Com toda a razão

Fonte: Diário do Nordeste

 

Na pele do boêmio esquizofrênico Ademir, de ´Caminho das Índias´, Sidney Santiago vem sendo reconhecido pelo grande público. Mas o ator de 24 anos já tem na bagagem dois filmes, prêmios de melhor ator do Festival do Rio e do Cine PE e várias peças. Apesar do sucesso, ele diz que não pretende voltar à teledramatugia

 

Como é a repercussão do público sobre seu trabalho como Ademir, em ´Caminho das Índias´?

Muito respeitosa e verdadeira.

 

Como você fez o laboratório para viver o Ademir?

Tivemos uma estrutura de três meses, mantida pela TV Globo, para estudos. A preparação em parte foi coletiva, então eram atores, diretores, produtores de arte, que visitaram CAPS (Centros de atendimentos psico-social) e outras instituições na busca de elementos, histórias, pessoas e ambientes. Assisti também muitos filmes e encontrei grandes parceiros que me contaram sobre seus processos dentro da saúde metal.

 

Você já dançava. Isso ajudou a viver o Ademir?

Estudei dança em períodos diferentes, ao todo nove anos. Fui ser ator, diante da impossibilidade de me tornar bailarino.

 

Em 2005, você estreou na TV com a série ´Carandiru, outras histórias´. Ano passado, fez a série ´Queridos Amigos´. Como foram essas experiências?

Fazer ´Carandiru´ foi genial do ponto de vista dos estudos para a realização. Tive um escola de cinema (a minissérie foi realizada e produzida em moldes cinematográficos), tive a oportunidade de trabalhar com o Roberto Gervitz, um diretor extremamente justo e perfeccionista. Já ´Queridos Amigos´ foi extremamente solitário e doloroso. A história falava do Brasil e, mais uma vez, era um Brasil oficial e destituído de falas.

 

Você recusou o convite da Globo para integrar o elenco de ´Duas Caras´. O que te fez aceitar esse papel?

Acredito que a palavra de um ator tem responsabilidade. Na maior parte das vezes ser ator negro na teledramaturgia nacional significa ser interlocutor da história de um povo que só tomou chibatada. Quando fui para a universidade era com a idéia de me politizar para ser um interlocutor da resistência e contribuir para um novo imaginário. E o convite quando surgiu me mostrou que seria possível um construção poética e política sobre a esquizofrenia.

 

Você declarou que não pretende voltar a fazer novelas. Por que?

Os fatos que me afastam de uma nova experiência em novela é a visão folclórica, estereotipada e grotesca que os autores tem sobre os povos de matriz africana. Um outro fato é a visibilidade. Ela me assusta. Essa é indústria das celebridades

 

Você participa do grupo Os Crespos, companhia de teatro formada por negros, que organiza espetáculos com foco no racismo. Como surgiu o grupo?

A companhia surgiu nas dependências da EAD (Escola de Arte Dramática/ECA/USP) no ano de 2004 como um grupo de estudos e, aos poucos, foi se tornado um coletivo de intervenção e depois de prática teatral. Organizávamos debates, fóruns e encontros dentro da universidade, com a idéia da discussão de temas atuais. Nosso trabalho é uma militância por dias melhores. Já o preconceito, vivemos numa sociedade racializada, o racismo é moeda de troca. A polícia sabe quem é branco e quem é negro. Enquanto nação temos que admitir que temos problemas racio-social.

 

O que te deixa mais à vontade, teatro ou cinema?

No teatro, as rédeas da criação e suas proposições política e espiritual são próximas. Me deixa feliz e me sinto um criador.

 

Você está fazendo alguma coisa em paralelo com a novela? Quais teus planos profissionais?

Estou atualmente estudando para próxima montagem da Cia Os Crespos. ´A Construção da Imagem´ e a ´Imagem Construída´, que terá direção de Eugênio Lima. Também preparo um espetáculo solo chamado ´Efeito Colateral´, um discurso sonoro-musical para discutir o mito da democracia racial sob a óptica de um esquizofrênico negro, que se diz filho da Xuxa com o Bill Clinton. Também estou tentando levar a peça ´Ensaio sobre Carolina´, baseado no diário ´Quarto de despejo´ da Carolina Maria De Jesus, para o Nordeste.

 

Matéria original: Com toda a razão

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