As festas juninas resistem, notadamente no Nordeste. Cada Estado apresenta a sua marca peculiar de festejar os santos de junho: santo Antônio (dia 13), são João (dia 24), são Pedro (dia 29) e, no Maranhão, também são Marçal (dia 30).
por Fátima Oliveira no O Tempo
Na ilha de São Luís, há quadrilhas comandadas em francês, tambor de crioula, cacuriá, dança portuguesa e batuques de bois pra todo lado nos quatro municípios – Paço do Lumiar, Raposa, São José de Ribamar e São Luís, a capital do Maranhão.
O sonho de todo bumba meu boi é se apresentar nos arraiais da capital, por ser o palco que consagra o sucesso de um boi e faz parte da história transgressora e da cultura de resistência original do boi: uma dança de preto! Gosto tanto de bumba meu boi que criei algumas personagens “boieiras”.
Conforme dona Lô, personagem da política de contos do meu blog “Tá Lubrinando – Escritos da Chapada do Arapari”: “No fundo, no fundo, o que vale num boi não é apenas a cintilância; o que diferencia um boi do outro é o sotaque. No mais, é tudo bumba meu boi… Do mesmo jeitim da política.
“É, bumba-meu-boi é coisa complexa, não apenas pelo sincretismo e pelas relações de poder que desvela…
“Há muito mais no ‘Auto do Boi de Catirina e Pai Francisco’ do que supõe a nossa vã filosofia… Boi tem ciência. E é complexa. É uma ópera popular reveladora do inconformismo e da insubordinação. É toda uma cultura de resistência. Por isso foi proibida pelas elites maranhenses durante um século, porém o povo não deixou o bumba meu boi, uma dança de preto, morrer”. (Dilma precisa conhecer a São Luís boieira pra entender os sotaques do boi…).
Em “É cantar ‘Chora boi da Lua’ pelos quilombolas…”, dona Lô bradou: “Sabia Estela que, se não fosse a teimosia dos negros, não haveria bumba meu boi? Pois é, durante muito tempo era proibido brincar boi (1861 ou 1868 até 1960) e a polícia prendia na hora os brincantes!
– Eu não sabia!
– Como os bois eram mais de áreas suburbanas e rurais da ilha e não havia polícia que vencesse os batalhões de boi, proibiram apenas de entrar na área central de São Luís, mas eis que o presidente João Goulart, numa visita a São Luís, assistiu a uma apresentação de bumba meu boi e ficou deslumbrado. Afrouxaram a proibição… Depois de um século!”.
Cacá, artista plástica, personagem do meu romance “Reencontros na Travessia – A Tradição das Carpideiras” (Mazza Edições, 2008), chegando à capital nas festas juninas para acompanhar o marido doente, relata: “O pior é que fiz planos de ver um bumba meu boi. Sinto saudades, tenho gratas recordações da beleza cintilante que se desprende de um boi, desde as roupas dos brincantes, com os brilhos das sedas, canutilhos, miçangas, paetês, purpurina, plumas e aquele mar de fitas de seda a perder de vista nos chapéus… Sem falar da arte contida no ‘couro do boi’, belo e ricamente bordado.
“Certo dia, vendo TV, apareceram alguns que mexeram profundamente comigo, com aqueles sons inconfundíveis, ora de zabumba, de matracas, de orquestra e batidas de costa de mão. O bumba meu boi é um bailado popular dramático, que não existe na região do sertão onde nasci, é mais da região mais próxima da ilha de São Luís, da Baixada Maranhense, que consiste num auto singularíssimo, com teatro, dança, música e circo, cuja apresentação é em si uma ópera popular, porém semelhante ao de Portugal e ao da África, que conta as relações estabelecidas no período colonial brasileiro”.