A jornalista Aline Ramos escreveu artigo para o Favela 247 questionando o destaque dado ao humorista Gregório Duvivier quando ele trata sobre racismo em sua coluna: “Por que ainda não são os negros que suscitam a discussão nos principais veículos de comunicação?”. Para a autora, os argumentos utilizados por Duvivier são “o óbvio que nós, comunicadores e militantes negros, estamos tentando transmitir e reverberar na rede faz muito tempo”. Aline lembra que de 555 colunistas de oito dos maiores veículos de imprensa, apenas 6 são negros
Por *Aline Ramos, para o Favela 247
O racismo mora nos detalhes
Como o Gregorio Duvivier diz, ele não quer se protagonista de luta nenhuma. Porém, nossa estrutura social racista o torna protagonista mesmo sem ser sua vontade individual. Tudo o que ele disse na coluna “Mundo, Brasil, Rio, Casa” é o óbvio que nós, comunicadores e militantes negros, estamos tentando transmitir e reverberar na rede faz muito tempo. O que foi escrito não é inédito e acredito que sequer possui a intenção de ser.
Entretanto, porque Gregório ganhou tanta atenção por apenas repetir nosso discurso? Porque veículos que se dizem de esquerda dão a ele o título de melhor análise da estrutura social atual? Por que uma pessoa branca ganha mais atenção ao falar sobre racismo do que uma negra? De modo algum o escritor e humorista deveria se calar perante o debate sobre racismo e descriminalização da maconha, não é esse o ponto. O questionamento é: Por que pessoas brancas escutam apenas pessoas brancas?
O texto de Gregório, que soa como uma espécie de confissão de seus privilégios, levanta muitas questões sobre a estrutura social racista em que vivemos. Essa não é a primeira vez que o escritor aborda em sua coluna a temática racial, mas até quando o máximo que leremos sobre é o reconhecimento de privilégios? Até quando os poucos colunistas que abordam a temática racial ficarão no raso? Certa vez ouvi que para o movimento negro nada está bom, e de fato, nada está bom para nós enquanto o racismo existir. Nada está bom se o máximo atingido são elogios ao Gregório.
A atenção dada ao escritor indica um detalhe, que para a população negra é estruturante: o racismo também mora nos detalhes. Sem dúvidas o debate racial ganhou mais visibilidade nos últimos anos, entretanto, por que ainda não são os negros que suscitam a discussão nos principais veículos de comunicação? A autora do livro “Um Defeito de Cor”, Ana Maria Gonçalves, escreveu para a Folha, mesmo veículo que Gregório é colunista, uma análise contundente: “De 555 colunistas e blogueiros de oito veículos de imprensa (Folha, “O Estado de S. Paulo”, “O Globo”, “Época”, “Veja”, G1, UOL, e R7), 6 são negros”. Para acrescentar mais dados sobre a representação do negro na mídia é importante nos voltarmos para algumas informações da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). O relatório publicado em 2012, que traça o perfil do jornalista no Brasil, indica que apenas 5% são negros e 18% pardos, totalizando em 23% de profissionais da área que não são brancos.
Impossível disputar espaço de maneira igual no debate de ideias e informações sobre racismo. Acreditar que somos todos iguais e que todos possuem a mesma voz é uma verdade que existe apenas para quem está do lado privilegiado. Quando apontamos as diferenças sociais não desejamos que brancos sejam omissos, mas que entendam que o simples ato de reconhecer privilégios não modifica a estrutura social excludente. Precisamos qualificar o debate racial no país, porém, será inviável avançar se os negros estiverem distantes dos principais canais de comunicação.
*Aline Ramos, 25, natural de Cubatão e moradora de São Paulo, é jornalista recém-formada pela Unesp de Bauru e blogueira no Que nega é essa?.