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O racismo às vésperas do carnaval

Racismo brasileiro

por Juremir Machado da Silva

No carnaval, constatação: corre solto o racismo no Brasil. Temos um racismo à brasileira muito eficiente: dissimulado, sinuoso, fingindo não ser o que é. Mulher negra ganha menos que homem negro, ambos ganham menos que mulher branca, que ganha menos que homem branco. Racismo e machismo. Racismo metido a simpático. Faz de conta que é só brincadeira, no melhor estilo “chora macaco imundo”. Nossos racistas adoram sofismar com frases manjadas:

– Eu não me ofendo quando me chamam de alemão.

– Nem eu quando me chamam de branquelo.

Pura astúcia. Sacanagem mesmo. Cérebro de ervilha. Racismo. O caso do ator negro Vinícius Romão de Souza, preso no Rio de Janeiro, acusado de ter agredido e assaltado uma mulher, é uma lição completa sobre as artimanhas do nosso racismo. Vinícius foi parar em cana – 16 dias – por ser negro e pobre. Nada mais do que isso. Na bucha. Aí vai para a cadeia em dois toques. Para sair, é uma novela, mesmo depois de concedida a liberdade provisória ou de ser admitida a inocência. É dose. A mulher fez uma baita burrada. Depois, ela se arrependeu. A engrenagem já estava em movimento. Como pará-la?

Nada de novo na banalidade do racismo nacional. Negro está sempre na mira, eternamente sob desconfiança. Parou perto de um carro de luxo já é suspeito. Aproximou-se na rua e já tem gente mudando de calçada com o coração na mão. Nosso racismo muda de pele e volta fortalecido. A principal característica do nosso racismo é a dissimulação.

É só carinho, um jeitinho de ser, na boa.

– Pô, tchê, a patrulha anda braba, não dá mais pra chamar negão de crioulo que já pegam no pé e falam em racismo!

Falam porque é racismo mesmo. Esse negócio de chamar de negão, de alemão, de baixinho, de comprido, essa história de realçar aspectos físicos é uma mediocridade. Não passa de bullying. Tem bullying de adulto, de criança, de idoso. A vítima acaba absorvendo, adaptando-se, aceitando, até, às vezes, achando que gosta da perversidade da qual é vítima. Na alma, fica uma ferida. Nos olhos dos outros, é colírio. O racista sempre acha que estão exagerando, dramatizando, enchendo o saco.

– Tchê, não dá mais esse politicamente correto.

Vinícius Romão viveu um filme de horror. Experimentou o clichê como realidade triste e recorrente. Nenhum juiz acordou de madrugada para libertá-lo. Liberdade de negro pode esperar a lenta tramitação do processo legal ou seja lá como se diz isso em juridiquês de branco. Aliás, se fosse crime de alto colarinho branco certamente as coisas andariam mais rápido. Lugares-comuns? Tão comuns quanto o preconceito contra os negros neste Brasil mestiço historicamente em brancas mãos. Melancólico mesmo é ouvir branco astuto filosofar:

– Essas cotas são um racismo invertido.

 

 

 

Fonte: Correio do Povo

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