Governo dos EUA estimula vigilância coletiva; racismo cresce

O Departamento de Segurança Interna dos EUA acaba de lançar uma nova rodada de vídeos, anúncios em rádio e na mídia impressa da campanha “If You See Something, Say Something” (Se você vir algo, diga algo). O vídeo oficial da nova fase da campanha mostra situações suspeitas em estacionamentos, lojas, ruas, aeroportos, shopping centers, parques públicos, hospitais, estações de ônibus e metrôs, laboratórios de pesquisa etc, ou seja, é transmitida a ideia de que o perigo pode estar em qualquer lugar. A certa altura, o narrador adverte que a vigilância e as denúncias não devem se basear em raça, religião ou gênero, mas sim em comportamentos considerados suspeitos ou fora do comum pelos observadores.

Mas parece que não é bem assim que acontece na prática: de acordo com uma pesquisa desenvolvida recentemente nos EUA pela socióloga Rachel L. Finn, da Universidade de Hull, os americanos com descendência ou origem em países sul-asiáticos como Índia, Paquistão, Nepal, Sri Lanka ou Bangladesh, são alvos constantes de olhares desconfiados e intimidantes vindos de americanos brancos e estão frequentemente sujeitos a níveis desproporcionais de vigilância por parte das autoridades em aeroportos, centros de imigração, transportes públicos e inclusive no ambiente online.

Em artigo publicado na última edição do Surveillance & Society Journal (vol.8, 2011), a socióloga afirma que “vários atos de vigilância não-tecnológica, através de olhares dirigidos aos americanos sul-asiáticos em lugares públicos têm aumentado a discriminação racial e servido para reforçar as já evidentes fronteiras sociais existentes entre brancos e não-brancos nos EUA.”

Finn explora as ligações e relações entre vigilância, terrorismo e segurança: o aumento da vigilância leva necessariamente ao aumento da segurança? Quais são as consequências de se estimular atitudes de vigilância, criando um clima de desconfiança entre as pessoas? Segundo ela, americanos de pele amarronzada estariam tendo seu direito à mobilidade reduzido quando viajam, dentro do próprio país e também para fora, além de terem acesso mais difícil lugares públicos e a oportunidades de trabalho.

Campanha nasceu após o 11 de setembro

Originalmente lançada pela Autoridade de Transporte Metropolitano de Nova Iorque em 2002, a ação publicitária encorajava os usuários do sistema de transporte público a contatar a polícia caso vissem algo julgado suspeito de ser um ato terrorista – como deixar uma bolsa ou mala no banco do metrô, ônibus ou trem sem que ninguém estivesse visivelmente responsável pelo objeto. Porém, em julho de 2010, a campanha foi adotada pelo governo federal americano e pelo DHS, que é o órgão do governo com a função de proteger o país de ameaças à segurança dos cidadãos, principalmente no que se refere a atos terroristas, relançou a campanha nacionalmente. O objetivo seria “aumentar a consciência pública dos indicadores de terrorismo e crime violento e enfatizar a importância de se reportar atividades suspeitas para as autoridades locais e estaduais”.

Para o DHS, a segurança do país “depende da segurança das cidades e consequentemente de seus moradores” os quais teriam, então, a responsabilidade de avisar as autoridades locais caso suspeitem de algo – é quase como se cada cidadão comum virasse um informante da polícia em busca de algum potencial perigo que nunca se sabe ao certo de onde vem e, portanto, pode estar em todos os lugares.

Atualmente, os anúncios, antes comuns somente em trens, ônibus e metrôs (alvos favoritos de atentados à bomba), estão na televisão, internet, jornais locais e nacionais de grande circulação, estádios de baseball, praças e inúmeros outros lugares públicos onde normalmente há aglomeração de pessoas.

Fonte: ComCiêcia

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