Geledés na ONU

Geledés discute limites e avanços do Compromisso de Sevilha

O assessor internacional de Geledés – Instituto da Mulher Negra, Gabriel Dantas, realizou importante fala durante o evento “Desafios e oportunidades para o Brasil e países do Sul Global na Agenda de Financiamento para o Desenvolvimento Sustentável”, que ocorreu nesta terça-feira, 1, em paralelo à Quarta Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento (FfD4), em andamento em Sevilha, na Espanha.

Além do representante de Geledés, o evento contou com a participação do ministro Márcio Macedo (Secretaria-Geral da Presidência da República), do embaixador Philip Fox D. Gough (Ministério das Relações Exteriores), de Alexandre Pupo Quintino (Organismo Internacional de Juventude para Iberoamérica), de Helena Tenório Veiga de Almeida (BNDES), de Andressa Pellanda (Campanha Nacional pelo Direito à Educação), de Marília Albiero (ACT Promoção da Saúde) e de  Fábio Yassuda Maeda (Banco da Amazônia),  que abordaram diferentes perspectivas sobre o financiamento ao desenvolvimento.

Na discussão sobre a necessidade de haver um eficaz financiamento do desenvolvimento sustentável, Dantas chamou a atenção para a centralidade do empoderamento econômico da população afrodescendente, em especial das mulheres negras. “É necessário um plano de desenvolvimento socioeconômico robusto da população afrodescendente e precisamos repensar os atores estratégicos dentro da arquitetura financeira internacional, regional e nacional.”

O assessor internacional de Geledés aproveitou o momento para aprofundar a discussão sobre os limites e avanços do chamado Compromisso de Sevilha, documento orientador da FfD4. Em sua análise, Dantas ressaltou dois trechos desse documento. “Cito aqui a linguagem do parágrafo 12 que reconhece a discriminação racial como fator de impedimento para o plano de desenvolvimento socioeconômico”, destacou. Já o parágrafo 63, segundo ele, “prevê a necessidade de fortalecer esforços na coleta, análise e inseminação de dados agregados por raça” na intenção de se desenhar novas políticas públicas com enfoque interseccional.

Dantas ainda indicou que a linguagem adotada no Compromisso de Sevilha poderia ser mais avançada, sobretudo no que diz respeito à justiça reparatória, conceito que Geledés vem priorizando nos fóruns internacionais dos quais participa. “Justiça reparatória é um termo muito em voga hoje em dia no cenário internacional. Recomendo, inclusive, para quem tem curiosidade em saber, se inteirar um pouco mais desse tema estabelecido pela União Africana como um setor principal para esse ano”, disse ele, referindo-se à temática que defende justiça para africanos e afrodescendentes.

Neste contexto, o assessor de Geledés fez questão de ressaltar que a inclusão desses trechos se deve em grande parte ao engajamento do Ministério das Relações Exteriores do Brasil. “Isso se deve muito ao engajamento e à vocalização por parte do Itamaraty em especial da Divisão Política Econômica e Financeira, da Missão Permanente do Brasil em Nova York e do ministro-conselheiro do Brasil na ONU, José Gilberto Scandiucci”. Ele também aproveitou o momento para mencionar a parceria de Geledés com a presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Luciana Servo, lembrada como a primeira mulher negra a presidir a instituição. “Sem ela, nada do que conseguimos avançar seria possível. Sua liderança foi essencial para abrir caminhos.”

Outra abordagem de sua fala foi o financiamento climático e os instrumentos utilizados por bancos multilaterais para atrair capital privado. Dantas advertiu que as estratégias atuais não levam em consideração os territórios mais vulnerabilizados, defendendo maior comprometimento dos agentes financeiros. “Vejo muita criatividade nos instrumentos criados, principalmente, para a questão de proteção de risco, volatilidade cambial e tudo mais, mas espero também que essa criatividade seja pensada para soluções dos territórios, principalmente dos territórios negros.”

No final de sua intervenção, o assessor de Geledés destacou a necessidade de garantir que os recursos oriundos de impostos sobre grandes fortunas sejam devidamente canalizados para a implementação de políticas públicas efetivas. “O Brasil já vem encampando as taxações para os super ricos, mas esse debate precisa vir junto com a decisão sobre como acessar esses recursos e como vamos gastá-los, senão o debate ficará vazio.” Segundo ele, há riscos de que esses valores sejam simplesmente destinados ao pagamento da dívida pública, enquanto políticas essenciais seguem subfinanciadas.

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