Onde andam os indignados de junho de 2013?

Há três anos, de repente, não mais que de repente, milhares de brasileiros foram às ruas protestar contra tudo e todos: a corrupção, a má qualidade dos serviços públicos e o descontentamento com a classe política. “Vocês não nos representam”, diziam os cartazes. No dia 20 de junho de 2013 as manifestações assumiram seu caráter mais violento e político, com tentativa de invasão do Congresso e de incêndio contra o Itamaraty. O Brasil nunca mais foi o mesmo, mas hoje, com a presidente reeleita em 2014 afastada, o governo interino alvejado por denúncias de corrupção que derrubam ministros em série e alcançam o presidente interino, sem falar no derretimento moral do Congresso, com as políticas públicas, inclusive as de mobilidade urbana, sendo desmanchadas, por onde andam aqueles indignados?

Do Brasil247

O estopim, dias antes, fora o aumento de R$ 0,20 no preço do transporte coletivo em São Paulo,  mas as  interrogações sobre a origem daquelas manifestações nunca foram devidamente respondidas. No início foi um grupo conhecido e legítimo, o Passe Livre, que saiu às ruas contra o aumento da tarifa. A classe média conservadora, que nunca engolira o viés popular dos governos petistas, pegou carona, deixando o carro na garagem. E em seguida começaram a aparecer manifestantes exóticos e perigosos. Os blac-blocs vestidos de negro, os mascarados e os vândalos que quebravam tudo. Máscaras do Anonymous eram vendidas a R$ 50 na rua 25 de março, o gueto paulistano dos camelôs. A PM paulista, no início, parecia contemporizar com os que ultrapassavam claramente o direito à livre manifestação para instaurar o caos.

Foram as manifestações de junho que produziram o primeiro sangramento de uma presidente da República até então muito popular. O Congresso, embora também contestado, através da oposição e da banda conservadora, apreciou. A popularidade de Dilma despencou, apesar das medidas que ela tomou para acelerar obras de mobilidade urbana.

Foi também naquele mês de junho que o mundo soube, através de Eduardo Snowden, que a agência de segurança norte americana, a NSA, havia bisbilhotado governantes de alguns países. No Brasil, foram monitorados a Petrobrás, Dilma e altas autoridades do governo brasileiro.

As manifestações esfriaram mas voltaram a pipocar durante a Copa do Mundo, no ano seguinte, a pretexto do alto custo das arenas. Dilma foi vaiada em Brasília na Copa das Confederações. E depois em São Paulo, com palavrões. Um vírus novo circulava pelas veias sociais brasileiras, e ele causará surtos de intolerância, agressividade, grosseria, incivilidade.

Mas Dilma se reelegeria em 2014, num apertado segundo turno. No curso da campanha, a Operação Lava Jato ganhou músculos e começaram a ser vazadas as delações premiadas de Alberto Youssef e Paulo Roberto Costa. Até então, as revelações que vinham a público eram as que atingiam o PT. Estava inaugurada a prática do vazamento seletivo.

Menos de uma semana depois do resultado eleitoral, uns gatos pingados apareceram com cartazes de impeachment. O PSDB não engoliu a derrota, pediu recontagem, contestou o resultado no TSE. Ao acenar com um ajuste ortodoxo para o mercado, depois de escolher Levy para o ministério da Fazenda, ela perdeu também parte dos que a apoiaram na guerra do segundo turno, e que reconquistaria agora, na resistência ao golpe. Novamente os indignados vão para as ruas, agora pedir o impeachment, e agora liderados por movimentos até então desconhecidos, como MBL, Vem prá Rua e assemelhados. A direita ganhou cara e nomes.

Nesta passagem dos três anos da irrupção do vulcão, o Brasil está muito pior do que em 2013. Os indignados com a corrupção têm muito mais motivos para pedir que todos se mandem, mas estão recolhidos desde que o impeachment passou na Câmara. Afinal, o PT foi tirado do governo, embora o ministério de Temer esteja varejado por denúncias. Eduardo Cunha, depois de servir ao impeachment, foi afastado da presidência da Câmara mas não foi cassado nem preso. Ainda. E se o for, é porque já pode ser descartado.

Quem sai às ruas agora são os defensores da democracia, para combater o golpe que pode ser consumado em agosto.

Tal como o de 1964, o de agora ainda não tem suas origens, atores e ações devidamente conhecidas. Mas com certeza tudo começou em junho de 2013.

+ sobre o tema

Mulheres marcadas pelo cárcere enfrentam dificuldades para receber salário penal

Muitas mulheres encarceradas não são pagas adequadamente por seu...

Teremos sorte em estarmos vivos até a COP30

Todo começo de ano é a mesma coisa. E...

A lenga-lenga do Ibama e o calor de 50°C

Na semana em que a região Sul do Brasil...

B3 não vai recuar em agenda de diversidade apesar de mudanças nos EUA, diz presidente

O presidente da B3 Gilson Finkelsztain disse que a Bolsa brasileira...

para lembrar

Amorim descarta vaga no Conselho de Segurança se for para “dizer amém a tudo”

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, fez duras...

“Se Deus fosse um ativista dos direitos humanos”, por Boaventura de Sousa Santos

Sociólogo português Boaventura de Sousa Santos veio ao Brasil...

Todos os estados e o DF têm atos pró-Dilma e contra o impeachment

Manifestantes defendem a permanência da presidente no governo federal. Também...

A ira justa de Marilena Chauí

por Paulo Nogueira Você só encontra essa voz provocadora e inteligente...

Não é possível falar de racismo sem pensar nos impactos da crise climática, defende Anielle Franco

A primeira pessoa que fica sem acesso à moradia e território é a pessoa de favela. Chuvas torrenciais, enchentes, alagamentos e onda de calor são...

Censura de Trump atinge projetos no Brasil; ordem veta clima, gênero e raça

Projetos e pesquisas realizados no Brasil e financiadas por recursos americanos começam a ser alvo do governo Trump. O UOL recebeu documentos que revelam como termos...

Conferência Global de Crianças e Jovens (COY20) será realizada no Brasil em novembro de 2025

Pela primeira vez na história, o Brasil será o palco da Conferência Global de Crianças e Jovens sobre Mudança Climática (COY20), que acontecerá em...
-+=