Uma vida dedicada a proteger mulheres nos EUA, na África do Sul e na Índia

Shalini Eddens conhece profundamente questões da imigração, do racismo e do machismo

“O patriarcado é tão profundo que se torna normalizado, invisível. Ele está sistematizado na forma como nossas sociedades tratam as mulheres”, ouvi da feminista Shalini Eddens. Na última semana, lembrava da frase insistentemente ao acompanhar o noticiário brasileiro e internacional. E me espantava pensar como o poder patriarcal fica ressaltado ao testemunhar o questionamento e a revitimização de mulheres que sofreram violência sexual, mas nem sempre está tão evidente —mesmo que presente— nas decisões econômicas, políticas e ambientais.

Feminista negra, nascida e criada nos Estados Unidos, Shalini conhece profundamente questões da imigração, do racismo e do machismo, por suas próprias experiências e pelos quase 30 anos dedicados a pequenas organizações feministas de seu país, da África do Sul e da Índia. Recentemente, ela esteve em São Paulo e uma amiga em comum, do Movement 4 Black Lives, nos conectou. Marcamos um encontro na rua Treze de Maio, na noite de 13 de maio, para acompanhar o Ilú Obá de Min lavar a mentira da abolição.

Encantada com os tambores e a dança daquele mar de mulheres tocando para orixás, de tradição iorubá, Shalini me contou que era a segunda vez que visitava o país. “Embora a luta seja muito profunda diante do racismo que as pessoas negras enfrentam, há no Brasil uma alegria tangível, bela, fundamentada na espiritualidade e na coragem. A conexão com o continente [africano] se expressa em toda a cultura brasileira. É simplesmente lindo testemunhar.”

Quando estava na Universidade da Califórnia, cursando bacharelado em sociologia e estudos afro-americanos, promovia atividades de educação sexual para estudantes que buscavam preservativos ou anticoncepcionais em um centro de atendimento médico. Ali percebeu como meninas e mulheres não conheciam o próprio corpo. Ela mesma não havia sido ensinada em casa.

Tal falta de conhecimento, além de privar uma vida sexual prazerosa, deixa as mulheres expostas a doenças sexualmente transmissíveis, gravidezes indesejadas e as torna ainda mais vulneráveis a abusos e violência sexual. Ao contrário do que os criadores da “ideologia de gênero” costumam afirmar, educação sexual não expõe meninas à sexualidade precoce. Educação sexual é o caminho mais efetivo para proteger crianças e adolescentes de violência sexual.

Foi então contratada por mulheres vivendo com HIV para trabalhar em uma organização fundada por elas. Ali consolidou politicamente a premissa “nada sobre nós sem nós” e se motivou a cursar um mestrado em saúde pública. Depois de dez anos, foi trabalhar com filantropia feminista. “Menos de 2% dos dólares filantrópicos doados globalmente vão para movimentos pelos direitos das mulheres”, afirmou. “E muitas vezes o dinheiro que vem não é sustentável. É apenas por um ano ou dois, e vem com muitos requisitos, processos de aplicação longos, complicados.”

Na Urgent Action Fund for Women’s Human Rights foi diretora de programas e vice-diretora executiva. Ela trabalhou para desburocratizar o acesso a recursos a grupos de mulheres que se dedicavam à justiça reprodutiva, direito e soberania sobre a terra, enfrentamento à violência, HIV e fortalecimento da sociedade civil. Também defendeu as ativistas de direitos humanos da linha de frente, as que correm riscos por protegerem mulheres da violência patriarcal.

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