Até pouco tempo atrás, Taís Araújo mal confiava em seu taco como atriz. Isto embora tenha um extenso currículo de novelas, séries, cinema e teatro, com atuações premiadas e papéis históricos.
Por quase duas horas ela falou com a reportagem da Tpm sobre a experiência de ser mulher e negra, sobre família, ancestralidade, casamento e sobre os ataques racistas que recebeu no ano passado pelas redes sociais. Ao final ficamos com a real sensação de que Taís é dessas pessoas que sabem que a busca não leva ao êxtase para si, mas à conquista da sabedoria e do poder para servir aos outros. E saímos com a certeza de que nada é mais erótico do que inteligência misturada à coragem. Nas palavras de Guimarães Rosa: “O correr da vida embrulha tudo”. “A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.”
Leia um trecho da entrevista:
Quando você entendeu que queria ser atriz? Tem uns cinco anos.
Só isso? Até pouco tempo eu pensava: “Será que faço odonto? Ou relações internacionais? Largo tudo e vou fazer outra coisa?”.
Bateu uma crise? As coisas não aconteceram por escolha minha. Elas foram chegando até mim. E eu achava que tinha que ter uma formação clássica. [A novela] Xica da Silva [em 1996] foi um sucesso, em seguida fui para a Globo, aí veio a fase de procurar uma faculdade para fazer, e fiz jornalismo. Até uns cinco anos atrás eu achava que era meio um truque, que as coisas iam dando certo ao acaso. Sou uma atriz mais intuitiva do que teórica, acho até bom e hoje sei fazer bom uso disso, mas antes não tinha uma reflexão sobre a profissão. Um pouco antes de engravidar do meu filho eu pensei: preciso entender que tipo de atriz quero ser.
O que mudou? Comecei a planejar mais, a escolher mais, a procurar o cineasta com quem quero trabalhar, o autor, o diretor… Faltava maturidade. Tem fotos [promocionais] minhas como Xica da Silva com 17 anos tapando o peito. Eu não entrei por um nicho sem volta porque Deus não quis. Meus pais não tinham a menor referência, achavam que isso fazia parte da carreira. Fico pensando como minha mãe, sempre tão dura, deixou. Seria diferente se eu quisesse estar lá tapando os peitos, mas não era uma vontade minha. A primeira vez que me vi numa cena de Xica da Silva eu caí aos prantos.
A gente entende violência apenas no sentido de delinquência, mas a maior violência é não reconhecer a humanidade no outro, e o machismo exerce essa violência ao nos transformar em objetos. Isso pelo que você passou foi uma violência. Tinha contagem regressiva tipo: “Faltam não sei quantos dias para ela fazer 18 e tirar a roupa”. Isso me batia duro porque eu pensava: “Só querem me ver pelada? Será que o trabalho que eu estou fazendo não tem valor? Será que tirar a roupa é um valor?”. Hoje se me falarem para tirar a roupa e eu achar que tenho que tirar, tiro sem o menor problema, mas é completamente diferente.