Vencedora de concurso do BNDES, a norte-amaericana Sara Zewde imagina o futuro da região da Pequena África — Foto: Marcelo Theobald
Vencedora do concurso destinado a premiar propostas para revitalizar o Distrito Cultural da Pequena África, na Zona Portuária do Rio, promovido pelo BNDES, a norte-americana Sara Zewde escreveu, a pedido do GLOBO, um artigo no qual expõe sua visão de como a região histórica será daqui a cem anos. Na sua visão, o local que foi palco “injustiças inimagináveis” no passado passará a ser “um lugar onde o aprendizado, a lembrança, o crescimento, a prosperidade e a criatividade florescem”. Confira abaixo a íntegra do artigo:
Estou escrevendo para vocês do ano de 2125.
Hoje, o Rio de Janeiro abriga um bairro que se tornou o principal exemplo mundial de como a memória, a cultura e a resiliência podem transformar cidades. Nos cem anos entre 2025 e 2125, por meio de ativismo comunitário contínuo e investimentos catalisadores, a Pequena África se transformou em um protótipo global de liberdade. O que antes foi um local de injustiças inimagináveis é hoje um lugar onde o aprendizado, a lembrança, o crescimento, a prosperidade e a criatividade florescem.
Ao longo dos últimos 100 anos, novas instituições surgiram: a Escola de Arquitetura, Engenharia e Planejamento Urbano André Rebouças, onde pessoas de todas as idades ensinam e aprendem a imaginar seus próprios bairros e desenvolver novos modelos de urbanismo; centros de botânica, medicina e ciência do solo, criados na região, estão na vanguarda da inovação global, inspirando-se na sabedoria ancestral; e espaços públicos vibrantes honram e celebram a herança negra ao mesmo tempo em que fortalecem negócios de propriedade negra.
A Pequena África conseguiu aproveitar os holofotes globais para melhorar a vida cotidiana de seu povo. Crianças brincam em parques lindos, participam de programas comunitários diversos, têm acesso às bibliotecas culturais do bairro e crescem com orgulho e propósito. A região é um modelo de bairro habitável, verde e próspero. Suas árvores criaram espaços públicos sombreados e confortáveis, ajudando a regular o clima urbano e a restaurar o equilíbrio da terra. Moradores, assim como pessoas de toda a região metropolitana com laços ancestrais, se beneficiam diretamente da transformação do bairro para viver vidas plenas, seguras e sustentáveis, moldando futuros justos para suas famílias e descendentes.
Pessoas do mundo inteiro vêm não apenas para aprender sobre a história da Pequena África, mas também para testemunhar um exemplo vivo de como a memória pode moldar possibilidades. E aqueles que visitam saem transformados — levando inspiração de volta para suas próprias comunidades. A possibilidade que criou raízes na Pequena África continua a espalhar sementes, com seu legado de justiça se espalhando pelo mundo e por gerações. O que surgiu foi mais do que uma renovação — foi uma visão de libertação tornada realidade. No exato lugar onde antes reinava a opressão, hoje a alegria, a resiliência e a autodeterminação definem o cotidiano. Futuros continuam sendo construídos aqui — enraizados na memória, vivos na cultura e realizando os sonhos de ancestrais de muito tempo atrás.
Olhando adiante, de 2125 a 2225, sinto que a luz do farol da Pequena África continuará a brilhar cada vez mais, acendendo futuros dentro e além do Rio por muitos e muitos anos.
*Sara Zewde é Vencedora do concurso para revitalizar o Distrito Cultural da Pequena África