão”.
A jornalista Flávia Oliveira, da Globonews, exaltou o impacto de Leci no empoderamento das mulheres negras, enfatizando seu papel como referência de longevidade e força na política e cultura. “Dona Leci, 80 anos, não cabe em mim a alegria de celebrar essa data […] É muito bom testemunhar a longevidade de uma referência, como a senhora é, para todos nós”, destacou Flávia, desejando saúde e inspiração para que Leci continue sendo uma voz ativa em prol da luta feminina e negra no Brasil.
Já Julião Vieira, da Unegro, ressaltou a importância de Leci em abrir as portas da Assembleia Legislativa para o movimento negro, o hip-hop e as religiões de matriz africana.
Daniela Costa, secretária nacional de mulheres do PCdoB, também expressou sua admiração. Para ela, Leci é uma grande líder que transcende a arte, sendo um símbolo de transformação social e igualdade. “Leci quando canta: vai nascer um novo líder, a gente se inspira em você”, afirmou Daniela, referindo-se à importância de Leci para as novas gerações de ativistas.
Daiana Santos, deputada federal pelo PCdoB-RS, celebrou a presença de Leci como um ícone de inspiração, tanto na política quanto na cultura. “Celebro a tua existência e digo que é muito feliz viver neste mesmo tempo que tu e seguir os teus passos”, disse Daiana, emocionada ao falar sobre o impacto de Leci em sua própria jornada política.
A deputada estadual Dani Balbi (PCdoB-RJ) também somou sua voz às homenagens, ressaltando o legado político e cultural de Leci. Balbi destacou a contribuição de Leci na luta pela superação das injustiças sociais e fortalecimento da identidade negra no Brasil, além de sua atuação em defesa da população LGBTQIA+. “Você é uma grande guerreira do povo brasileiro e eu tenho muita honra de ser sua camarada”, concluiu.
Leci Brandão, ao longo de seus 80 anos, construiu uma carreira inigualável, na qual a luta contra o racismo e a defesa da cultura negra sempre estiveram no centro. No palco ou no parlamento, sua atuação é movida pela resistência, e sua trajetória permanece uma inspiração para gerações futuras. Como dizem seus admiradores, a luta de Leci é um exemplo de pioneirismo que deve ser sempre lembrado e celebrado.