Chefe de combate ao trabalho escravo é demitido por Temer depois de denunciar 132 casos

Portaria publicada nesta segunda (16) pelo ministro Ronaldo Nogueira centraliza e dificulta a divulgação da relação

Do Revista Fórum

De acordo com informações do Painel, da Folha, a três dias de ser demitido do Ministério do Trabalho, semana passada, André Roston (foto), então chefe da divisão de combate ao trabalho escravo, deixou pronta a chamada lista suja, um cadastro com nomes de 132 empregadores que mantêm funcionários em condição análoga à escravidão.

No entanto, uma portaria publicada nesta segunda (16) pelo ministro Ronaldo Nogueira centraliza e dificulta a divulgação da relação.

A Agência Brasil publicou reportagem sobre a nova portaria, que impõe várias dificuldades na fiscalização do trabalho análogo à escravidão no Brasil. Leia abaixo:

O Ministério do Trabalho publicou portaria que estabelece novas regras para a caracterização de trabalho análogo ao escravo e para atualização do cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores a tal condição, a chamada lista suja do trabalho escravo. As novas normas servirão também para a concessão de seguro-desemprego ao trabalhador que for resgatado em fiscalização do Ministério do Trabalho.

A portaria foi publicada hoje (16) no Diário Oficial da União. Segundo a norma, para integrar a lista suja é necessário que seja constatada e comprovada a existência de trabalho análogo ao escravo. Pela definição do Código Penal, submeter alguém a atividade análoga ao escravo é submeter a trabalho forçado ou jornada exaustiva, quer sujeitando o trabalhador a condições degradantes, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída.

A portaria estabelece que, para que seja considerada jornada exaustiva ou condição degradante, é necessário que haja a privação do direito de ir e vir, o que no Código Penal não é obrigatório.

Além disso, agora, a divulgação da lista suja ficará a cargo do ministro do Trabalho e a atualização será publicada no sítio eletrônico do Ministério do Trabalho duas vezes ao ano, no último dia útil dos meses de junho e novembro. Antes, a organização e divulgação da lista suja era responsabilidade da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae) e a atualização da relação podia ocorrer a qualquer momento.

Reação

A nova portaria desagradou o Ministério Público do Trabalho (MPT), que a considerou ilegal e diz que adotará, junto com entidades públicas e privadas, medidas judiciais e extrajudiciais na sua esfera de atuação. O vice-coordenador nacional da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete) do MPT, Maurício Ferreira Brito, defendeu que “por meio de instrumento normativo inadequado, portaria, o Ministério do Trabalho deseja modificar o conceito de trabalho análogo ao de escravo do artigo nº 149 do Código Penal, fazendo-se substituir pelo legislador ordinário”. Ele destacou ainda o que chamou de uma nova “desregulamentação sobre a lista suja do trabalho escravo”.

O coordenador nacional da Conaete, Tiago Muniz Cavalcanti, defendeu que o governo “está de mãos dadas com quem escraviza”. “Não bastasse a não publicação da lista suja, a falta de recursos para as fiscalizações, a demissão do chefe do departamento de combate ao trabalho escravo, agora o ministério edita uma portaria que afronta a legislação vigente e as convenções da OIT [Organização Internacional do Trabalho]”.

Em nota, o Ministério do Trabalho, diz que a portaria aprimora e dá segurança jurídica à atuação do Estado Brasileiro, ao dispor sobre os conceitos de trabalho forçado, jornada exaustiva e condições análogas à de escravo. “O combate ao trabalho escravo é uma política pública permanente de Estado, que vem recebendo todo o apoio administrativo desta pasta, com resultados positivos concretos relativamente ao número de resgatados, e na inibição de práticas delituosas dessa natureza, que ofendem os mais básicos princípios da dignidade da pessoa humana”, diz em nota.

A pasta diz ainda que o Cadastro de Empregadores que submeteram trabalhadores à condição análoga a de escravo “é um valioso instrumento de coerção estatal, e deve coexistir com os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório”.

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