Gays que rejeitam o mundo gay

texto da semana passada gerou vários debates muito legais de acompanhar e isso eu agradeço a todos vocês que levaram para um nível especial de discussão. Mas uma sugestão de outro tema também logo se mostrou dentre as opiniões expostas.

no Metrópoles

Se no post passado falamos dos LGBTs que se sentem desconfortáveis em meio a héteros, no de hoje vamos tratar daqueles que rejeitam o mundo gay e se sentem totalmente integrados no meio daqueles.

Quando eu ainda não havia tido contado com nenhum outro homossexual, imaginava que eles deveriam ser as pessoas mais legais do mundo inteiro, sobretudo porque eram pessoas que enfrentavam preconceito diariamente e, portanto, deveriam ser muito sensíveis às dores dos outros. E quando coloco “outros” me refiro a toda e qualquer minoria ou oprimido incompreendido pelo mundo e que necessita de respeito.

Afinal, uma pessoa que tem que passar por um certo caminho mental para se aceitar vai encarar com facilidade as questões dos outros.

Para ser mais direto, um gay ou uma lésbica dificilmente seria preconceituoso com uma mulher, ou com um negro ou não perceberia a difícil situação das classes sociais mais baixas do nosso país. “É claro que os LGBTs são pessoas com uma consciência social e pessoal acima da média”, concluía eu inocentemente.

Logo eu vi que alguém se aceitar quer dizer apenas isso, aceitar a si próprio. Vi aqueles que se aceitam, mas não aceitam nenhum outro LGBT. Há quem se veja como o único gay da face da Terra que é “de boa” para andar nos ambientes héteros e, por isso, só quer estar ali talvez para não correr justamente o risco de encontrar nenhum outro gay. Outro gay lhe seria um espelho e é tudo o que ele não quer.

Por favor, não me refiro aqui àquele que frequenta lugares héteros por mero acaso das amizades, ou talvez por gosto musical. O contrário também existe, tem héteros que não dispensam uma balada gay, porque dizem que lá tem os melhores djs e as melhores músicas. Não, me refiro àquele que renega mesmo, que nem cogita e nem pensa em estar em meio a outros gays.

Diante dos últimos fatos políticos, é impossível não estender essa questão para além da sexualidade. Homossexuais que não usam sua experiência de vida para entender o que é sofrer preconceito e apoiar a representatividade apenas vive uma ilusão de inclusão. Por mais que seus amigos héteros te amem e te queiram bem, eles jamais vão saber o que você passa.

Eles nunca saberão o que é o risco de levar um soco pelo simples motivo de alguém perceber sua orientação sexual, nem o ato de coragem que é beijar quem você ama em público.

Aliás, sobre isso há uma lenda de carnaval entre meus amigos. Uma amiga já havia beijado vários caras nas ladeiras de Olinda e por conta disso ganhou o apelido de “rodo”. A partir do momento que ela foi taxada, a garota ficou tímida e não quis beijar mais ninguém, sob as risadas alcoólicas dos outros. Em um momento que ela estava mais isolada do grupo, um amigo gay se aproximou e lhe disse no ouvido:

— Beije quem você quiser, pois muito pior sou eu que não posso beijar em todo lugar sem ter que tomar cuidado.

Ela entendeu a mensagem e aproveitou muito mais aquele carnaval. Ele poderia ter engrossado o coro dos opressores, mas, acredito eu, sua vivência já o havia feito perceber que empatia é mais benéfica, tanto no carnaval, quanto em qualquer outro momento do ano.

Em um dos debates que rolaram que deram origem a este texto, alguém respondeu com uma frase de uma verdade avassaladora: quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é se tornar o opressor. Depois dessa, só me resta calar e deixar estas palavras surtirem seu efeito.

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