Navi Pillay – Ao deixar o preconceito e o racismo ferverem em banho-maria, surge o risco real da erupção do conflito

“Ao deixar o preconceito e o racismo ferverem em banho-maria, surge o risco real da erupção do conflito”Declaração da Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Navi Pillay, em ocasião do Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial.

A relação entre racismo e conflito é uma relação profundamente enraizada e bem estabelecida. Certo número de estudos mostrou que um dos primeiros indicadores de violência potencial é o desprezo pelos direitos das minorias. Uma pesquisa promovida por uma organização não-governamental indicou que mais de 55% dos conflitos violentos de intensidade significativa entre 2007 e 2009 tinham as violações dos direitos das minorias ou tensões entre comunidades no centro da violência.

Apenas no último ano, vimos vários exemplos terríveis de violência étnica no meio de conflitos em muitos países do mundo. Na última semana, em uma visita a Guatemala presenciei as consequências trágicas e duradouras de práticas históricas de racismo contra povos indígenas e afrodescendentes. A Guatemala ainda está lidando com o legado de 36 anos de conflito armado.

Prevenir tal conflito é claramente mais desejável do que as tentativas posteriores de apagar as chamas e começar os difíceis processos de reconstrução, reconciliação e justiça – isso sem mencionar os custos humanos e sociais. Entretanto, o problema é que os avisos prévios em relação ao preconceito e à discórdia são frequentemente ignorados, e só quando os mais sinistros e tardios sinais começam a emergir é que o Estado e a comunidade internacional começam a reagir.

Vinte anos atrás, a Declaração sobre os Direitos de Pessoas pertencentes a Minorias Nacionais, Étnicas, Religiosas e Linguísticas reconheceu claramente a ligação entre estabilidade política e social e a promoção e a proteção dos direitos das minorias nacionais, étnicas, religiosas e linguísticas. Os Estados também reconheceram através da Declaração e do Programa de Ação estabelecidos em Durban, em 2001, que o racismo e a discriminação estão entre as causas primárias de muitos conflitos nacionais e internacionais. Uma olhada através dos primeiros arquivos e relatórios de alerta do Comitê sobre Eliminação da Discriminação Racial se torna uma trágica leitura dos tipos de conflitos que poderiam ter sido evitados se essas advertências iniciais tivessem sido atendidas.

Neste Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, peço que os Estados prestem atenção com os alertas prévios sobre preconceito, estereótipos, ignorância e xenofobia. Peço que eles tratem urgentemente da marginalização e exclusão de indivíduos pertencentes a certas comunidades das tomadas de decisões econômicas e políticas. Peço que se estabeleça um processo de consulta e um constante diálogo com todas as partes da sociedade, e que os esforços para garantir o acesso aos empregos, acesso à terra, acesso aos direitos políticos e econômicos não fique restrita de acordo com as características de raça, cor ou nacionalidade das pessoas. Peço também que os projetos de desenvolvimento não desfavoreçam desproporcionalmente uma comunidade em particular.

Essas não são obrigações novas para os Governos, mas são há muito tempo parte dos compromissos com os direitos humanos assumidos pelos Estados. Deixando os perigosos problemas sociais do preconceito e do racismo ferverem em banho-maria, surge um risco real da erupção de conflitos explosivos, anos ou décadas depois.

Racismo e preconceito podem fornecer, promover e perpetuar as narrativas que criam e sustentam conflitos – seja no mundo desenvolvido ou em desenvolvimento. Não esperemos que os ressentimentos se transformem em violência ou o preconceito se torne um genocídio antes de decidirmos agir.

 

 

Fonte: Naciones Hunidas Derechos Humanos

+ sobre o tema

Fome extrema aumenta, e mundo fracassa em erradicar crise até 2030

Com 281,6 milhões de pessoas sobrevivendo em uma situação...

Presidente de Portugal diz que país tem que ‘pagar custos’ de escravidão e crimes coloniais

O presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, disse na...

O futuro de Brasília: ministra Vera Lúcia luta por uma capital mais inclusiva

Segunda mulher negra a ser empossada como ministra na...

Desigualdade ambiental em São Paulo: direito ao verde não é para todos

O novo Mapa da Desigualdade de São Paulo faz...

para lembrar

Whitney Houston rompe silêncio de sete anos com novo álbum

Fonte: G1 - Cantora lança 'I look to...

O trote, um ritual bárbaro ainda vigente nas universidades do Brasil

    A prática, ilegal na maioria das...

Estudante foi morto pelo Pai que discordava do apoio do jovem a ocupações

A intolerância e a falta de abertura para ouvir posições políticas...

Dilma muda agenda e vai a Porto Alegre para batizar neto

Em meio a crise com setor religioso, petista viajou...

Foi a mobilização intensa da sociedade que manteve Brazão na prisão

Poucos episódios escancararam tanto a política fluminense quanto a votação na Câmara dos Deputados que selou a permanência na prisão de Chiquinho Brazão por suspeita do...

MG lidera novamente a ‘lista suja’ do trabalho análogo à escravidão

Minas Gerais lidera o ranking de empregadores inseridos na “Lista Suja” do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). A relação, atualizada na última sexta-feira...

Conselho de direitos humanos aciona ONU por aumento de movimentos neonazistas no Brasil

O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, acionou a ONU (Organização das Nações Unidas) para fazer um alerta...
-+=