A terrível e implacável “gente de bem”

Não existe como categoria sociológica, filosófica ou antropológica. Não é parte do arcabouço legal do país e nem das encíclicas papais; não é parte do vernáculo acadêmico e não integra o vocabulário de qualquer instituição política minimamente séria. A muito usada “gente de bem” é a perversa expressão da própria apartação social.

Quando ouço de um indivíduo a terminologia “gente de bem” estou seguro de que estou diante de totem humano recheado de conservadorismo e muito preconceito. É que o useiro dessa “pérola” parte do princípio sumamente equivocado de que se existe “gente de bem” é que existe “gente do mal”. É de um binarismo tosco, perverso e acéfalo.

Para o adepto desta perspectiva não existe história, historicidade, condicionantes sociais e tampouco relações de classe. Pois bem… Se o mundo pode ser compreendido por meio de dualidades e simplismos do tipo: bem/mal; forte/fraco; certo/errado e verdade/mentira, então… A história perde sentido e importância e, nesse sentido, apenas acionamos o “modus automático” de nossas sensações e, pronto, resolve-se dilemas e contradições que cimentam nosso cotidiano.

Nada mais equivocado e perverso sobretudo, no sentido de que a sensibilidade humana é tolhida, o senso investigativo tão fundamental e central para o fazer científico é ceifado e o horizonte de um futuro assentado no resguardo e na promoção do direito humano a uma existência digna e protegida se perde em sua totalidade.

Não pode haver “gente de bem” porque não existem “pessoas do mal”. Essas categorias valorativas não ajudam a entender o fenômeno da miséria nacional, socialmente produzida e intensificada a partir das estruturas que formam e sustentam o próprio modo de produção capitalista. A “gente do bem” tão cantada e decantada pelas bocarras de gente do amplo arco da direita política nacional é o estandarte verbal do mais atual e criminoso preconceito de classe e que se possa pensar. É uma beligerância comunicativa que busca cumprir sua função no fundamental campo da comunicação e do simbólico e é enfim, a classe dominante impondo sua lógica fácil e preconceituosa de perspectiva da vida e do mundo a partir de suas angulares de classe e centrada no privilégio descabido, na manutenção dos poderes e facilidades que historicamente sempre possuíram e na submissão das classes do trabalho.

Finalmente, conforme nos ensina a magistral filosofia de Hannah Arendt, em seu “A Condição Humana”, o homem se revela em seus discursos e, nesse sentido, o simplismo fascista dessa terminologia demonstra a essência política e social daquele que o emite, alguém, tão somente, afeito com a trágica manutenção do instituído.

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