Noel Rosa (1910-1937), poeta da carioca Vila Isabel e todas as vilas do Brasil, imortalizou os três apitos de uma fábrica de tecidos nos versos à amada operária: Mas você não sabe / Que enquanto você faz pano / Faço junto do piano / Estes versos pra você.O mineiro Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) pendurou o retrato de sua cidade natal numa página escrita em Copacabana: Tive ouro, tive gado, tive fazendas. / Hoje sou funcionário público. / Itabira é apenas uma fotografia na parede. / Mas como dói!
Por Fernanda Pompeu Do Yahoo
A tijucana Cecília Meireles (1901-1964) olhou de frente, ou de esguelha, para o sentimento mais caro às pessoas de todos os quadrantes e trovejou: Liberdade – essa palavra / que o sonho humano alimenta: / que não há ninguém que explique, / e ninguém que não entenda! No além-mar, Fernando Pessoa (1888-1935) autopsicografou: O poeta é um fingidor. / Finge tão completamente / Que chega a fingir que é dor / A dor que deveras sente.
Ao lado deles, todos no céu, Mario Quintana, Manuel Bandeira, Assis Valente, Paulo Leminski, Orídes Fontela, Dolores Duran – e muitos, muitos outros – fizeram da poesia arte e ofício. Possuidores dessa graça de transportar emoções – suas e dos outros – para palavras escritas ou cantadas. Desejosos que seus leitores e ouvintes se comovessem, se interrogassem, chorassem ou soltassem risadas. Afinal, um bom poeta nos faz mais bem do qualquer presidente da República.
Mas, me perdoem a ousadia, a poesia também acontece fora das páginas. Ela é feita diariamente por milhões de poetas anônimos. Até mesmo por gente analfabeta. Pois para senti-la e expressá-la basta manter os olhos bem abertos e o estado de espírito permanentemente livre. Não dá para poetar se você tem ideias rígidas sobre pessoas, natureza, coisas. Disso já nos alertou Raul Seixas (1945-1989):Eu quero dizer / Agora o oposto do que eu disse antes / Eu prefiro ser / Essa metamorfose ambulante / Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo / Sobre o que é o amor / Sobre o que eu nem sei quem sou.
O poema também pode estar no cinema, na TV, na pintura, no teatro, na fotografia, no muro. Ele brilha toda vez que há uma evocação. Algo que, ao mesmo tempo, nos tira e nos devolve a nós mesmos. Só que transformados. Escrevi os parágrafos acima evocada pela imagem da foto, trabalhada por Régine Ferrandis, que ilustra este post. O casal que olha o mar da Bahia parece ser todos os casais – homos e héteros – do universo. Sorrir ao coração é a poesia.